Nos meus ouvidos ainda ressoa o ritmo frenético e sensual do tango. Um tremer quase visível toma-me o corpo. E, um misto de saudade, de nostalgia, me invade. Há poucos dias eu vagava pelas ruas de Buenos Ayres. Somente andava...o simples fato de andar naquelas ruas já me dava a nítida sensação de fazer parte de um quadro vivo. Há poucos dias eu respirava o ar boêmio daquela cidade encantadora, com seus vinhos, seus pares a dançar tango como se num palco estivessem. Suas praças, ai suas praças...Tão grandes, tão verdes, tão estúpidamente poéticas...E, meu vagar tomava ares de saudade antes da hora da partida. Meu olhar se perdia na catedral, e, na catedral meu olhar se encontrava. Meus passos caminhavam lépidos, esquecidos da fadiga.
Uma parada num café com cara de tela de Renoir, mesas na calçada dasafiando o frio, e, como se já não estivesse completa a cena, um atrevido violinista acha de me espicaçar com suas notas de um tango inesquecível: La cumparcita. O café, trocado pela taça de vinho, uma taça enorme, brilhante, transbordava. Á primeira, outras taças se juntam, o vinho me liberta, aguça meu lado boêmio.
Minha peregrinação recomeça, agora meus olhos estão mais aguçados, meu coração batendo fora do ritmo como se obedecesse ao tango. Já não me vejo com a roupa comum que sai do hotel.Meu vestido é negro de cetim, uma fenda enorme deixa minha perna á mostra, meus sapatos são de salto de um verniz lustroso e trago um rosa vermelha na mão. Divido minha taça com alguem que me enlaça, me puxa para a calçada, e, rodopiamos desafiando os passantes. Rápidamente estávamos sós na rua Corrientes. Senti-me ébria de vinho e poesia. Adeus nacionalidade, nomes...éramos apenas eu, ele e meu sonho...mas, e a rosa...ainda está aquí.