AS RUAS E O NOSSO MEDO...
Ruas de rebeldias,
Ruas de aparências obscuras,
Ruas de condutas cruéis,
Ruas de veias truculentas,
Ruas de atos vis.
Ruas de ações violentas.
Não sei se alguém já conseguiu imaginar o contraste que podemos extrair da idéia emergida da simples conduta de estar nas ruas. A princípio o termo rua significa o trânsito e o meio público de locomoção. Assim, considerando que são nelas que andamos, porque é o único meio que dispomos para se chegar ao longe, temos a impressão que as ruas também significam elementos que dão sensação de liberdade, posto que é através delas que observamos o dinamismo do ir e vir. Entretanto, se as ruas são as vias de exercitar nossa liberdade (pois são através delas que chegamos aos destinos que nos propomos a alcançar) então, porque fica também a sensação de que são as ruas que nos trazem temor no nosso cotidiano? Aí vem aquele frio na espinha quando ficamos encarcerados nos nossos lares (verdadeiros fortes de proteção), com receio de dar um passo pra fora do portão e encontrar a violência.
É evidente que não são as ruas que nos trazem o medo. O aspecto meramente fisiológico do logradouro público é só uma forma consensual, relacionada à administração pública, para que todos os seres humanos tenham à disposição para exercitar seu livre arbítrio de andar por onde bem entender. Assim, todas as pessoas (indiscriminadamente) podem circular à vontade sem que isso possa lhe causar constrangimento, já que se trata de um bem público disponível à sociedade. Entretanto, existe uma questão nevrálgica nessa questão que envolve o lado genérico de uma comunidade, já que cada ser humano é dotado das suas particularidades e de condutas que oscilam entre o bem e o mal. É certo, assim, que o medo que as ruas impõem são relacionados à mácula social que oscila conforme a localidade em que as pessoas se encontram. Destarte, é comum as pessoas viverem no interior e terem muito mais liberdade, não tendo quase nenhum medo ou receio de estarem nas ruas, pois a tranquilidade e a paz social é infinitamente superior de que uma grande urbe onde há maior número de pessoas circulando e, por consequência, aumenta o índice de violência.
Como sou do origem interiorana e cresci numa cidade pequena do meu Estado, lembro-me até hoje de um assassinato ocorrido em plena rua central, quando alguém foi morto por encomenda, cujo assassino se aproximou da sua vítima e apenas lhe perguntou o nome e incontinenti apertou o gatilho várias vezes deixando ali um corpo inerte no chão. Evidente que esse crime não ficaria no meu subconsciente se não fosse praticado naquelas condições, já que o assassino não se importou se tinha gente por perto, por isso lhe era indiferente o fato da vítima estar circulando pela rua. O importante para o autor dos disparos é que o alvo estava exposto num logradouro público. O fato é que mesmo tendo havido esse episódio não me lembro de nenhum outro que pudesse tirar a paz das pessoas que ali viviam já que se tratava de uma questão particular e que nem de longe dizia respeito às outras pessoas. Assim, nem mesmo um fato tão relevante foi suficiente para tirar o aspecto sereno da vida daquela cidade, já que as pessoas, durante o entardecer, não deixaram de colocar suas cadeiras do lado de fora do muro para degustar o corriqueiro chimarrão em companhia dos vizinhos.
Aí vem nossa busca incessante por dias melhores nos grandes centros. Diversas questões estão contribuindo para que as grandes cidades sejam palcos de violências comuns, pois os bandidos não escolhem suas vítimas e qualquer pessoa que pode estar exposta à violência, bastando que esteja do lado fora do seu portão, para estar sujeita a ser abordada por um meliante e assaltada, muitas vezes em plena luz do dia, podendo até perder a vida se não tiver discernimento suficiente para agir diante do inesperado.
O principal problema é cultural. Por que a violência cresce? Aqui no nosso Brasil várias são as vertentes para que isso ocorra. A primeira delas, a meu ver, é a falta de ética. Não se pode admitir a violência apenas aos incultos. Isso é um erro. Nem sempre a pessoa que não frequenta um banco escolar segue o rumo da marginalidade. O que realmente gera a marginalidade é a falta de oportunidades. Isso é uma questão Estatal apenas, já que cabe ao Governo ministrar planos de administração que sejam compatíveis com a evolução econômica e criar empregos para a população. Entretanto, continuo a insistir que o mais grave dos problemas é a ética. Por quê? A ética esta muito relacionada com exemplos. Qual o exemplo que os políticos desonestos podem passar para seus eleitores?. Eles passam a noção do 'jeitinho brasileiro' e da política de 'se dar bem a qualquer custo'. Não existe um mínimo de respeito com as instituições e com o povo que necessita delas. Isso só pode gerar desequilíbrio.
Assim, as ruas são exatamente o que são os políticos. Ou melhor, os nossos representantes que deveriam ser as ruas por onde percorremos para alcançar os objetivos sociais, são aqueles que nos causam medo, já que a sensação da maioria da população brasileira é de que está sempre sendo lesada pelos seus próprios representantes do poder. Diante disso, é comum recebermos e-mail mostrando esse lado nefasto dos Parlamentares, que, na maioria das vezes apóiam projetos que são do interesse de oligarquias e grande empresários em detrimento do bem comum. Assim, acredito que não exista um só brasileiro que possa dizer que 'bota a mão no fogo' por determinado político. Não há dúvida de que a mesma sensação de sairmos às ruas com a certeza de que a qualquer momento podemos ser assaltado, também convivemos com a idéia de que a todo momento alguém lá no Planalto está articulando projetos que irão contra as nossas aspirações.
Creio que no mesmo compasso que andamos para encontrar a ética em quem nos governa, também seguiremos na busca de menor índice de violência, porque está constatado nas estatísticas globais que nos países com governantes mais éticos e com governos mais sérios, o índice de criminalidade é bem menor. Exemplo disso, são os bairros ricos (e também de classe média) de alguns países da Europa, onde as casas são construídas sem muros altos, com meras divisórias de demarcação dos terrenos, pois as pessoas sabem que podem confiar nos seus semelhantes.
Enfim, o único meio de defesa que o cidadão honesto dispõe em nosso glorioso Brasil são os isolamentos das ruas, através de aparatos de proteção em suas residências, para que aqueles que circulam livremente pelos logradouros públicos não invadam sua privacidade. Nessa mesma ótica, o único meio de proteção contra os políticos desonestos são nossas próprias forças de trabalho, porque o resto, está a exposto ao medo de que os poderosos nos retirem a dignidade, invadindo nossos direitos de cidadão.