Caro Leitor

“Quero falar de uma coisa...” Não sei do que é. Falar ou não falar? “Eis a questão!” Inspirar-me? Em que ou em quem? Usar a técnica? Seria muito frio!

Mais de uma vez ouvi falar: “Criação é cinco por cento de inspiração e noventa e cinco por cento de transpiração!” Posso concordar? Ou devo invocar a presença de uma Musa? Admiro mitologia, mas não chego a tanto! Incomodar aos Céus com propósito tão egocêntrico não me parece muito cristão. Resta-me quebrar os blocos da língua, burilá-los e apresentá-los polidos (Encontrarei “uma pedra no meio do caminho”?).

Acho que vou morrer e escrever minhas Memórias póstumas. Ser “um autor-defunto ou um defunto-autor” já chamou atenção. Então matarei de amor! Como, se não acredito que o maior e mais belo dos sentimentos mate alguém?

Resolvi continuar vivo para conversar contigo que nem sei quem é, mas que está aturando este texto que se arrasta a exatas cento e sessenta e sete palavras contadas até a palavra exatas (a propósito, confira. Sou péssimo para contar!). Não fique zangado comigo! Prometo não te importunar se me ler até o final (um texto pode morrer se não for lido).

Proponho-me terminar a escrita se você passar demoradamente seus olhos por ela (os ouvidos, os dedos, o nariz e o coração também. Afinal de contas você deve ler de maneira plena mesmo que não me valha da sinestesia como recurso estilístico).

Veja se me ajuda, leitor. Não sei como começar. Dê-me uma dica. Fale da decoração da sala onde está sentado, da reunião ou da aula chata que está fingindo assistir. Sua cama tem colchão e travesseiros anatômicos? Sua rede está balançando muito na varanda? Dê uma parada na leitura e olhe pela janela da condução para me dizer da paisagem (se possível, mande-me uma foto).

Guardarei todas as respostas “debaixo de sete chaves dentro do coração” e as propagarei como nas canções que do Milton ouvi.

Agora nossas idéias sairão pros quatro cantos usando dos ventos e das marés.

Não importa do que falar. Gravar nossas palavras nos raios de sol e imprimi-las todas as manhãs no brilho de um sorriso é preciso. Escrever não é preciso.

São Gonçalo, 04 de maio de 2002 (terminado às 23h14’)

Oswaldo Eurico Rodrigues
Enviado por Oswaldo Eurico Rodrigues em 20/06/2010
Reeditado em 13/04/2020
Código do texto: T2330288
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