Toda a Sorte Possível é Ninharia

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Peguei a foto no site da revista Tribo Skate. Foi do domingo, no Wild In The Streets, evento organizado pela marca de tênis Emerica em comemoração ao Go Skateboarding Day, que este ano caiu nessa segunda - dia 21/06 - que passou. Claro que eu tinha que sair cortado pela metade e de costas, mas enfim. Agora não estou com muito tempo e/ou/e paciencia/inspiração para escrever sobre este que foi um dos dias mais marcantes da minha vida. Mas vou deixar a parte boa de lado e escrever a parte ruim, já que o que foi germinado no domingo ainda perdura até hoje.

Eu chego em casa com um sorriso de orelha à orelha e com as pernas bambas depois de 10 horas andando de skate e me deparo com o computador na sala. Na sala, ao lado da televisão, no meio do caminho de todos e no meio de onde reina a zona do meu lar. O sorriso murchou na hora enquanto minha mãe mostrava seu melhor sorriso sem graça.

- Ok, agora vamos colocar de volta no quarto!

- Ah nem vem, vai ficar aqui.

- Aham - Já fui guardando as minhas coisas e retirando as tranqueiras do móvel do computador.

- Bom, não adianta nada, ele não tá funcionando...

- COMO É QUE É?

Eu saio de casa e deixo o computador tinindo, volto e ele está na sala. E não está funcionando. Legal.

- É, do nada parou de funcionar!

- "Do nada"?

- Do nada...

Continuei retirando livros e capas de cds do móvel.

- Você vai deixar o computador na sala!

- Claro.

- Você enche o saco de todo mundo com esse computador ligado o dia e a noite inteira.

Fiz a minha melhor cara de cu.

- Primeiro que eu acordo seis da manhã e segundo que chego em casa no mínimo 14 horas depois. Ai eu fico no computador, isso quando não to na academia. E como eu disse, acordo 6 da manhã, logo, não tenho TEMPO pra ficar no computador a noite inteira, além do que eu me tranco no quarto, ouço música baixo e faço a única coisa que anda me restando fazer ultimamente, que é escrever, portanto, aceitarei de bom grado e sem ressentimentos sua ajuda pra colocá-lo de volta em seu devido lugar, que é onde eu me isolo do inferno que essa casa vira por causa dessa televisão e das implicâncias ridículas de vocês...

- Tanto trabalho pra nada...

Dai colocamos o bendito no quarto e ele, claro, funcionou de primeira comigo. Mas logo travou. Eu doido pra ver as fotos das duzentas mil câmeras que registravam o evento supramencionado. Bom, de tanto ódio que eu tava pela injustiça do destino, fui dormir. Em anos, fui dormir às 22:00 da noite.

Segunda um dia normal.

Terça um dia maravilhoso e inspirador.

