REEDITANDO IMAGENS DO CÉREBRO.
Dezoitos horas em ponto, fui, empurrado para dentro do trem na estação Sé do metrô.
O aperto era tão grande que não consegui colocar um dos pés no chão do vagão, na minha frente com as costas grudada no meu tórax, estava uma moça abraçada a um rapaz.
Ele me lançou olhares ferozes como a me dizer:
_ Se esfregares em minha mulher com safadeza, eu te mato. -
Respondi com outro olhar: _ Sou um homem cheio de defeitos, mas neste momento vou agir como um cavalheiro, não vou me esfregar na sua mulher, além do mais se queres que ninguém se encoste a ela, é melhor arranjar outro meio de transporte neste horário. –
Os minutos até chegarmos à estação D Pedro II, pareceram uma eternidade, na estação ninguém desceu ao contrário outros passageiros tentaram entrar sem sucesso.
Os olhares indignados do Moço despertaram em mim velhas lembranças do passado.
Vi-me, na adolescência na sala de aula.
A professora me olhando com este olhar de raiva, e me dizendo:
_ Você é o pior deles, dá uma de santinho, mas sei muito bem o que faz...
Antes que ela continuasse a falar, meus colegas cúmplices, e minha amiga Carmem, vieram em meu socorro, discutindo entre eles e fazendo perguntas para a professora, desviando sua atenção sobre mim.
Esta intervenção veio em boa hora, com certeza acabaria confessando que usava espelhinhos para olhar por debaixo da sua saia.
Corria o risco de ser expulso da escola e perder a bolsa de estudos, naquela época nas escolas públicas não havia ainda o ginásio.
Carmem era a aluna mais velha da classe, pois era repetente de ano, se afeiçoou a mim, conhecia a minha condição de aluno bolsista, com a situação financeira difícil.
Protegia-me, abertamente dos maus tratos dos colegas, em retribuição usava minha facilidade em aprender matemática para auxiliá-la.
Em meio as comemorações de fim de ano fiquei triste, Carmem se mudava para outro colégio, a professora também não lecionaria mais no próximo semestre, ao me dar parabéns por ter passado de ano, me beijou no rosto, vi no seu olhar que tinha esquecido a minha molecagem.
Percebi que o terceiro ano, do então ginasial, ( atual sétima série do fundamental ) sem minha amiga protetora e aulas daquela linda e maravilhosa professora, seria um ano sem graça.
As portas do trem se abriram na estação do Braz, despertei para a realidade, o casal desceu, o rapaz me endereçou um último olhar, a me dizer;
_ O Senhor me desculpe, devido ao meu ciúme, fiz uma idéia errada da sua pessoa... -
Senti sinceridade, e respondi também com uma última olhada: _ Está tudo bem...
O trem seguiu seu destino, fiquei pensando... “ Nós seres humanos somos incríveis, mudamos o nosso interior em frações de segundos.
O moço estava a ponto de me agredir, daí a pouco já me pedia desculpas."
Todavia este seu último olhar de pedidos de desculpas, criou em meu interior uma verdadeira luta interna.
Sua primeira olhada me levou a lembrar da raiva e indignação da professora, a segunda, me recordou que não me desculpei.
Minha consciência doeu, agi com muito desrespeito em relação aquela mulher que me ensinou tanto.
Tentei me desculpar perante minha consciência, argumentando que aquilo não passou de molecagem de adolescente.
Afortunadamente, meu juiz interno está desperto, ele não aceita argumentações e justificativas de mal proceder.
Naquela época, com a ajuda dos amigos escapara de sofrer os efeitos do meu desrespeito.
Todavia, agora não conseguia escapar da minha consciência.
Verdadeira agonia se instalou no meu interior, o que fazer?
Lembrei-me dos ensinamentos do Iluminado Professor..
( O livro Códigos da Inteligência... Augusto Cury )
“É impossível apagar as imagens do cérebro, mas podemos reeditá-las.”
Uma doce esperança nasceu dentro de mim.
Ah.. nunca é tarde para se desculpar.
Dentro do trem ainda lotado, fechei os olhos e busquei as imagens da minha adolescência.
Vi-me, novamente diante da professora, quando ela terminou de me repreender, me ajoelhei e pedi, com o coração perdão pela minha falta de respeito.
Um grande alivio tomou conta de mim.
Enderecei uma prece.
Pedi a Deus, que onde estivesse esta professora ela recebesse o meu sincero pedido de perdão.
Com toda a certeza ela não se lembra mais do ocorrido.
Para mim o mais importante é ficar em paz com minha consciência.
Reconheci a falha, alterei as imagens negativas do desrespeito, por imagens de pedidos de desculpas.
Cheguei ao meu destino. Desci da estação feliz. em paz comigo mesmo.
O acontecido estava dentro de mim há décadas, aguardando solução.
Refletindo, me Perguntei:
"Quantas coisas há ainda dentro de meu interior para serem
solucionadas ?"
“ Já dizia um grande sábio, a medida que subimos na compreensão da vida teremos que adentrar dentro da nossa consciência e atender o que ela nos pede, sem atende-la não existe o progresso do ser”