O nosso último capítulo
           
     Ela e eu... Chegamos ao fim do último capítulo de nós dois e fechamos nosso livro com tristeza.
     
     Este texto é difícil de sair. As palavras brigam comigo, não querem ser escritas. Mas têm de ser. Por mais sofrimento que me cause escrever agora, que a dor é gritante, preciso descarregar as frustrações do fim prematuro do sonho. Não consigo nem mesmo dar coerência ao que quero dizer, talvez nem mesmo queira dizer nada, somente exteriorizar a minha dor de agora.

     O amor é cruel quando mal amado; é um assassino quando desrespeitado. Eu e ela não somos hoje mais nada, embora havia pouco tempo éramos tudo. Tudo, hoje não sobra a sombra do sonho. Eu aqui estou, com lágrimas seguras nos olhos e o coração dilacerado pela mágoa devastadora, esperando que o sono me leve a angústia para longe, ao menos me dê uma pausa, um momento para recompor as partes espalhadas no chão. Caído como um bêbado, que antes dava passos ébrios no ar, sou tomado por alucinações do rosto dela. E quero amá-la, mas no último instante lembro do descaso que me entregara quando só queria o deleite dos seus braços magros. Eu quero amá-la, mas é de ressentimento que meu coração se recorda quando os seus olhos faiscantes me vêm à mente.

     O livro acabou sem final feliz, porque os relacionamentos de verdade não são ficção, não há idealismos nem utopias, só a realidade, e ela não é bonita para aqueles que amam sem ter o ser amado. Um abismo sem fim que nos puxa para baixo. Eu me sinto caindo, despencando como uma pedra lançada no ar. No fim, sou o vidro partido, estilhaçado, cheio de marcas que a vida impiedosa nos tinge.
    
     Estou a um passo de me despedir da vida. Estou a um passo de pôr fim ao meu tormento. Hoje vou me deitar entorpecido, cheio de comprimidos e uma garrafinha de black label. Espero que o sono não termine, que o dia não me amanheça, que o sol não mais brilhe. Hoje dou adeus e parto à procura de Deus. Mas tenho certeza de que quem me acolherá não será a Providência, será vermelho como nas crenças. Se outra vida existir depois desta, espero que seja um lugar melhor do que este inferno de viver. Se há mesmo outra realidade, outros mundos além deste, que seja melhor, que eu tenha morada entre aqueles que, como eu, desistiram de inventar meios de fingir do que tortura a vida cheia de sonhos improváveis. Eu queria mesmo é que não houvesse nada depois de expirar, eu queria que a luz fosse a sombra negra e nada mais importasse além da surdez, da cegueira, da morte.

     Meu estômago dói e minha cabeça pende para baixo como se quisesse cair do meu corpo. Eu e ela éramos um, agora ela e eu não somos nem o zero, nem o saldo negativo que nos sobra quando um segue o outro caminho.
 
     Voltemos o livro para a estante, voltemos a vida num instante e pausemos o filme triste da nossa despedida, do meu adeus.