"Homens da Mina, item quatro"
Aproximava um Natal dos idos anos 60.
Os mecânicos da Oficina de Caminhões da Jacutinga estavam prontos para iniciar mais um jornada de trabalho. Assim que o encarregado geral, Zé Diniz, chegou, comunicou a todos que, após o almoço aconteceria uma reunião setorial.
O anúncio da tal reunião criou grande expectativa entre mecânicos, eletricistas, lubrificadores, ajustadores e soldadores. Afinal o que poderia ser anunciado na tal reunião?
Durante toda manhã o assunto era um só, a bendita reunião. Alguns chegaram a arriscar qual seria a pauta. Os otimistas, como Pedro Baiano, Guido Felipe, Paturé, Mazinho, Pedrinho Tinido, arriscavam que seria anunciado mais um pagamento, além da gratificação de Natal. Seria um final de ano gordo. Era hora de tirar o pé do atoleiro. Estavam convictos de que esta seria a notícia.
Outros como Vaíco, Bulau, Mauro Pelé, Elmo, Zé City, ficaram apreensivos, tinham a certeza de que o jacaré ia abraçar. No horário do almoço, a conversa era uma só. Qual assunto seria tratado na tal reunião?
A expectativa da sirene era tanta, que tinha gente dizendo que não havia eletricidade e a sirene não ia tocar. Mas, a sirene tocou.
Não foi preciso chamar ninguém para o salão de reunião Aliás, muitos já permaneceram ali após o almoço. Assim que Zé Diniz apareceu na porta, o silencio foi total, só dava para perceber barulho de mosquito.
Diniz sempre foi um homem muito educado, tem uma maneira peculiar de prender a atenção de uma assembléia. Cumprimentou a todos, e iniciou a reunião... “Senhores: estamos aqui, mais uma vez reunidos, para tratarmos de alguns itens importantes para melhorar o nosso convívio. Agindo assim, tenho certeza que a produção vai aumentar.”
Deu uma pausa, ninguém respirava.
“Vou enumerar dez itens para ser bem objetivo. Item de numero um: fortalecer os nossos laços de amizade para que a equipe possa ser coesa.”
As cabeças balançavam em sinal de apoio.
Continuou enumerando os demais itens fazendo o comentário de cada um deles. Assim que chegou o item quatro, Diniz fez uma pausa e disse: “o item quatro vou deixar para o final.” Os olhos entrelaçaram, um zunzum quebrou o silencio, houve cochichos na assembléia.
Os itens cinco, seis sete, oito nove, não despertaram mais tanto interesse. Quando terminou o item dez o silêncio foi geral. A angústia aumentou quando Zé Diniz teve que se retirar do salão para atender um telefonema do chefe geral.
Meu Deus! Xingaram o tal engenheiro de cada nome! O zunzum começou novamente. Tinha gente tão convicta que a noticia era dinheiro que já fazia conta da grana que ia receber.
José Diniz retornou e posicionou-se novamente diante da assembléia. Solenemte em alta voz disse: item quatro: “a partir de hoje para obtermos maior produtividade, não vou tolerar essa cachaçada rolando solto aqui dentro da oficina, não vou mais aceitar pessoas embriagadas no horário de serviço.”
Os olhos arregalaram, os semblantes ficaram perplexos. E Diniz encerra a reunião da seguinte forma: “ótima tarde para todos, um feliz natal, um ano novo cheio de paz e muita prosperidade!”
A decepção foi geral, principalmente para aqueles que não conseguiam ficar sem molhar o bico durante a jornada de trabalho.
Amigos leitores:
Lembro-me que até o final dos anos 80 ainda rolava muita pinga nas oficinas da Jacutinga e Conceição. Através deste artigo, rendo minha homenagem ao saudoso Pedro Baiano e aos demais amigos que aqui menciono. Tive o privilégio de passar vinte e cinco anos da minha vida junto com essa turma. Verdadeiros homens da Mina. Saudades...
Homens da Mina
Antigamente meu avô quebrava minério
para carregar as galeotas.
Tempos depois o meu pai,
era o responsável pela detonação.
Vinte e cinco anos eu trabalhei como
mecânico de caminhões.
Hoje meus dois filhos
trabalham na produção.
Uma geração de homens da Mina.
Orgulho desta nação.
Marconi Ferreira.