“Besteira”, o coveiro
O nome da figura é Davino Roberto da Silva, conhecido por “Besteira”. Conheço desde criança. Quando jovem, tinha a mania de acompanhar enterro, mesmo de pessoas desconhecidas. De tanto gostar de enterro, acabou como auxiliar de coveiro em Itabaiana, pretendendo subir na profissão, chegar ao cargo de coveiro chefe, aquele que é mais poderoso do que o juiz: prendeu, ninguém solta.
“Besteira” é uma pessoa super simples e bem humorada, muito divertida. Quando eu trabalhava na estação ferroviária do Triângulo, recebia todas as tardes a visita de “Besteira”, para dizer besteiras e comprar o nosso lanche. Encontrei “Besteira” besteirando pelas ruas de Itabaiana. Uma pessoa que nunca me decepcionou. Será sempre o mesmo, não sabe fingir, é ingênuo, de uma simplicidade poética.
A vida é feita de escolhas. A de “Besteira” foi amar o cemitério e os rituais da morte. Reparo no aspecto abatido, corpo gorducho do antes franzino “Besteira”. O contentamento é o mesmo. Nunca foi visto denotando tristeza ou raiva.
Augusto dos Anjos escreveu: “Amo o coveiro, este ladrão comum que arrasta a gente para o cemitério! A morte, esse danado número Um, Que matou Cristo e que matou Tibério”. E vai matar “Besteira” um dia desses. Será, enfim, o ápice de sua vida. O melhor momento de sua existência, quando finalmente descansará dentro do caixão de pobre, num canto qualquer do campo santo, covão escavado por antecedência pelo próprio “Besteira”.
Davino Roberto da Silva, nosso “Besteira”, nunca bebeu nem fumou, dizem que ainda continua donzelo. Os únicos prazeres: enterrar defuntos, comer e dizer graçolas infantis pelas ruas. Aquele que nunca muda o humor, jamais teve um momento de raiva. Quando morrer, vai entrar no céu igual a Anastácia de Manuel Bandeira, sem pedir licença. Com os fundilhos sujos de terra da necrópole e um belo sorriso idiota na cara larga e gorda.
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