Apelidos: nosso outro nome de infância (Lembranças do quintal da minha avó!)
Todo mundo conhece a criatividade do povo brasileiro para dar nome ás coisas e ás pessoas. Essa inventividade parece estar presente em nosso DNA e quando começamos a crescer, começamos habilmente exercita-la. Eu, quando ainda criança, comecei a praticá-la nos campinhos de futebol. Ali era, a igreja onde iniciavamos e eramos iniciados na arte de apelidar. A sua técnica consistia unir alguma coisa que ressalta na personalidade ou no corpo da pessoa ao nome de alguma outra coisa (animal, diminutivos e etc). O seu sucesso consiste em perceber que esse apelido quando pronunciado possa causar um riso danado nos outros. A arte de dar apelido ás pessoas tem sua versão desenhada nas charges. O apelido é considerado clássico quando se entranhe de tal forma que incorporado ao vivente substitua para todo o sempre o nome de batismo e de cartório da pessoa.
Expressões não se prestam para este fim, ex. chamar uma pessoa muito alta de "vara de apanhar estrelas", embora soe engraçado, jamais será guindado ao status de um apelido clássico. Expressões são linhas imensas, apelidos são estações. As expressões, por ser de natureza diversa dos apelidos, na minha infância, elas serviam para no calor da discussão você tenta ironizar ou depreciar seu inimigo, ex: "vá tomar no.....seu filho duma .....", "pescoço de girafa!", "vara de apanhar mamão", "macacão do filme do Tarzan"e por aí afora. Já o verdadeiro sucesso, os apelidos que ganhavam o status de um nome, ou ao menos era a ele associado, era feito de um nome breve, curto e conciso, um dedo tocado direto na ferida, ponto direto ao assunto.
Após ser dado um apelido os outros do grupo tinha que aprová-lo.
Isto se dava quando divulgado o apelido os outros concordavam com tal chacota e passava a utilizá-la sempre.
O apelido, era como uma impressão digital e todo mundo do grupinho tinha o seu. Os apelidos que mais pegava eram aqueles que quando dado á algum garotom , ele ficava possesso de raiva.
Se escolhido o apelido o pequeno não concordasse, este apelido certamente estava fadado ao sucesso.
Alguns, eu me lembro, eram derivados de nome de família, porque já era apelido do pai do garoto e assim ele acabava sendo nominado pelo apelido do pai. Por conta disso, tínhamos a família "Carmelito", Jorgin "Carmelito" e o Nenê "carmelito". Ficou de fora, mesmo tendo o nome "Carmelito", um dos irmãos, que ficou sendo apelidado de "Maninho", que era engraçado, porque o apelido no diminutivo era de um cara muito grande para sua idade. Tenho uma tia que no início antes de tudo era Lourdes, ficou sendo Lurdinha para até os dias de hoje; Um primo meu ficou sendo nominado de "Nóca", apelido que sua mãe havia lhe dado quando criança. Com o passar do tempo e devido ao seu hábito de beber leites em grandes quantidades, nós trocamos o "Nóca" por "Gatin", o que lhe deixou exasperado; lembro-me de um amigo chamado José, filho do seu Zico e da Dona Lourdes, que como todo José, passou a ser chamado diminutivamente de "Zé" e por não gostar de comer mandioca, arrumamos um aditivo ao seu apelido e passou a ser chamado "Zé mandioca", para o todo sempre e até o nunca mais.
O irmão do " Zé Mandioca", era magrinho e cabeludo e, de Antônio Carlos, passou a ser chamado "Chitinha", irmãos destes, os gêmeos Otair e Odair, eram mais conhecidos como os "Os geminhos";
um grande amigo que no primeiro dia de aula, ao invés de o colocarem no primeiro ano, foi para o jardim escolar, sendo o único grandão entre as crianças, antes de se aperceberem do erro, virou o Jair "dupré". Tendo segredado o pecado dos outros, acho de bom tom, também contar o meu. De natureza quieta e disposto a ajudar sempre as pessoas, meu apelido inicial era uma expressão : "o bom, fiho da preta" ou "o bom,filho do mané!" Primeiramente, suprimido o filho, virou o "O bom da Preta" ou o "O bom do mané". pois o "do" já implicava que era pertecente ou de alguém e, como todos do conheciam meus pais, o "do" tomou eficientemente o lugar do filho. Apesar da primeira redução, com a supressão do filho, ainda meu apelido continuava sendo uma expressão : "o bom do mané".
A providência foi tomada por meus parceiros que acabaram também por eliminar o "do". Sem nunca ter sido em nenhuma fase de minha vida um morador tipico da roça ou do sítio, sem nunca ter sido um garoto abobalhado, meu apelido, diminuído mais um pouco ainda, ficou então, "bom mané".
Agora sim estava perfeito! Por ser, quando criança, de natureza bondosa e dócil meus companheiros de travessuras me olhavam, para minha raiva e desespero, e falavam jocosamente uns para os outros: "Bom mané!"