Adeus não é nunca mais

Nunca mais ver alguém é complicado.

Nunca mais ver uma pessoa é até mesmo raro, e por isso a ideia não tão dolorosa... Mas a vida tem dessas coisas.

Dizer adeus não dói. Dizer adeus é simples, é comum, acontece o tempo todo e o ato vem seguido de uma saudade chata de uma ou até mesmo de ambas as partes, às vezes segue-se também um período de alegria, afinal, tudo pode ser bem mais simples. Dizer adeus vem antecedido de uma decisão, de uma notícia, de um fato, de um problema, de uma briga, de algumas lágrimas, de uma batida forte, aquelas das quais o cinto de segurança do carro não consegue dar conta sozinho exatamente quando o anjo da guarda está meio afastado.

Dizer adeus sem querer é triste, dizer adeus por vontade própria é apenas mais uma escolha, mais uma decisão, só mais uma palavra proveniente de um sentimento, palavra que está sujeita a todas as alterações de humor que existem, assim como qualquer outra escolha que um coração faz.

Adeus é um caminho, apenas isso. Um caminho com duas mãos, como todos os outros que encontramos pela vida e que valorizam e respeitam todas as nossas dúvidas e inquietações: Dizer adeus tem duas mãos, você pode ir, assim como pode se arrepender no momento seguinte e voltar atrás. A gente pode e deve tentar.

Dizer adeus é liberdade, é fé, ninguém procura ou deseja o sofrimento, indiferentemente de onde esteja. Dizer adeus é procura, é busca, e o direito de encontrar a beleza é reservado a todas as criaturas existentes. Resumimo-nos à busca pelo belo e, se o encontramos, não importando onde, devemos ser gratos, não é mesmo?!

Dizer adeus é respeito, é lembrança, é reconhecimento de que um dia viveu-se.

Nessa constante busca, quando em paz, estamos sujeitos apenas ao nosso próprio interior, nossas vontades, nossa saudade, nosso abuso, nosso deleite particular... Dizer adeus não é nunca mais ver uma pessoa.

Nunca mais ver uma pessoa é mais complicado do que dizer adeus, nunca mais ver alguém é até mesmo raro, mas, como já deixei dito, acontece.

Nunca mais ouvir falar em um nome sim, é doloroso... E ainda mais quando continuamos a ouvir aquele nome ecoando por todos os lados, e já não o assimilamos a um rosto que se destaca entre tantos outros.

Nunca mais ver alguém é um vazio, é um buraco de minhoca, é um atalho, é algo que simplesmente não tem mais volta, e nem um arrependimento por ter dito adeus pode tapar o buraco. Somos sugados por ele, e enquanto percorremos sua extensão, é impossível segurar forte nas laterais para impedir o futuro de acontecer, mesmo que você tente e grite, grite até ficar sem voz. Ficar sem voz é um sinal de que você nunca mais vai ver alguém, é acordar de um sonho e tentar voltar e, sem sucesso, não conseguir. Ficar sem voz é limitar-se, nunca mais ver uma pessoa é um limite também.

Nunca mais ver alguém é espiritual, é um pertence nosso que vai embora, é muito mais do que física, é o desperdício do nosso egoísmo, é uma raiva que nenhum chá consegue acalmar, é uma insônia inconsciente e um medo descomunal, é a perda de uma esperança, de um pedacinho da gente que nunca mais pretende voltar. É perder a ausência consentida, as reconciliações, a saudade, o nosso lugar, aquele pra onde a gente corria no fim da tarde, é perder um porto... E um porto é aquele colo que não se importa com mais nada.

Dizer adeus é uma exclusividade, nunca mais ver alguém é a falta dela. Dizer adeus é um direito, nunca mais ver uma pessoa é a falta de direitos. Ta aí: Nunca mais ver alguém é falta.

Adeus é dever, é saudade antes. Nunca mais ver alguém é saudade, saudade depois, e a saudade depois é em vão.

Dizer adeus é previsível, nunca mais ver alguém é um fenômeno.

E acontece tudo tão rápido que você mal vai perceber quando nunca mais for ver alguém...