Yo no créo en piernas de mesa, pero que las hay, las hay!

Mamãe pegou todos os documentos necessários para terminar o processo do financiamento do carro: carteira de identidade, CPF e comprovante de residência.

Agora era só preparar o suco, tomar um lanche rápido e sair, pois estava em cima da hora. Mas, por mais pressa que se tenha, há etapas que não podem ser puladas. O jeito é engatar a primeira e, automaticamente, abrir a geladeira, pegar a garrafa d’água pra temperar o suco, fechar a geladeira, tomar o suco e – ufa! – colocar o material sujo dentro da pia. Lavar, agora, nem pensar.

Quanto aos documentos, achou ser melhor ficarem todos juntos numa pasta, pois a organização facilitaria na hora que a metralhadora do gerente começasse a disparar:
– CPF!
– Comprovante de residência!
– RG! RG... RG!!?!!

Como era possível ter desaparecido? Estava ali, bem ali em cima da mesa quando ela foi fazer o lanche!

Começou, então, aquela checagem, que se repetiu por várias vezes, mesmo com a certeza de que já tinha feito tudo, e bem feito. Abriu a toalhinha que cobria o pão, quem sabe estivesse lá dentro. Tirou tudo da mesa, repetiu o trajeto feito da sala para a cozinha, e depois fez o inverso. Até dentro da geladeira ela olhou. Nada!

Desanimada, foi pra casa da filha mais velha, que a esperava para o jantar. Conversa vinha, conversa ia, o assunto era sempre o mesmo – o documento perdido. Até que a Cida, eficiente secretária doméstica, a certo ponto ousou sugerir:

– A senhora já experimentou amarrar um guardanapo na perna da mesa? Funciona, viu?

A mamãe, fiel seguidora da nossa tradição suíço-evangélica, amarrar um guardanapo na perna da mesa para o RG aparecer?

Sim, claro que sim. De repente, em meio ao desespero, nada ficou tão natural quanto pegar o guardanapo adamascado – no capricho, né? – dobrá-lo em tira e abraçar a perna da mesa com um nó.

E olha que a coisa funciona rapidinho. Foi o tempo de respirar aliviada e, com a secura da garganta, tomar um gole d’água. Gelada.

E aí estava a chave do enigma. A água precisava ter sido a gelada, porque foi exatamente ao tirá-la da geladeira que o documento plastificado se desprendeu das gotículas no fundo da garrafa, e caiu no chão, aos pés de sua dona.

Talita Ribeiro
Enviado por Talita Ribeiro em 11/06/2010
Reeditado em 13/06/2010
Código do texto: T2313932