COMO ERAM AS COISAS ANTIGAMENTE?

Lêda Torre

Hoje, tenho 52 anos de idade, mas desde que eu me entendo como gente, que ouvia falar de antigamente. Quando era criança, eu ficava a imaginar, o que quer dizer antigamente? Como na época dos meus tempos de criança em 1957, anos sessenta, anos 70, anos 80 e por aí vai, que as leis de nossos pais, eram duras, cresci ouvindo principalmente de minha mãe, as frases, ou melhor, os anexins, como: as “moças chamavam-se mademoiselles e eram todas mimosas e muito prendadas”.

“Não se fazia anos: completava-se primaveras, em geral dezoito. Os janotas, mesmo não sendo rapagões, faziam-lhes pé-de-alferes, arrastando a asa, mas ficavam longos meses debaixo do balaio. E se levavam tábua, o remédio era tirar o cavalo da chuva e ir pregar em outra freguesia. As pessoas, quando corriam, era para tirar o pai da forca e não caíam de cavalo magro. Algumas jogavam verde para colher maduro, e sabiam com quantos paus se faz uma canoa. O que não impedia que, nesse entrementes, esse ou aquele embarcasse em canoa furada. Encontravam alguém que lhes passasse a manta e azulava, dando às de vila-diogo. Os mais idosos, depois da janta, faziam o quilo, saindo para tomar fresca; e também tomavam cautela de não apanhar sereno. Os mais jovens, esses iam ao animatógrafo, e mais tarde ao cinematógrafo, chupando balas de altéia. Ou sonhavam em andar de aeroplano; os quais, de pouco siso, se metiam em camisa de onze varas, e até em calças pardas; não admira que dessem com os burros n’água.

Outros, ao cruzarem com um sacerdote, tiravam o chapéu, exclamando: “Louvado seja Nosso Senhor Jesus Cristo”, ao que o Reverendíssimo correspondia: “Para sempre seja louvado.” E os eruditos, se alguém espirrava — sinal de defluxo — eram impelidos a exortar: “Dominus te cum”. Embora sem saber da missa a metade, os presunçosos queriam ensinar padre-nosso ao vigário, e com isso metiam a mão em cumbuca. Era natural que com eles se perdesse a tramontana. A pessoa cheia de melindres ficava sentida com a desfeita que lhe faziam, quando, por exemplo, insinuavam que seu filho era artioso. Verdade seja que às vezes os meninos eram mesmo encapetados; chegavam a pitar escondido, atrás da igreja. As meninas, não: verdadeiros cromos, umas tetéias.

Antigamente, certos tipos faziam negócios e ficavam a ver navios; outros eram pegos com a boca na botija, contavam tudo tintim por tintim e iam comer o pão que o diabo amassou lá onde Judas perdeu as botas. Uns raros amarravam cachorro com lingüiça. E alguns ouviam cantar o galo, mas não sabiam onde. As famílias faziam sortimento na venda, tinham conta no carniceiro e arrematavam qualquer quitanda que passasse à porta, desde que o moleque do tabuleiro, quase sempre um cabrito, não tivesse catinga, e cendeira fosse queta...

Acolhiam com satisfação a visita do cometa, que, andando por ceca e Meca, trazia novidades de baixo, ou seja, da Corte do Rio de Janeiro. Ele vinha dar dois dedos de prosa e deixar de presente ao dono da casa um canivete roscofe. As donzelas punham carmim e chegavam à sacada para vê-lo apear do macho faceiro. Infelizmente, alguns eram mais do que velhacos: eram grandessíssimos tratantes, ou estradeiros...

Acontecia de o indivíduo apanhar constipação; ficando perrengue, mandava o próprio chamar o doutor e, depois, ir à botica para aviar a receita, de cápsulas ou pílulas fedorentas. Doença nefasta era a phtysica, feia era o gálico. Antigamente, os sobrados tinham assombrações, os meninos lombrigas, asthma os gatos, os homens portavam ceroulas, botinas e capa-de-goma, a casimira tinha de ser superior e,London, não havia fotógrafos, mas retratistas, e os cristãos não morriam: descansavam. Tudo isso, era antigamente, isto é, outrora.”

Tudo isso, cresci ouvindo, e mais, muito mais, como: “quando íamos pro rio Itapecuru tomar banho, nossa mãe costumava dizer que “água não tinha cabelos...” e que ela ia cuspir no chão, caso o cuspe secasse, a pisa (surra) era garantida; se namorássemos, tínhamos que ser difíceis, pois o homem que é homem, só gosta de mulher difícil; as fáceis eles só querem embustiar...; e que tivéssemos cuidado com as piranhas do rio, porque em rio que tem piranhas, até o jacaré nada de costas...; e homem não é gente, caiu na rede, ele apanha, tudo é peixe; não podíamos esquecer de que camarão que dorme na praia, as ondas levam; também nunca deveríamos esquecer que ao acharmos algo, o certo era deixar onde achamos...pois onde se vê se deixa; e menina não tem que andar muito, porque cobra que anda engole sapo...

E ao falarmos mal de alguém ou de qualquer coisa que não nos pertence, o anexim dito era: quem disso cuida, disso usa...etc....

Na verdade, se formos falar de tudo que ouvíamos na nossa infância, acredito que mais de dez páginas seriam preenchidas, mas vale ressaltar, que apesar de naquela época, antigamente, como se diz, analisando bem, hoje faço uso destes ditames de meus pais e dos mais velhos, considero-os todos, sabedoria pura, e foram muito importantes na minha educação, personalidade e caráter...sou o que sou hoje, graças a tantas lições tão ricas como estas...o que vale para muitos, tenho certeza..

Mas vale um passarinho na mão, do que dois voando...

Um abraço

Lêda Torre

__________________São Luis, 13/06/2010__________________

Lêda Torre
Enviado por Lêda Torre em 13/06/2010
Reeditado em 03/06/2015
Código do texto: T2317694
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