OS PRESENTES E A IDADE
Sempre fui um bom observador, quando jovem, morando no interior, era obrigado a notar os sinais da natureza, com um pouco de prática e o ensinamento dos mais velhos, não se tornava difícil saber se iria gear, fazer sol, ou chover. As enchentes tinham datas definidas, o céu “se pedrento, chuva ou vento”, “serração baixa sol que racha”. Não só para a sobrevivência natural, mas também para a convivência humana, sempre havia algo para aprender:
- Se ao falar com contigo, o vivente não te olhar nos olhos, desconfie dele.
Com os ditos e a prática chegava-se lá.
Por força de minha profissão desenvolvi ainda mais esse pequeno dom, passei a guardar na memória uma infinidade de pequenos detalhes daqueles que durante o dia passavam diante de mim, as roupas que vestiam, penteados, cor dos olhos, batons, altura, tinturas nos cabelos, os óculos, os sorrisos, com ou sem aparelho nos dentes, os tiques nervosos, fumantes ou não, em fim tudo aqui que me permitisse uma rápida identificação posterior.
Agora já aposentado, pendurei no varal de roupas, uma caixa contendo alimento para os pássaros, quando o tempo permite, costumo olhá-los, é invejável a organização dessas aves, possuem horários e ordem para sua chegada em busca de alimentação.
Comentei tudo isso, não sem um propósito, mas para que tenham idéia de como estou tratando minhas últimas verificações. Em meus aniversários, que ocorrem no inverno, há muito já deixei de fazer churrasco, é um perigo, ganha-se um suador enorme em frente da churrasqueira, faltou lenha ou carvão, sai na friagem , pneumonia na certa.
Mas foram os presentes do ano passa que despertaram a minha atenção, cueca, gravata, alguns livros, poucos vinhos, uísque só na propaganda, dos charutos ganhei uma linda caixa, antiga e vazia, que transformei em peso de papel, guardando dentro clips, canetas, lápis, e outras utilidades.
Comecei a ficar alerta, dando início a uma preparação mental e observatória para as próximas comemorações natalícias: quando começarem a chegar as meias, os cachecóis, chinelos e pijamas, TODOS DE LÃ, saberei que está na hora de esquentar os pés com as pantufas, agasalhar o peito com o cachecol e bem abrigado, dedicar-me a trama da novela das oito.