Quarta, hoje, um dia normal também. Só que hoje eu parei pra pensar como eu sou extorquido por todos os cantos. Onde eu almoço tem uma par de mendigo perto e um deles vive me pedindo dinheiro pra beber cachaça. "Só tá faltando dez centavos". Quando eu tenho eu jogo. Aí eu lá colocando comida e entra uma velha e começa a me falar que quer comer, mas que não pode comer, que a mulher do restaurante não deixa ela comer, que ela precisa comer eu eu falo "porra, eu não trabalho aqui, pede pra dona" e penso "mas puta que pariu, não vem um desgraçado me oferecer um centavo que for agora o mundo inteiro fica enviando missionários para extorquir a porra do dinheiro que eu não tenho e me fodo pra ganhar". Ai uma mulher ofereceu pagar um marmitex pra velha e ela não quis. Queria dinheiro. Mais tarde, agora. Acabou a cota do bilhete escolar e tive de carregar no normal, que como todos sabem, desconta o dobro. Ai tem uma bolacha que é maior cara que tá em promoção. Não agüentei e peguei dois pacotes. Carreguei o bilhete e saí em direção ao ponto de ônibus. O último banco vago - milagre, diga-se de passagem - foi ocupado pela pessoa que me antecedeu na subida ao bólido. Beleza. Ai eu encostei numa porta lá do lado esquerdo e fiquei lendo um pouco, mas logo escureceu e guardei o livro. Dai fui ouvir uma música e descobri que o fone estava com um lado quebrado. Sendo que meia hora antes estava funcionando. Mais gastos. Ai eu começo a dormir em pé e uma mulher grita escandalosa acusando um fulano lá de ter roubado o bilhete da bolsa dela. Ai o ônibus pára em plena Radial Leste, o motorista pára uma viatura e lá ficamos por bons vinte minutos esperando o desenrolar do suposto furto. Ai me ocorreu uma idéia de crônica divina. Só que ai me ocorreu que o concurso de crônicas que vou participar está próximo e eu ainda não sei o que mandar. E lembrei também que a taxa de inscrição pro concurso é equivalente ao valor de dez dias de café da manhã. Mais extorsão! Ai eu comecei a desenrolar a história na cabeça: um cara (eu) fodido de grana que estava desiludido com a vida junta uns trocados e abandona o emprego de salário aviltante e a família esquizofrênica e se mete num busão qualquer com destino à Salvador. Ai ele (eu) pega um ônibus clandestino e compartilha o banco com uma velha que fumava cachimbo, peidava fedorentamente e falava mais palavrão do que a Dercy Gonçalves no auge; então o ônibus capota numa ribanceira e só sobrevivem ele e a velha resmungona, que ficava toda hora falando que ele lembrava alguém. Ficaram sem documentos e subiram até a rodovia, onde uma SUV luxuosa parou para oferecer carona e a velha conhecia o cara, que era um fazendeiro proprietário de metade do Estado da Bahia e este fazendeiro vivia numa amargura danada porque uma sua ex-mulher fugiu pra São Paulo grávida há 22 anos atrás e ele queria conhecer o filho, o único filho homem que saiu de seus testículos. A velha falou que eu era o filho dele e era o cara que eu lembrava. O cara o abraçou e quase nos juntamos aos cadáveres do ônibus por conta do tal abraço. Ai chega na fazenda e é uma casa de trocentos cômodos e o fazendeiro tem meia dúzia de filhas. Todas umas beldades com a idade oscilante entre os dezessete e os vinte e cinco. Dai poderia começar a rolar um incesto. Ou não, já que eu não era filho do cara - meu pai já tinha morrido de cirrose. Então, alegando perder a certidão de nascimento e etc no acidente do ônibus, ganhei um novo nome e um legado incomensurável de fazendas, uma boa caranga e vivia agora numa casa cheia de mulheres fervilhando de tesão. Com essa idéia na cabeça, peguei o meu caderno de anotações e o abri dando risada sozinho mas constatei que meu bolso estava furado e que minha caneta já não estava mais lá. Que ótimo! Lembrei que tinha anotado um e-mail de um contato forte para trabalhar no Banco que eu presto serviços. Virar funcionário do banco e ter um salário decente e com benefícios decentes. Ia chegar em casa e mandar esse e-mail. Só que para isso eu não poderia ir trancar a faculdade, como estava nos meus planos do dia. Diacho! Ai cheguei em casa determinado a excluir alguns videos e fotos para ver se resolveria -pelo menos parcialmente - o problema do meu querido computador. Liguei ele. Funcionou. Criei uma pasta com o nome "Thrash", com o coração na mão. Iria excluir videos de skate, de música, de luta, alguns filmes e alguns episódios do Hermes e Renato e Happy Tree Friends. Beleza. Daí minha pasta de videos de skate nem a de filmes estava lá. É. SEIS ANOS de download de videos de skate haviam desaparecido. Centenas de videos, dos épicos aos new generation. Deletados. Desaparecidos. Então, para complementar minha amargura, o computador trava. Reinicio e ele não liga mais. Reiniciei duzentas vezes e nada além de raiva e ódio acumulando. O outro fone parou de funcionar. Mais dinheiro. E pra arrumar o computador, MAIS DINHEIRO! Comecei a me deprimir e pensar em meter um revólver na boca e puxar o gatilho. Mas eu não tenho revólver e pra adquirir um... Mais dinheiro! Desisti da idéia e chutei a CPU. Mas me arrependi porque se eu quebrasse tudo de uma vez representaria ainda MAIS dinheiro. Dai então eu levantei, liguei a filmadora, peguei o skate e estraçalhei a CPU com ele, peguei o monitor e joguei na parede, peguei uma marreta do meu tio e fiz suquinho de silício com aquela maldição toda. Dai então eu acordei; isso não aconteceu, claro. Infelizmente. Fiquei na dúvida se tomava uns cinco comprimidos pra dormir ou se ia na lan house ver quanto ia ficar pra formatar todas as minhas oito mil músicas e todos os meus duzentos textos. Como a lan fica perto da academia, resolvi botar o short e treinar um boxe para extravasar. Mas eu tava de samba-canção e os bagos ficariam à mostra. Dai eu peguei uma cueca e coloquei e acho que engordei nas pernas, sei lá, porque a cueca rasgou e eu pensei: MAIS DINHEIRO! Coloquei outra, anotei o e-mail no celular vim até a lan house. Mas não dá pra mandar o e-mail porque eu deixei o celular em casa porque a bermuda de treinar boxe não tem bolso. A hora custa R$1,50 e três horas custam R$3,00. Adivinha. Dou uma nota de cinco e recebo uma de dois. Depois dizem que são as mulheres que não podem ver desconto... Então eu entro num computador lento, com teclado horrendo, que não tem o Firefox (odeio o Internet Explorer), o fone - mais um na minha vida - não funciona e tá tocando Jota Quest na rádio enquanto um vizinho de computador aqui ouve um funkão maneiríssimo. Então eu abro meu e-mail e tem várias mensagens da faculdade me cobrando um boleto de janeiro (sim, janeiro, correndo juros de janeiro até agora) que, como o próprio funcionário da faculdade me falou "é possível que ele não tenha sido emitido e enviado ou tenha sido extraviado pelos correios, hahaha". Hahaha mesmo, eu, o motivo-mor de chacote que todo e qualquer mísero centavo pode pagar. E mais, no e-mail: os sites de vagas me oferecem emprego de motoboby pra ganhar metade do que eu ganho. Não desmerecendo, mas eu mal sei andar de bicicleta e nunca subi sequer na garupa de uma moto...

Aí então eu pergunto: é pedir demais ter um pouco de paz e ser menos extorquido e passado para trás em boa parte das 24 horas de todos os 7 dias da semana?

Obrigado pela atenção!

Rafael P Abreu
Enviado por Rafael P Abreu em 23/06/2010
Código do texto: T2337492
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