Dois santos
e os namorados
Mulher
- espécie adorável de poesia eterna.
Vinicius de Moraes
Uma mulher, que povoou meus vinte anos, pediu-me uma crônica sobre o Dia dos Namorados.
Diante do seu apelo, entrei em pânico! Havia decidido que, este ano, nada escreveria sobre este assunto.
Não me encontrava, portanto, preparado para rabiscar uma linha sequer sobre o Dia do Amor.
Cometeria, porém, uma imperdoável indelicadeza se não a atendesse. E aqui vai esta simplória crônica.
Depois de alguns minutos com a mão no queixo, abri o computador, e comecei a escrever. As frases caiam aos borbotões sobre o teclado do meu notebook.
Surpreendido com a estranha fluidez com que conseguia pôr no papel meus pensamentos sobre os namorados e o seu dia, desconfiei.
Terminada a primeira lauda, veio a decepção: escrevera a mesma coisa de anos anteriores. Fiquei desolado e literalmente frustrado.
A propósito, queria dizer a todos que, salvo algumas comoventes declarações de amor, encontradas no bojo de uma ou de outra crônica, a maioria dos cronistas do Dia dos Namorados se repete.
Não estou pretendendo justificar o repeteco no qual incidi, e acabo de confessar sem acanhamento.
Abatido pelo fracasso, indaguei: e agora? Reescrever o texto? Até podia fazê-lo. Instado a dizer quantas vezes reescrevia seus textos, Falkner respondeu: "Umas trinta vezes", recorda Fernando Sabino, na sua crônica Papel em Branco.
Instalada a dúvida, recorri a Cupido. Por ele fui aconselhado a esquecer o que houvera escrito e a começar tudo novamente.
Pus outra vez a mão no queixo.
Durante cinco ou dez minutos permaneci estático diante do computador, procurando, com ansiedade, uma saída.
No incontido desejo de escrever algo melhor, mas sem saber como, me fiz esta pergunta: será que George Simenon tinha razão quando afirmou que "escrever não é profissão, e sim uma vocação para a infelicidade"?
Não. Não acho. Nunca me senti infeliz (ou um infeliz) escrevendo. Cada nova crônica que produzo, sinto-me como se estivesse recebendo um abraço de minha neta Catarina.
Depois de muito cismar, imaginei que poderia ser muito bom descrever, rapidamente, alguns lances dos meus tempos de namoro que, volvidos tantos anos, com muito custo ainda consigo guardar.
Assaltou-me, porém, esta dúvida: alguém, por acaso, vai querer saber como as coisas do amor aconteciam no início ou meados dos século XX?
Procedente a dúvida. Sabe-se que os jovens, principalmente eles, são os maiores leitores de tudo o que se publica antes e no Dia dos Namorados.
Arrisquei: de súbito, um ou outro, ou muitos se interessariam em saber como se festejava esse doce dia, no tempo em que este apagado escriba viveu o apogeu de suas juvenis paixões; algumas inesquecíveis.
Para lhes não encher o saco, decidi dizer-lhes, apenas, que alcancei um tempo em que os namorados, no seu dia, se presenteavam com um verso solto; com um bilhetinho apaixonado; com uma açucena matuta; com um jasmim cheiroso; com uma papoula colhida no jardim da pracinha, local de encontros, marcados ou fortuitos, e de flertes saborosos e sutis.
A rigor, não se tinha a preocupação de oferecer à doce amada, para marcar a data, um perfume nacional ou estrangeiro; uma bijuteria ou uma jóia de verdade. Ao amado, um beijo tímido, mas que valia uma eternidade: era o presente...
Os tempos são outros, sim.
Mas creio, piamente, que o e-mail, o Orkut, o MSN, o Twitter, o Skype não substituem um bilhetinho, escrito à mão, testemunhando, com duas palavras - Te Amo! -, um intenso e imenso amor, não interessando quanto tempo ele haverá de durar...
O Dia dos Namorados existe desde 1949.
Criou-o um famoso publicitário paulista, no propósito de movimentar o comércio paulistano que, no mês de junho, praticamente parava.
Para justificar o seu ambicioso projeto, ele bolou este inteligente slogan: "Não é só de beijos que se prova o amor". E foi o bastante para levar os namorados às grande e pequenas lojas e aos famosos magazines, não apenas de Sampa, mas de todo o Brasil.
E como os santos - Antônio e Valentim - entraram nesta história?
