Cheguei à casa de minha amiga e a mocinha comentou comigo que ela estava no banheiro há algumas horas. Estranhei, bati na porta e chamei por ela. Devagarinho saiu, mas dela só se via os olhos. Despencou sobre mim chorando de soluçar. “Você está passando mal? O que houve, criatura?” Perguntei, preocupada. Mas ela só chorava. Pedi um café e fomos para o quarto. Lá desabou. Perguntei novamente se estava se sentindo mal. Jogada de bruços, continuou chorando e balançava a cabeça em sinal de negação. Menos pior – pensei – se não está se sentindo mal. Por instantes fiquei sem saber o que fazer: se deixava que ela esgotasse o choro, se perguntava pelo acontecido, ou... Na verdade não havia ou nenhum. Tinha mesmo que esperar que ela parasse de chorar. Decidi esperar. “Não quero que ninguém olhe para mim hoje!” Soluçou com a cabeça enfiada no travesseiro, com voz de criança mimada. “Nem hoje e nem nunca mais!” Choro convulso. “Aquele filho de uma boa mãe acabou comigo!” Mais soluços. “Ele me arrasou!”

Quem, meu Deus? Perguntava em meu silêncio. Helena é uma mulher bonita, grande e de bem com a vida. Arrasada? Bom, ultimamente andava com uma piadinhas sobre estar flácida, mais gordinha do que devia, com algumas rugas mais acentuadas, mas nada que pudesse deixá-la naquele estado. Tinha também aquele namorado doido... Não, ele não tinha força nem inteligência para minar a mulher que morava nela. Pelo contrário, ria dele, das idiotices que falava, do orgulho besta dos músculos rijos, da barriguinha sarada. Coitado, uma marionete. Bonito, ele era, não havia como contestar, mas era um tal de se sentir “previlegiado”, de não ser “ingnorantão”. Ela nem sai com ele! Às vezes chamava-o de bombril e ele sequer entendia! Ele não era. Quem podia ser?

Pensei no marido. Marido, não, estava divorciada, mas vez em quando ele-ex, dava uma incerta. Ligava, chamava para jantar, mandava flores. Ela não atendia, mandava as flores de volta e ele sumia. Quem mais? Que eu me lembre... Ah, tinha o marido da Mariinha – um gatão! – mas o que tinha de gato sobrava de galinha. Ultimamente, Helena era o alvo preferido. E ele tinha o péssimo hábito de falar mal das mulheres que o rejeitavam. Até que podia ser. Desisti de pensar e de esperar.
 
– Helena, querida, se você não parar de chorar vou embora, arrisquei. Você não está não está passando mal, não está com dor, só está com vontades de chorar, certo? Depois eu volto, ok?
 
Esperei a resposta. Ela virou-se, cobrindo o rosto com o antebraço, nariz vermelho, ainda soluçando:

– Eu não falo que engordei? Estou velha e feia e ninguém me diz nada! Encontrei o Estevão ontem no Caras. Você não imagina o que ele falou quando me viu!

– Quem é Estevão, Helena?

_ Meu primeiro namorado! Lindo, ele está lindo! Ficou mais lindo! Casado, com um bebê de oito meses, a mulher deve ter uns vinte e quatro. Eu passei lá só para fazer xixi, você entende? Aí ele me chamou para conhecer a mulher. Conversávamos, quando ele tirou uma coisa da carteira. Era a foto de nossa turma da escola. Então ele virou para mim e para ela e lascou “Viu, Helena era uma flor do campo!” Então, dei um jeito, fui mal-educada, mas vim embora e nunca mais vou sair de casa! Nunca mais!

– Desculpa amiga, mas ainda não entendi seu desespero...

– Você não sabe, Lia? Você não sabe? Quem já foi flor do campo, hoje é tiririca do brejooooooo!
Eliana Schueler
Enviado por Eliana Schueler em 05/06/2010
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