Não tenho saudades da infância - 1
Não tenho saudades da infância - 1
Fui uma criança vítima da separação dos meus pais, aos três anos. Fora tão marcante, que as lembranças de alguns fatos, são claramente lembrados, e é muito marcante. Esse fato aconteceu ainda na década de cinqüenta, eu meu irmão e minha irmã, mais velhos, eu era a caçula, fomos morar na casa dos meus avós maternos. A situação não foi fácil. O meu avô tinha como atividade a confecção artesanal de cangalha (arreio para animais em transporte de cargas). Sua venda dependia da necessidade dos proprietários de cavalos e burros, portanto não era nada fácil. Minha mãe não possuía nenhuma profissão, e proteção legal para que meu pai de nos mantivéssemos de alimentos, não existia. Como ele era mestre de padeiro numa das duas padarias da cidade, nos fornecia três pães à tarde, colocado pelo meu tio, que era gerente da referida padaria. Essa quantidade significava um para cada criança, para que nossa mãe não comesse. Se conseguíssemos passar por debaixo do portão de entrada sem que nosso tio visse, lá dentro o que fosse buscar o pão, pois só ia um, comia pão e meu pai colocava uns cinco, mas se o meu tio visse, tiraria dois, como fez várias vezes.
Mesmo diante de tanta atrocidade, íamos sobrevivendo mesmo endividando meu avô com os protestos da minha avó, que não gostava da situação. Quando eu tinha acho que uns seis ou oito anos, aos domingos à tarde eu ia ao comercio, onde ficava a igreja, pois raramente o meu pai não estava lá sentado com outros senhores. E eu chegava de mansinho e dizia: benção a pai, ele: Deus te abençoe, vai pra onde¿ vá pra casa! E aquilo me deixava tão triste, pois eu queria ficar ali um pouquinho com ele.
Minha mãe com o tempo uma senhora da sociedade vendo a situação propôs a ela ensinar corte e costura, ela aceitou, e tempos depois começou a costurar pra fora, ficava sempre até tarde costurando, à luz de candeeiro à querosene e ainda com uma máquina de mão alugada, pois não possuía uma, e foi nos mantendo como podia.
Meu pai foi embora pra Paulo Afonso no auge Chesf. Minha irmã e meu irmão e minha irmã, ainda foram lá em busca de alguma ajuda ou atenção, mas ele não os acolheu e eles vieram embora. Eu muitas vezes lhe escrevi cartas contando os meus sentimentos, mas nunca recebi uma resposta.
Crescemos, e quando eu já estava casada, soube que ele havia falecido, vítima de um enfarte fulminante em plena via pública.
Esse um pequeno relato de tudo que não tenho saudades.