Meu pai foi mãe também
Meu pai foi mãe também
Mª Gomes de Almeida
Um dia desses, talvez por descuido ou falta de habilidades na cozinha, acabei com um microscópico caco de vidro_ resto de um copo que quebrou na pia _ no meu dedo. Após infinitas investidas e tentativas em retirá-lo todas sem sucesso, lembrei-me com saudades do meu pai e consequentemente da minha infância.
Nessa fase da minha vida ao invés de cacos de vidros eram os espinhos que teimavam em “entrar” na sola dos pés, e tão logo se percebia a presença daquele corpo estranho meu pai entrava em ação. E com outro espinho, agora de laranja; grandes verdes e com cheiro que lhe é próprio, se dava a sessão e entre gritos de manha e de felicidade por estar no centro das atenções, mais um espinho era tirado e analisado conforme tamanho e espécie...
Lembrei também e não com menos saudades das incontáveis noites que meu pai se levantava para acompanhar a mim e a minha irmã, a caçula para fazer xixi.
Era ele também que se levantava a qualquer hora da madrugada para pegar um copo com água quando acordávamos no meio da noite para beber.
E era também no meio da noite se levantava para coçar as nossas frieiras.
O melhor é que tudo isso para ele parecia muito divertido, pois era em meio a sorrisos e brincadeiras que ele se colocava à nossa disposição sempre que solicitado. E no outro dia todos da casa eram informados sobre os episódios da noite passada.
Impossível não estabelecer certa comparação com alguns pais da atualidade: estressados, cansados, mal humorados, impacientes, descontentes... Que pena!
Já se passaram vinte e um anos que meu pai partiu, mas ele vive em meu coração, na minha experiência de vida, e como uma figura que foi para mim modelo de pai que foi mãe também.