Nada pela metade

Como já dizia Caetano Veloso, é "incrível a força que as coisas têm quando elas precisam acontecer".

Literalmente falando, algumas coisas estão além das minhas forças. Uma vez escrevi que algumas situações com certos propósitos não sobrevivem em estado algum quando são impedidas de atingirem seu ápice. Ou tudo, ou nada! Sem meios termos ou terceiras opções. É ridículo separar um corpo em órgãos, não existe vida digna em partes e todo sentimento que não tenha em si tudo o que essencialmente abriga, como se fosse simples, deixa de ser. E tudo de bonito, quando classificado em partes, corre grave risco de perder a beleza.

O que mais predomina e nos domina, ainda que grande, a olhos cruéis é parte. Palavras, às vezes, são coluna e parte feia e bruta feita para sustentar um edifício de nós em fitas coloridas de cetim, que não atam nem desatam e ligam a coluna aos mais variados ramos de tantas ciências que não divergem quando se unem para criar algo tão nobre quanto um propósito. Sem meu edifício de entregas, olhares, toques, passos, forças e correntes elétricas, de que me servem as palavras, as declarações e as metáforas, independentemente das belas formas e rimas que são capazes de criar a partir de si? Palavras voltam à insignificância a qual são destinadas na solidão, como acontece a qualquer pedaço de vida que encontra-se só.

Acho que por isso não dá. Querer limitar algo à sua parte mais bonita, nobre, sensata e aparentemente mais imaculada de nada presta, é arrogância achar que se pode continuar crescendo ao desprezar partes que foram indispensáveis até o momento presente. Não dá certo porque nos podam, não dá certo porque a vida encontra um jeito de acontecer, ainda que seja arrebentando todas as barragens que nossas convenções estúpidas e auto-suficientes construíram caminho a fora. Necessário é aceitar as coisas como elas são, para que não sejamos por elas arrebatados sem discernimento algum; porque de auto-suficientes não temos nada e disso de auto-suficiência nada tiramos, não por a vida nos negar, mas por pura insistência nossa em contrariar o que talvez já tenha sido formulado sob medida e escrito, exatamente para nós.