DIA DOS NAMORADOS
Na véspera de doze de junho a madrugada foi chuvosa. Entre relâmpagos e trovões, dava para ouvir os pingos d’água batendo no solo, intermitentes. Quando o dia amanheceu, cheguei a acreditar que o mau tempo logo passaria, mas, a chuva continuou por quase toda manhã.
Uma manhã bastante convidativa para ficar na cama lendo um bom livro, ou assitindo a um bom filme, toda enrodilhada nos braços quentes do ser amado e um capuchino depois.
Num dia como este, a saudade ameaça dominar-me e tenho que lutar muito para não entregar-me de uma vez por todas à depressão que tua ausência deixou.
Vejo-te diante de mim a sorrir, os olhos iluminados de amor, os braços quentes a esperar que eu corresse ao teu encontro para me abrigarem. Procuro pensar em coisas alegres, não quero deixar as láguimas que me apertam o peito ganharem os olhos, deslizarem pela face.
Todos os anos em que estivemos juntos mantive a errônea ilusão de que não era preciso dizer-te quanto te amava, quanto eras importante, essencial para mim como o ato de respirar. Estavas sempre ali, e tua presença tornou-se um hábito. Acostumei a te ver rondar-me, sem entender que estavas sequioso por uma palavra, apenas uma, para saber quanto eu te amava.
Os anos que passamos juntos acabaram por criar confiança tamanha, por isso, pensei enlouquecer quando te vi entre nuvens no céu da manhã de quatro de novembro, com a camisa de listras azuis e brancas, minha favorita, e um sorriso tão amoroso nos lábios. Naquele instante compreendi tudo. Já não pertencias a este mundo.
Tento pensar nos amigos e amigas que também já habitam outro plano, a cada ano esse número se torna maior e breve chegará minha vez. É a lei natural da vida.
Não sei por que lembrei agora, havia uma senhora entre minhas colegas de trabalho que ostentava no peito um medalhão, espécie de camafeu com a foto de seu marido morto anos atrás. Ah, como costumam ser crueis, mesmo sem saber, os jovens...
Embora nada lhe dissesse, eu duvidava daquela devoção, tantos anos passados. Acreditava que não era possível alimentar tamanha saudade, cheguei a pensar que o camafeu continuava alí por vaidade, uma espécie de fetiche.
Até que um dia, sem que eu fizesse qualquer comentário a respeito, com um sorriso nos lábios e ironia na voz, ela fitou-me e disse: “Para você, a vida é muito fácil. Ainda tem o seu espírito santo de orelhas...”
Agora também não tenho mais o meu espírito santo de orelhas. Os dias, os meses e os anos estão passando. Dois anos passaram céleres diante do enorme vazio de tua ausência, e compreendi que qualquer forma de amor vale a pena.
MCC Pazzola