PRECISO ACHAR A VALQUÍRIA!
Vou caminhar. Lá na ponta da rua, de repente, eu a vejo. Baixinha, mais ou menos uns cinquenta e cinco anos. Segura uma bicicleta. Ao lado, uma menina. Acena pra mim. Vou lá. Sem mais nem menos ela põe um celular na minha mão.
_ Cê me ajuda aqui? Tô enrolada... Vê se cê acha a Valquira, aí pra mim. Sem óculos eu num enxergo...
_ A senhora quer...
_ É, acha a Valquira! Aí, cê achando, diz pra ela que tô aqui. Rente o predinho igual o combinado. Eu tô com a menina dela. A Valquira trabaia numa casa de famia, lá no bairro dos rico. Ela me paga 50 real pra buscá a Janaína na escola, né, Janaína? Deixa a moça vê sua cara, fia... Cê tá cansada Janaína? Merendô direito? Vô alembrá su’a mãe dos lumbriguero. Tô te achando um tantinho amarela. Pois é, a Valquira casô com o pai dessa menina, sabe? Mas o indecente não era fror que se cheira. Bebia, fumava aqueles negócio de maconha. Nunca ajudô com nada. Coitada da Valquira! Ficô sozinha com essa aí pra criar. Eu nem podia pegá essa obrigação de buscá essa menina... Sofro de coluna. Mês passado memo quase morri. Fui parar lá pra Belo Horizonte afora, credita? Pois é, fiquei ruim demais! Mais tenho dó da Valquira... Ela é uma muié trabaiadera, guerrera memo, só cê veno...
_ Pois é, o número da Valquíria...
_ Hã? Pois é, acha ela aí. Esqueci os óculos em cima da mesa, na hora de saí. Tô meio esquecida das coisas, sabe? Cabeça ruim. Hoje eu puis feijão pá cozinhar e... Janaína, para de brincar na terra, menina. Su’a mãe fica danada quando cê suja a roupa. Levanta daí... Pois então, o feijão esturricou, ficou pretinho, garrado na panela, perigo de contecê um trem munto ruim. Sorte que a vráuvula tá novinha. Minha cabeça não era assim, não. Foi dispois do meu quarto menino. Uma zuera nos ouvido, custo dá conta! O povo fala que é resguarde quebrado, né? A Valquira já me contô um caso na famia dela. A Valquira...
_ Ah! Pois é...Valquíria com V ou com W?
_ Isso! Acha ela aí no apareio. Sem óculos num tem jeito. Num enxergo nada miudinho. Só letrona dessas de porta de loja. Cumo é memo? Ah, é talbuleta. Nossa, gente! Alá, a Valquira! Apontô lá de bicicreta! Louvado seja Deus! Nem precisô docê chamar, né? Foi bão que agora eu entrego a Janaína e daqui vou fazê compra. Lá em casa num tem nada, sá! Lata vazia, geladeira peladinha. Mas a obrigação premero, né? Isso mi’a mãe sempre falava pra nóis...
Entrego o celular. Frustradaaaaa! Frustradíssima! Também pudera! Não tive a chance de achar a Valquíria. Quer saber? Talvez nem pudesse! Também não enxergo nada miudinho sem óculos, só letrona... Dessas de talbuleta...
*Essa delícia de encontro aconteceu ontem, por volta das 17h...