Eu olhei e ela, melíflua, retribuiu meu olhar cintilante de encantamento e voracidade. Meu olho comprido galgou, com a mesma rapidez de um guepardo, todos os ângulos possíveis, degustando a um só tempo, suas cores e texturas. Reais e imaginárias. Era meu antílope, descoberto entre tantos outros, numa savana misteriosa de celofanes, sedas e laminados, recortada de delicadas flores de marzipã.
Meu Deus! Tinham razão, os astecas. Aquilo só poderia ser um presente dos deuses! Obstinados deuses, que insistiam em por a prova a fraqueza humana. Eu derretia de pecado. Podia sentir, pelo vidro da vitrina, o cheiro quente e amolecido daquele precioso manjar. Água na boca, não. Uma nascente fluía, inundando minhas jugulares, enquanto fantasiava o voejo de meus dedos alongados, lento como os movimentos de uma serpente traiçoeira, indo, indo, indo em direção à presa, seguro de seu bote, convencido da captura.
Estavam lá, com trufas, avelãs, cereja ao licor, cremes de marula, limão, maracujá, nozes picadinhas... E de todas as cores: rosa, marrons, delicados lilases, branco... E de todas as formas: quadradinho, redondinho, com enfeite, sem enfeite... Especialmente aqueles, aqueles, aqueles, bem ali, quais já saboreava antecipadamente e já sentia em pedaços amolecidos entre meus dentes e língua.
A caixinha em forma de coração, revestida de vermelho, em desenhos trabalhados em branco. Dentro, coraçõezinhos esculpidos em chocolate belga, anunciados como presentes de amor, recheados em três camadas com trufas apaixonadas.
Abri a porta da loja e me apresentei como um capitão à frente de sua tropa. Com a autoridade que me competia apontei para ela: aquela! Pronto! O felino abatera sua presa. Agora era preciso arrastá-la até um lugar bem sossegado, à sombra, a sós, longe, bem longe de outros possíveis predadores. Nossa, bom de doer!