A Copa do tudo embolado
A Copa do tudo embolado
(*) Texto de Aparecido Raimundo de Souza.
Confesso meus prezados, nunca vi tantos nomes esquisitos na minha vida pronunciados o tempo todo, de boca em boca, num só lugar. Aliás, por aqui, em meio ao frio glacial da África do Sul, não se fala em outra coisa. Acostumado a conviver com Kaká, Robinho, Luiz Fabiano, Elano, Nilmar, Julio César, Roberto Carlos, Pelé, Tiririca (Tiririca não, pelo amor de Deus), confesso, está sendo difícil pra caramba permanecer ao lado dos meus colegas, e, para não perder a amizade, ou ser chamado de chato, ficar ouvindo, indefinidamente eles repetirem: “Marchetti pra lá, Zambrotta pra cá, Cannavaro não sei das quantas pra aculá, Chiellini, Criscito, De Rossi, que mordeu o cangote de Montolivo Camoranesi e Gilardino que, ao invés de vestir a cuequinha lilás ganhada da Fifa, preferiu o fio dental presente do técnico holandês, Bert van Marwijk.
Pior que castigar os escutadores de novelas a ouvir (além das bumbumdelas) a massa enfurecida dentro dos restaurantes, nas praças, ruas e avenidas pedindo a cabeça de Dunga numa bandeja, é conviver com Diego Maradona andando pela cidade com um gatinho que apareceu misteriosamente nas malas de Juan Sebastian Verón. Parece que a intenção do técnico argentino era batizar o pobre bichano de Paston (alemão?), ou Sigmund (Freud?). O porta voz Andrés Ventura declarou aos jornalistas, numa coletiva convocada às carreiras, que prefere um nome mais popular, tipo Nelsen (Piquet) ou Vicelich (eu ligo, eu ligo), ou quem sabe Lochhead, Brown (será que ele pensou em Charles?). O zagueiro Walter Samuel acha mais popular Elliot, Bertos, Smeltz, Fallon (fallon, ta falado e fim de papo) ou, por último, Killen. Kilen - não sei se os leitores comungam do mesmo pensar - me parece kilo, ou algo assemelhado berrado pela multidão ensandecida em algum dialeto javanês.
Não quero parecer piegas, acreditem, mas odiaria se no dia em que vim ao mundo papai tivesse me levado no cartório e me batizado de Souleymanou, Ekotto, Bassong, Nikoulou (com Super Bond?), Mbia, Eyong, Geremi, Emana ou Webo (Aboubakar), ou mesmo Eto’o. Ficaria deveras furioso com mamãe, se caísse na esparrela e se deixasse levar nas águas da tia Cândida (conhecida no bairro inteiro como água sanitária) e desse urras de alegria pactuando com a idéia marota de fazer constar na minha certidão de nascimento um Sorensem, Jacobsen (agora depois da recontagem só coube oitenta), Kjaer (qui já era), Agger, Poulsen, Gronkjaer, Rommedahl, Bendtner e tomassom (toma o som e dá pra quem?).
Imaginem os amigos mais chegados experimentando salientar salientemente estas preciosidades para não fazer feio diante da turma do copo no bar do Charutão: Kingson, Pantsil, Jonathan, Addy, Sarpei (cai em pé), Annan (Annan é a senhora sua vovozinha, meu chapa), Boateng, Tagoe, Kwadho, Asamoah Muntari (vou muntarai no seu traseiro), Milovan Rajevac (não confunda com as famosas pilhas amarelinhas).
Esquisito mesmo seria na hora de me encontrar com a namorada e, no instante em que estivéssemos tirando feijão da boca um do outro, aparecesse o pai dela um lusitano porreta com um cassetete nas mãos e me chamasse para uma conversinha de pé de ouvido. Se eu tivesse um patronímico estrambótico nos moldes do Schwarzer, Rukavytsya, Chipperfield, Bafokeng, Kawashima, Nagatomo, Okubo, será que ele conseguiria acentuar com a precisão devida os contornos mágicos da sua verdadeira conotação? Pelo sim, pelo não, meus amados, só desvendarei este mistério se a Seleção brasileira conseguir passar pelos portugueses, na sexta-feira.
(*) Aparecido Raimundo de Souza, 57 anos, é jornalista.
De Johannesburgo – África do Sul,22 de junho de 2010.
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