O CACARECO

Lêda Torre

Quando menina, lá pelos anos setenta, já meio adolescente, nos meados de dezembro, época de muitas mangas, era normal irmos lá pelos terrenos de tia Noêmia, buscar aquelas deliciosas frutas temporais. Ia aquela gurizada da vizinhança, bem uns dez guris, entre meninos e meninas, cada um com um balde, sacolas, um “cofo”, feito da palha da palmeira do babaçu, planta nativa do nosso estado, o Maranhão, e mais bregueços pra trazer as nossas mangas.

Íamos todos serelepes, alegres, felizes, a cantarolar, a tirar graça uns com os outros, na maior inocência, ali não tinha maldade entre nós. Mas sempre, havia um líder, no caso meu irmão primogênito, José Fernando, vulgo, Dedé, hoje Coronel da Polícia Militar do Maranhão. Pois bem, Minhas irmãs Júlia, Delfina e outras meninas iam também, com nossas ferramentas, para a mais nova aventura, busca às mangas!!

Naquele percurso, tínhamos que passar por um curral que havia um touro muito bravo, pois ele ficava sozinho, porque nenhum outro bovino podia ficar ali com ele. Ele era muito nervoso, muito zangado, que fungava com voracidade, parecia que ao nos olhar, pularia a qualquer momento sobre nós. E ao ouvir muito barulho, ainda mais de crianças, aí era que o danado do boi ficava valente! Suas narinas tão grandes mais pareciam as de um dragão fumegante!!

Apesar dele ser grandão, mas amarrado, nenhum de nós ficávamos com medo não, e sempre que passávamos lá, a gente fazia como um coral, provocando o bicho, chamando-o de cacareco....e cantávamos Ca-ca-ca-ca-re-co...Ca-ca-re-co é o maior (bis), e ali a cantoria era bem alto que entoávamos, e aí , era que o boi ficava brabo!! Jogávamos rebolo de árvore nele, era pedra, enfim, o que podíamos provocá-lo, estávamos ali mesmo atentando...

Como se não bastasse, um certo dia, meu mano Dedé, subiu numa das cercas do curral, se sacudiu pra lá e pra cá cantando a música do cacareco....e a turma lá embaixo aplaudindo!! Imaginem a cena!! Depois foi a minha vez...repetíamos os mesmos gestos...e foi outro...e foi mais outra...até que foi todo mundo se peneirar na frente do zangado Cacareco.

O bovino era enorme, cada pata!! Cada um chifre! Tinha um cupim enorme no lombo, e era bem alto, acho que pesava bem uma tonelada... se não me falha a memória...era enorme mesmo!! só que ao pararmos a “festa”, o animal fez de conta que nem estava aí pra nós...quando de repente, zapt!! O monstro deu uma upa tão grande que quase se soltou da forte corda que o prendia... e foi aquela gritaria...era menino pra todo lado...ninguém nem queria mais saber de manga coisa nenhuma!!! Naquela hora, o medo falou mais alto.... rsrsrsrsr.........

Sorte a nossa, aquela bendita corda o prendera, graças a Deus! Senão, já viu o destroço!!

A impressão que tivemos foi que aquele bicho ia acabar com todos nós. Só que passado o susto e dias depois, lá vamos nós de novo buscar mangas, no mesmo local...mas cadê que ninguém tinha mais coragem de chegar nem perto do Cacareco...passamos bem longe dele....com medinho...e, bem caladinhos...nem parecia que éramos nós, os algazarreiros de outro dia...cadê a coragem? Acabou...e dessa vez levamos nossas mangas pra casa, mas na volta, ainda jogamos algumas mangas verdes nele....que maldade, hein??!! Só, que a cada manga jogada, ele ficava furioso...mas era de longe que fazíamos aquela estrepolia... Pois é, são essas aventuras de nossa infância que nos deixa muito saudosos, pois hoje sei que éramos felizes e não sabíamos.

_____________São Luis, dezembro de 2009___

Lêda Torre
Enviado por Lêda Torre em 29/06/2010
Reeditado em 03/06/2015
Código do texto: T2347372
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