"QUE SEJA INFINITO ENQUANTO DURE"
Lar doce lar. Volta da lua de mel. Arnaldo já no trabalho. Ela com os presentes pra guardar. Ah, que delícia! A casinha toda arrumada. Tudo com toque de recém-casados, cheirando a novinho. Suspira: teve o casamento que pediu a Deus! Festa linda, baile lindo, convidados lindos! Tudo perfeito! Também pudera! Cinco anos preparando...
Na mesinha de cabeceira, as centenas de cartões! Ah, quantas felicitações! Todas tão gentis! Lê e viaja nas mensagens! Súbito, o cartão do sogro. Estranha: “Que seja infinito enquanto dure” (?). Ué, o que será que seu Viano quis dizer? Que chato! Isso lá é coisa pra se escrever a quem está se casando? Que mau gosto! Cadê o humor? Já era! Ora bolas, o que aquele velho chato quis insinuar?
Pronto! A frase não lhe sai mais da cabeça. Bem achava que o sogrão não ia com sua cara. Ah, mas ela sabe o motivo! E o motivo se chama Renata! A lambisgoia da ex do Arnaldo! Não é boba. A Renata era gente rica, vivia pegando no pé do Arnaldo... Bajulava seu Otaviano. O panaca torcia por ela! Queria que o filho a tivesse escolhido! Pensava que ela não sabia?
O Arnaldo chega às 7. Ela está afiada! Quer briga! Ah, se quer...
_ Olha aí, Arnaldo, o cartão que seu pai mandou, olha aí...
_ Que lindo, hein, querida? “Que seja infinito enquanto dure”. É... O papai era muito fã do Vinícius de Moraes.
_ Então é só isso que tem a dizer, Arnaldo?
_ Ué, e devo dizer o quê, Luisa?
_ Essa frase é venenosa, Arnaldo, é agourenta, Será que não vê?
_ Agourenta? Essa não!
_ Tá bom, não quer ver, não veja! Cê tá do lado dele, Arnaldo?
_ Do lado dele? Do papai? Pirou, Luisa? Que isso?
_ Eu sabia, aquele negócio com a Renata nunca ficou bem resolvido!
_ Ai, meu Deus! Tava demorando! Tinha que parar na Renata...
_ E não é, Arnaldo? Quem sabe cê preferia ter casado com ela, hein? Vai, fala aí...
Um, dois, três! Santo Pai! Ô mulher! Dá vontade de partir pra ignorância. Quem pode com uma coisa dessa? Cinco anos e a mesma paranoia? Até depois de casados? Sem brincadeira! Sai correndo. Vai se enfiar no quarto. Sozinha na sala, ela tem uma crise histérica. Chora, grita, joga um vaso de cristal na parede, igualzinho em novela...
_ E me deixa falando sozinha? Mas que desaforo, gente! Durmo no sofá! De pirraça eu durmo no sofá... Pra você aprender... Palhaço!
Dois meses. Clima tenso, com chispas no ar. Ele no quarto, ela no sofá. Ninguém fala, os dois emburrados. Pra pôr fim à guerra, ela arrisca:
_Quero o divórcio, Arnaldo!
_ Eu dou, Luisa! Hoje ou pode ficar pra amanhã?
_ Se for hoje, melhor!
À noite, seu Otaviano é avisado da decisão do casal. Sem um pingo de surpresa comenta com a esposa
_ Puxa, nunca vi um infinito durar tão pouco!