DIPLOMATAS SEM DIPLOMA
O Presidente Ernesto Geisel nomeou para Ministro da Educação de seu Governo o Senador pelo Estado do Paraná, Ney Braga, um militar que o Governo Médici ameaçara de cassação e colocara na “geladeira” por suas convicções democráticas e manifestações públicas contrárias à aprovação do Ato Institucional nº 5. O Ato, que ficou conhecido com AI-5, dava ao regime militar poderes absolutos, cassava direitos constitucionais individuais, permitindo-lhe, inclusive, fechar o Congresso Nacional e intervir nas decisões do Poder Judiciário.
Nomeado Ministro do Governo Geisel, Ney Braga esteve à frente do MEC de 15 de março de 1974 a 30 de maio de 1978, tendo convidado para sua Assessora Especial a Dra. Sarah Abrahão, funcionária concursada e de carreira no Senado brasileiro.
Fazia parte de suas atribuições preparar os despachos do Ministro com o Presidente da República. Essa preparação era precedida de um levantamento completo das demandas, acompanhadas da documentação e fundamentação legal pertinente. Eram projetos, propostas, reivindicações educacionais colhidas nas diversas áreas do Ministério. A partir daí, elaborava as minutas dos despachos, em duas vias, anexando a cada um deles da documentação pertinente. Depois de tudo em ordem e conferido, é que o Ministro lia, assinava e submetia à avaliação do Presidente Geisel.
Foi assim quando Ney Braga conseguiu instituir o Crédito Educativo aos universitários, hoje conhecido como FIES (Programa de Financiamento Estudantil). À época, funcionava assim: o Governo do Brasil, através da Caixa Econômica Federal, oferecia os recursos a custo zero a quem estava matriculado em universidade particular, mas não reunia condições financeiras para arcar com as mensalidades. O pagamento do empréstimo só começava um ano depois que o estudante concluísse seus estudos e no mesmo número das parcelas emprestadas.
Eu, que cursei a Faculdade de Economia a partir de 1974, fui uma das selecionadas e contempladas pelo Programa com esse benefício maravilhoso. Sem ele certamente não teria me formado. Nos últimos meses do financiamento, a prestação era tão pequena, que resolvi quitar várias de uma só vez.
A Dra. Sarah, conhecendo o empenho do Ministro a favor da formação acadêmica, certa vez resolveu ousar. Chegara ao seu conhecimento a desastrosa situação enfrentada por um rapaz que, tendo concluído o curso de Diplomata no Instituto Rio Branco, não foi aceito para prosseguir os estudos em uma Universidade no exterior, simplesmente porque o curso sequer era reconhecido no Brasil como Curso de Nível Superior (3º grau).
Naquele dia, ao preparar os despachos, inseriu lá no meio dos demais, a minuta de reconhecimento do curso de Diplomata. O Ministro, percebendo que não havia sido anexada a documentação de praxe, questionou:
- Dra. Sarah, qual é a origem deste pedido? Qual é o Setor interessado nesta proposta?
Ao que ela respondeu:
- O Setor sou eu mesma, Dr. Ney.
O Ministro, ao ouvir suas justificativas, sorriu e disse:
- Vamos manter a inclusão, mas acredito que, na melhor das hipóteses, o Presidente encaminhará o assunto ao Ministro Azeredo da Silveira (*)
Normalmente, o Presidente Geisel era bem objetivo em suas decisões. Escrevia simplesmente “sim”, “não”, “para melhor estudo”, “sim, desde que...”
Qual não foi a surpresa de ambos, quando leram o despacho favorável: “sim, desde que se ouça o Ministério das Relações Exteriores”.
Já que a iniciativa fora dela, o Ministro Ney Braga a designou para coordenar o restante do processo. Assim é que contatou imediatamente o Reitor do Instituto Rio Branco, Professor Alfredo Valadão, que lhe informou sobre essa antiga luta dos diplomatas para que o Ministro das Relações Exteriores levasse referida proposta ao Presidente. A novidade transformou-se em festa nos dois Ministérios e manifestações de gratidão por parte do Corpo Diplomático à proponente. Formaram então um grupo de trabalho e, em pouco tempo, estava pronta a documentação de reconhecimento do curso, que recebeu o “sim” definitivo do Presidente Geisel, colocando ponto final nas limitações e constrangimentos por parte dos diplomatas brasileiros no exterior. Hoje o Curso de Diplomata é oficialmente reconhecido como Curso de Pós Graduação.
(*) Ministro das Relações Exteriores
Essa história foi contada pela própria benfeitora, logo após recebermos o Embaixador da Síria, Dr. Ghassan Obeid, em nossa residência. Naquele dia, os pés de Melão de São Caetano, na entrada da casa, estavam carregados de frutos maduros, mostrando-nos suas lindas sementes vermelhas através das frestas do seu casco.
