Amor carnal

Bom dia. Embora eu seja uma dessas pessoas que diz muito “eu te amo” na vida, eu sou cético em relação ao amor carnal. Amor é uma palavra grande demais para ser usada em relacionamentos sexuais geralmente libertinos. Talvez ainda não saiba, exatamente, explicar o porquê, mas me parece que onde se busca prazer carnal não se leva amor. Vai-se argumentar, como se fez a vida inteira, que para se fazer sexo é preciso uma “química” (que ninguém sabe a fórmula), e que fazer sexo com uma pessoa que a gente gosta muito e tem mais intimidade é muito mais prazeroso. Talvez seja verdade. Mas também é verdade que fazer sexo com quem a gente conhece se tem menos medo de errar e se fica mais protegido do novo, mesmo sem saber se ele é melhor ou não. Resumindo: amor e sexo não têm conotação. E nem lógica. São duas coisas diferentes, como arroz e feijão, que comidos juntos é muito bom.

O problema é a falta de parceiro, principalmente em relação aos homens. Por desejo da Biologia, os machos mamíferos foram programados para ficar cobrindo fêmeas férteis o dia inteiro. Para isso têm bilhões de espermatozóides e uma disposição sem fim. Já para as fêmeas, a Biologia programou um óvulo por mês, para ser fecundado e, mais que isso, para ficarem grávidas todos os anos até onde o corpo suportar. Como o homem tem autoconsciência, dribla a regra da Natureza, faz do sexo um prazer, controla a natalidade, formam casais infiéis mas bem treinados, e tudo mais o que já se sabe. E o Greenpeace não faz nada. Vai ver estão fazendo sexo também.

Como no caso dos humanos são as fêmeas que escolhem seus machos, e como os valores humanos não têm nada a ver com a Natureza e sim com os valores bancários, macho bom é o que o oferece segurança e prazer financeiro. Os demais sobram para as fêmeas em plena decadência. Mulher bonita, só para machos sarados e na idade, ou com um bom carro e um bom dinheiro para financiar a farra. Parece besteira, mas não é. E aí entra o fator da solidão dos machos que são deixados de lado por não atenderem aos “pré-requisitos” para o ato sexual, ou a “química”, ou seja o nome que se queira dar. Falando francamente, para esse tipo de homem, só sobra a masturbação e a pornografia, ou as mulheres que já não têm qualquer atrativo sexual, quando estamos justamente falando de atração sexual. Sempre tem um chinelo velho para um pé doente, diz o velho ditado, mas nem sempre é do nosso número, se encaixa ou é confortável. E, principalmente, produz ereção.

Mas, e quanto às mulheres que sofrem do mesmo mal? Não sei. Não sou mulher. Mas imagino que se tiverem apenas o corpo em ordem terão parceiros interessados por muito mais anos que os homens. Agora, gordas, derrubadas, feias, desleixadas, mal vestidas, cheirando bebida, sem carro, sem dinheiro e sem atrativos, deve ser mesmo pior que para os homens. Os homens “pobres”, se forem arrumadinhos e interessantes ainda podem, em teoria, e faço questão de frisar, em teoria, atrair uma mulher que tenha os outros atributos e dividir as contas, ser dona do carro, etc. Mas é raro acontecer. Muito raro.

E aí se quer colo, se quer afeto, se quer sexo, se quer ser lembrado, mas as coisas já não acontecem mais. Até a internet, que já foi um grande instrumento de agregar pessoas, hoje só se dá para a prostituição e para a vulgaridade. Viva a democracia e a inclusão digital, mas internet boa era a de antes do ano 2000, quando era só para ricos e a conversa era seleta. Tenho ainda hoje amigos daquela época e hoje não consigo fazer um amigo através dela. Eu quero ficar enamorado por alguém que se enamore por mim. Nem quero amar. Deixo isso para os jovens. Eles ainda precisam de ilusão. Mas, confiram vocês, como o ser humano tem “nojo” um do outro. Cada vez se afastam mais, cada vez tornam tudo mais difícil, cada vez confiam menos, cada vez exigem mais inutilidades, cada vez se bestificam mais. Mas se no meio dessa “nojeira” encontrarem um que tenha a tal da “química”, vira amor, transam pra caramba, se bobear são capazes de casar. Desde que atendidas às exigências citadas. É claro.

Ao mesmo tempo que é muito difícil entender, é fácil também. Imagine um mundo que só lhe mostre ilusão, uma TV que passe trinta novelas de ilusões, filmes e seriados onde só se mostre ilusões, e o mundo, assim, perde a referência. A culpa é da mídia, na medida em que mostra, mas não é da mídia na medida em que é isso que o povo quer ver. Se há quem quer ver, tem quem patrocina, tem quem sabe fazer bem feito, pedir para a mídia pensar no crescimento cultural da humanidade chega a ser um deboche. Seria de morrer de rir. Esse é o amor carnal que se aprende no mundo. Aquele que rola a “química”, blablablá, etc. É bonitinho de ver. Só que não se sustenta. São castelos de areia.

Mais textos em www.zecaparica.com.br