Quanto a Antônio, muitas são as lendas que procuram justificar sua presença e participação no Dia dos Namorados. Não vou recontá-las. Não pretendo fazer parte do bloco dos cronistas que se repetem.
Mas, com todo respeito ao santo casamenteiro, acho que São Valentim deveria ou poderia ser o patrono ou o padroeiro do Dia dos Namorados, que passaria a ser comemorado no dia 14 de fevereiro, data da morte desse santo mártir, e não no dia 12 de junho, aniversário da morte do glorioso Taumaturgo de Pádua.
Valentim foi decaptado. Bispo romano, Valentim contrariou ordem do Imperador Cláudio II, que o proibira de celebrar casamentos. O monarca exigia que os jovens permanecessem solteiros, para engrossar as fileiras do seu Exército.
O prelado, entretanto, continuou presidindo os casamentos, mas em segredo.
Sua rebeldia resultou na sua prisão.
No xadrez, recebia mensagens e flores dos jovens que lhe eram solidários.
Uma menina chamada Astérias, filha do carcereiro, deficiente visual, visitou Valentim na prisão, e os dois se apaixonaram: um milagre teria ocorrido, diz a lenda, com a jovem recuperando imediatamente a visão.
Mas tudo acabou com a morte do bispo prisioneiro e galante, em fevereiro de 270.
Muitos países, já no século XVII, fizeram coincidir o Dia dos Namorados como o dia de São Valentim. Nos Estados Unidos, por exemplo, os namorados comemoram o Valentine´s Day.
Outro motivo ainda me leva a torcer para que o Dia dos Namorados seja comemorado no dia de São Valentim.
Tomei conhecimento, que, na Idade Média, "dizia-se que o dia 14 de fevereiro era o primeiro dia de acasalamento dos pássaros".
E que, por causa disso, "os namorados usavam esta ocasião para deixar mensagens de amor na soleira da porta da amada".
Coisa mais romântica e mais significativa pode existir?
Espero que o milagroso Santo Antônio de Pádua não fique nem um pouquinho zangado com esta minha atrevida sugestão.
Estou certo de que ele não se negará a socorrer as devotas que confiarem mais no seu prestigio do que na ousadia e na valentia de São Valentim.
e os namorados
Mulher
- espécie adorável de poesia eterna.
Vinicius de Moraes
Uma mulher, que povoou meus vinte anos, pediu-me uma crônica sobre o Dia dos Namorados.
Diante do seu apelo, entrei em pânico! Havia decidido que, este ano, nada escreveria sobre este assunto.
Não me encontrava, portanto, preparado para rabiscar uma linha sequer sobre o Dia do Amor.
Cometeria, porém, uma imperdoável indelicadeza se não a atendesse. E aqui vai esta simplória crônica.
Depois de alguns minutos com a mão no queixo, abri o computador, e comecei a escrever. As frases caiam aos borbotões sobre o teclado do meu notebook.
Surpreendido com a estranha fluidez com que conseguia pôr no papel meus pensamentos sobre os namorados e o seu dia, desconfiei.
Terminada a primeira lauda, veio a decepção: escrevera a mesma coisa de anos anteriores. Fiquei desolado e literalmente frustrado.
A propósito, queria dizer a todos que, salvo algumas comoventes declarações de amor, encontradas no bojo de uma ou de outra crônica, a maioria dos cronistas do Dia dos Namorados se repete.
Não estou pretendendo justificar o repeteco no qual incidi, e acabo de confessar sem acanhamento.
Abatido pelo fracasso, indaguei: e agora? Reescrever o texto? Até podia fazê-lo. Instado a dizer quantas vezes reescrevia seus textos, Falkner respondeu: "Umas trinta vezes", recorda Fernando Sabino, na sua crônica Papel em Branco.
Instalada a dúvida, recorri a Cupido. Por ele fui aconselhado a esquecer o que houvera escrito e a começar tudo novamente.
Pus outra vez a mão no queixo.
Durante cinco ou dez minutos permaneci estático diante do computador, procurando, com ansiedade, uma saída.
No incontido desejo de escrever algo melhor, mas sem saber como, me fiz esta pergunta: será que George Simenon tinha razão quando afirmou que "escrever não é profissão, e sim uma vocação para a infelicidade"?
Não. Não acho. Nunca me senti infeliz (ou um infeliz) escrevendo. Cada nova crônica que produzo, sinto-me como se estivesse recebendo um abraço de minha neta Catarina.
