Triste Vaidade

Não existe mulher sem vaidade, reparei na beleza disso. Onde houver uma mulher haverá vaidade.

Estava nesse programas sociais, onde a ambiente das escolas é aberto para a comunidade carente e distraído reparei em uma mulher.

Caminhava a passos cansados seguida por três crianças e mais uma no colo. As roupas eram simples, batidas e já desgastadas. As crianças usavam roupas também puídas, uma delas, menina, trazia um gato no colo, os dentes tortos na boca. O gato era rajado, tão vira lata quanto só os gatos de rua podem ser. O sorriso da criança era triste como todo sorriso das crianças pobres. Não sorria a menina por possuir motivos para sorrir, mas porque é condição da infância.

A mãe deixou as crianças brincando no pátio e dirigiu-se para o improvisado salão de beleza. As atendentes eram universitárias de má vontade categórica e desprezo pela pobreza enraizado.

A mulher sorriu, seus olhos brilharam: escova, chapinha e limpeza de pele ali a sua disposição, gratuitamente. Deixou o nome na lista, sentou-se e conversou com as outras mulheres. Debateram a vida de outras pessoas, a novela, o futebol que distrai os maridos, as mazelas da vida simples, o trabalho que os filhos dão.

Em espera, enquanto discutiam, folheavam velhas revistas onde grã-finos, socialites, atores e atrizes exibiam sua riqueza, requinte, pompas e circunstâncias que estavam tão longe da vida delas quanto os anos-luz que separam a via láctea das outras galáxias.

Quando chegou sua vez, teve os cabelos tratados, esticados, alisados, escovados com todo o desprezo oriundo de universitárias, voluntárias forçadas, que se enojam com a condição de simplicidade das esferas mais baixas daquilo que chamamos pátria.

E assim, saiu a mulher, mãe de quatro filhos. Tão bela quanto uma mulher que lava, passa, cuida, briga, apanha, fofoca, compra fiado, mente, deve, geme, acaricia e chora pode ser.

Mas na verdade tão mulher quanto qualquer outra do mundo. Pois se da vida apanha e sofre. Se na venda deve dois meses e sem vergonha, como todos os pobres, fia o pão, o leite e o cigarro. Ainda sim tem na alma de mulher a vontade e a coragem de, mesmo que para as universitárias inutilmente, embelezar-se. Pois em todas as mulheres, incondicionalmente, existe a beleza. A vaidade de querer ser bonita, de tentar, contra todas as adversidades, parecer-se com a bela princesa que dorme encantada no castelo de cristal, bebe o leite das cabras e espera o príncipe voltar da labuta. Mesmo que o castelo seja um casebre, o leite seja fiado e o príncipe cheire a cachaça.

Luís Figueiredo
Enviado por Luís Figueiredo em 04/06/2010
Código do texto: T2299704
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