QUANDO BATE O NÃO...

 

Atestar, o quê? Qual insano especialista em coisas de corpo e alma, qual cientista que corre à captura de bichinhos do contra, qual desatinado curandeiro nos abonaria? Não há cartórios que certifiquem impulsos passageiros, encontros ocasionais. Bem sei que você adora o poder da propriedade, a posse pacífica mantida ao longo dos anos, eu sei. Conheço de vizinhança, a vaidade que seu ego cultiva como um diamante sem preço, aconchegado ao dedo indicador. Meu querido, fruta madura atrai pelo doce especial, natural, pelo mel fabricado das fibras que amelaçaram no tempo certo. Nem mais, nem menos.

Eu fui assim. Meu amor foi assim. Agora, a- po- dre-ceu. É! Eu sei o quanto estranho isso soa. Ainda mais assim a seco, no seco. Como é penoso imaginar não? O que parecia indestrutível, no assaz de um e outro momento, desfez-se. Não murchou, não fraquejou, não. Evaporou, como um pingo de éter que gotejou no pedacinho de chão onde caiu. Ah, nem vale a pena rememorar, andar sobre os mesmos passos, porque o caminho virou. Como rastros? Em redemoinhos? Amor! Giramos por voltas e voltas em vai e vens de ontens e amanhãs. Nenhum resquício de nós existe nesse hoje nem frio, nem quente. Aliás, tão infectado que não vale sequer ameaças de tentativas.

Meu bem, brincando um pouquinho, um pouquinho só, você até parece com aquele homem elástico. Sabe qual? Pois é, vem, vai... Parece mágica! Aparece, desaparece... Aliás, além de mágica, também parece mágico: faz brotar flores, ouros, vinhos... Do nada! De repente! Você me quer de plateia de acordo com as temporadas de seus espetáculos. Muita gentiliza sua organizar minha agenda, mas... Poxa, amor! Os meus compromissos, você esqueceu? Como não? Tenho acordos comigo mesma, para começar. Acordos e, agora, até promessas. Pois é, fiz alguns juramentos que não cumpri e sabe o que aconteceu? Todos os santos me castigaram! Sofri tanto! Eu sei que você não imaginava, não podia imaginar! Não o culpo. Afinal, a desobediência foi minha. Você é e continuará sendo o anjo que sempre foi. Por isso, aliás, nossa convivência torna-se ainda mais impossível. Tem um diabinho vivendo aqui, no meu pensamento, que não permite qualquer aproximação de anjos. Façamos o seguinte: um dia, um domingo, um feriado, durante um carnaval, quem sabe?

Eliana Schueler
Enviado por Eliana Schueler em 12/06/2010
Código do texto: T2315469
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