Depois de muito cismar, imaginei que poderia ser muito bom descrever, rapidamente, alguns lances dos meus tempos de namoro que, volvidos tantos anos, com muito custo ainda consigo guardar.
Assaltou-me, porém, esta dúvida: alguém, por acaso, vai querer saber como as coisas do amor aconteciam no início ou meados dos século XX?
Procedente a dúvida. Sabe-se que os jovens, principalmente eles, são os maiores leitores de tudo o que se publica antes e no Dia dos Namorados.
Arrisquei: de súbito, um ou outro, ou muitos se interessariam em saber como se festejava esse doce dia, no tempo em que este apagado escriba viveu o apogeu de suas juvenis paixões; algumas inesquecíveis.
Para lhes não encher o saco, decidi dizer-lhes, apenas, que alcancei um tempo em que os namorados, no seu dia, se presenteavam com um verso solto; com um bilhetinho apaixonado; com uma açucena matuta; com um jasmim cheiroso; com uma papoula colhida no jardim da pracinha, local de encontros, marcados ou fortuitos, e de flertes saborosos e sutis.
A rigor, não se tinha a preocupação de oferecer à doce amada, para marcar a data, um perfume nacional ou estrangeiro; uma bijuteria ou uma jóia de verdade. Ao amado, um beijo tímido, mas que valia uma eternidade: era o presente...
Os tempos são outros, sim.
Mas creio, piamente, que o e-mail, o Orkut, o MSN, o Twitter, o Skype não substituem um bilhetinho, escrito à mão, testemunhando, com duas palavras - Te Amo! -, um intenso e imenso amor, não interessando quanto tempo ele haverá de durar...
O Dia dos Namorados existe desde 1949.
Criou-o um famoso publicitário paulista, no propósito de movimentar o comércio paulistano que, no mês de junho, praticamente parava.
Para justificar o seu ambicioso projeto, ele bolou este inteligente slogan: "Não é só de beijos que se prova o amor". E foi o bastante para levar os namorados às grande e pequenas lojas e aos famosos magazines, não apenas de Sampa, mas de todo o Brasil.
E como os santos - Antônio e Valentim - entraram nesta história?
Quanto a Antônio, muitas são as lendas que procuram justificar sua presença e participação no Dia dos Namorados. Não vou recontá-las. Não pretendo fazer parte do bloco dos cronistas que se repetem.
Mas, com todo respeito ao santo casamenteiro, acho que São Valentim deveria ou poderia ser o patrono ou o padroeiro do Dia dos Namorados, que passaria a ser comemorado no dia 14 de fevereiro, data da morte desse santo mártir, e não no dia 12 de junho, aniversário da morte do glorioso Taumaturgo de Pádua.
Valentim foi decaptado. Bispo romano, Valentim contrariou ordem do Imperador Cláudio II, que o proibira de celebrar casamentos. O monarca exigia que os jovens permanecessem solteiros, para engrossar as fileiras do seu Exército.
O prelado, entretanto, continuou presidindo os casamentos, mas em segredo.
Sua rebeldia resultou na sua prisão.
No xadrez, recebia mensagens e flores dos jovens que lhe eram solidários.
Uma menina chamada Astérias, filha do carcereiro, deficiente visual, visitou Valentim na prisão, e os dois se apaixonaram: um milagre teria ocorrido, diz a lenda, com a jovem recuperando imediatamente a visão.
Mas tudo acabou com a morte do bispo prisioneiro e galante, em fevereiro de 270.
Muitos países, já no século XVII, fizeram coincidir o Dia dos Namorados como o dia de São Valentim. Nos Estados Unidos, por exemplo, os namorados comemoram o Valentine´s Day.
Outro motivo ainda me leva a torcer para que o Dia dos Namorados seja comemorado no dia de São Valentim.
Tomei conhecimento, que, na Idade Média, "dizia-se que o dia 14 de fevereiro era o primeiro dia de acasalamento dos pássaros".
E que, por causa disso, "os namorados usavam esta ocasião para deixar mensagens de amor na soleira da porta da amada".
Coisa mais romântica e mais significativa pode existir?
Espero que o milagroso Santo Antônio de Pádua não fique nem um pouquinho zangado com esta minha atrevida sugestão.
Estou certo de que ele não se negará a socorrer as devotas que confiarem mais no seu prestigio do que na ousadia e na valentia de São Valentim.