ENTRE COPAS E BEIJOS
Das minhas lembranças e do meu gosto pela arte do futebol ou futebol arte como preferirem, elegi as seleções de 70 e 82 como as melhores que já tivemos na história das copas. Não é assunto para polêmica uma vez que eu mesmo não me disponho a render assunto sobre isso. É só um gosto pessoal e pronto. Assisto meu futebolzinho caladinho no meu cantinho. Já temos técnicos demais no meio das torcidas que a meu ver poderiam repetir aqueles momentos de catarse coletiva dos estádios para resolver outros problemas graves que a gente vive no dia-a-dia e não consegue juntar gente nem para protestar nem para escalar outro time de dirigentes nas nossas administrações. Na hora do voto, a torcida sempre acaba jogando contra si mesma.
Pois foi em 82 que o meu amigo Joaquim se enamorou da Mariza pra valer mesmo. Paixão pra casar. O namoro engrenado nas noites Itabiranas foi parar na casa dela, afinal filha de família tradicional tem logo que levar o moço para ser apresentado aos pais e namorar ali, bonitinho no sofá da sala. Bonitinho mesmo era na rua. Em casa era apenas certinho, conforme o desejo e principalmente as exigências de moral e bons costumes de Seu Chico e Dona Maria, de saudosas memórias. Joaquim sempre foi um apaixonado pelo futebol, e pela Mariza, claro! Naquela época, o Brasil inteiro achava que a gloriosa seleção de Telê Santana traria o caneco, que desde a Jules Rimet não dava o ar de sua graça e enfeite nas cristaleiras de troféus da CBF. O time era imbatível na opinião quase unânime dos brasileiros. Não podendo fazer muita coisa libidinosa no sofá da sala, o negócio era acompanhar as novelas e programas da televisão, sentados na companhia de Seu Chico e D. Maria. O futebol também era do gosto do sogro, que estava aprovando com muita alegria e esperança aquele namoro cheirando a casamento. Rapaz honesto, trabalhador, o “home da caneta”, segundo as definições de D. Maria por causa do seu preparo intelectual e sua função na empresa onde começara a trabalhar recentemente. Isso, no entanto, não dava a ele o direito de folgar na casa. Folgar na minha terra é quando o genro já pode chegar aos fins de semana de chinelos, bermuda, almoçar na cabeceira da mesa oposta ao do sogro, xingar o cachorro impertinente e outras regalias, só permitidas quando o casório já está marcado.
Era um jogo das semi finais, daqueles eletrizantes e decisivos. Ganhando que fosse, o Brasil disputaria a final tão almejada do mundial. D. Maria, com seus conhecimentos futebolísticos manifestava-se com desdém. Não gostava e a única coisa que entendia era que a bola entrando lá dentro da rede significava gol. Não ficava, entretanto sem a companhia do seu Chico. E também não se conformava em assistir calada. O jogo nervoso e ela enervando a platéia:
- Óia lá, Chico, esse bando de vagabundo, devia era caçar um serviço, trabaía, que nem o Joaquim aqui, ó. Fica tudo correndo aí à toa atrais da bola e nem gole eles faiz!
- Mio ocê calá a boca, Maria, deixa a gente vê o jogo!
Primo e Mariza namorando “mais à vontade” depois que eles cochilam e de repente D. Maria acorda e o chama para irem para a cama. Ele se levanta põe a mão no televisor:
- Mió desliga. O apareio tá quente.
Primo tinha que sair correndo pra casa a fim de assistir ao final da partida. E Mariza ficava furiosa tanto com ele quanto com o pai.
A tv já não era mais daquelas de válvulas que esquentavam e tinham que ser desligadas de vez em quando para esfriar, mas o namorado não precisava saber disso. Era hora de acabar com as pegação pros donos da casa irem dormir. Não podiam ficar a sós para não fazerem “bobice” antes do casório.
Uma homenagem aos meus amigos-irmãos Joaquim Primo e Mariza.