(publicado no Diário de Catalão de 09 -jun- 2010)
O Presidente Ernesto Geisel nomeou para Ministro da Educação de seu Governo o Senador pelo Estado do Paraná, Ney Braga, um militar que o Governo Médici ameaçara de cassação e colocara na “geladeira” por suas convicções democráticas e manifestações públicas contrárias à aprovação do Ato Institucional nº 5. O Ato, que ficou conhecido com AI-5, dava ao regime militar poderes absolutos, cassava direitos constitucionais individuais, permitindo-lhe, inclusive, fechar o Congresso Nacional e intervir nas decisões do Poder Judiciário.
Nomeado Ministro do Governo Geisel, Ney Braga esteve à frente do MEC de 15 de março de 1974 a 30 de maio de 1978, tendo convidado para sua Assessora Especial a Dra. Sarah Abrahão, funcionária concursada e de carreira no Senado brasileiro.
Fazia parte de suas atribuições preparar os despachos do Ministro com o Presidente da República. Essa preparação era precedida de um levantamento completo das demandas, acompanhadas da documentação e fundamentação legal pertinente. Eram projetos, propostas, reivindicações educacionais colhidas nas diversas áreas do Ministério. A partir daí, elaborava as minutas dos despachos, em duas vias, anexando a cada um deles da documentação pertinente. Depois de tudo em ordem e conferido, é que o Ministro lia, assinava e submetia à avaliação do Presidente Geisel.
Foi assim quando Ney Braga conseguiu instituir o Crédito Educativo aos universitários, hoje conhecido como FIES (Programa de Financiamento Estudantil). À época, funcionava assim: o Governo do Brasil, através da Caixa Econômica Federal, oferecia os recursos a custo zero a quem estava matriculado em universidade particular, mas não reunia condições financeiras para arcar com as mensalidades. O pagamento do empréstimo só começava um ano depois que o estudante concluísse seus estudos e no mesmo número das parcelas emprestadas.
Eu, que cursei a Faculdade de Economia a partir de 1974, fui uma das selecionadas e contempladas pelo Programa com esse benefício maravilhoso. Sem ele certamente não teria me formado. Nos últimos meses do financiamento, a prestação era tão pequena, que resolvi quitar várias de uma só vez.
A Dra. Sarah, conhecendo o empenho do Ministro a favor da formação acadêmica, certa vez resolveu ousar. Chegara ao seu conhecimento a desastrosa situação enfrentada por um rapaz que, tendo concluído o curso de Diplomata no Instituto Rio Branco, não foi aceito para prosseguir os estudos em uma Universidade no exterior, simplesmente porque o curso sequer era reconhecido no Brasil como Curso de Nível Superior (3º grau).
Naquele dia, ao preparar os despachos, inseriu lá no meio dos demais, a minuta de reconhecimento do curso de Diplomata. O Ministro, percebendo que não havia sido anexada a documentação de praxe, questionou:
- Dra. Sarah, qual é a origem deste pedido? Qual é o Setor interessado nesta proposta?
Ao que ela respondeu:
- O Setor sou eu mesma, Dr. Ney.
O Ministro, ao ouvir suas justificativas, sorriu e disse:
- Vamos manter a inclusão, mas acredito que, na melhor das hipóteses, o Presidente encaminhará o assunto ao Ministro Azeredo da Silveira (*)
Normalmente, o Presidente Geisel era bem objetivo em suas decisões. Escrevia simplesmente “sim”, “não”, “para melhor estudo”, “sim, desde que...”
Qual não foi a surpresa de ambos, quando leram o despacho favorável: “sim, desde que se ouça o Ministério das Relações Exteriores”.
Já que a iniciativa fora dela, o Ministro Ney Braga a designou para coordenar o restante do processo. Assim é que contatou imediatamente o Reitor do Instituto Rio Branco, Professor Alfredo Valadão, que lhe informou sobre essa antiga luta dos diplomatas para que o Ministro das Relações Exteriores levasse referida proposta ao Presidente. A novidade transformou-se em festa nos dois Ministérios e manifestações de gratidão por parte do Corpo Diplomático à proponente. Formaram então um grupo de trabalho e, em pouco tempo, estava pronta a documentação de reconhecimento do curso, que recebeu o “sim” definitivo do Presidente Geisel, colocando ponto final nas limitações e constrangimentos por parte dos diplomatas brasileiros no exterior. Hoje o Curso de Diplomata é oficialmente reconhecido como Curso de Pós Graduação.
(*) Ministro das Relações Exteriores
Essa história foi contada pela própria benfeitora, logo após recebermos o Embaixador da Síria, Dr. Ghassan Obeid, em nossa residência. Naquele dia, os pés de Melão de São Caetano, na entrada da casa, estavam carregados de frutos maduros, mostrando-nos suas lindas sementes vermelhas através das frestas do seu casco.
(publicado no Diário de Catalão de 09 -jun- 2010)