Ao pé da letra
Águida Hettwer
 
 
   Com licença, dê-me passagem. Meus lábios têm sede, a boca sedenta, suplica gotículas de vida. Os pés andam afoitos, buscando novos rumos para me encontrar. Ainda ouço a voz que cala. Sons de vogais e consoantes bem definidas.
 
 
 Não tenho uma frase pronta ou idéia concebida. Ouso limpar das vidraças sonhos embaciados, deixados a esmo. Da vida, vertem poemas em quedas d´água. Busco na imaginação o que não pode ser visto. Mesmo que as paisagens não se encaixem perfeitamente, não deixarei de sonhar.
 
 
 Nas asas libertas que cruzam os céus, nas flores desabrochando silenciosas, na claridade do crepúsculo, encontro o abraço que aniquila a solidão da alma. Faço de um único grão de areia, uma praia onde meus pensamentos pousam mansamente. Deixam rastros de sentimentos, emoções marcadas.
 
 
 Dedos sorrateiros escrevem vagando nas entrelinhas das mais profundas aspirações. A devolver-lhe carícias que outrora julgara perdida. Há gotas de querer, rosada ânsia de viver, nos gestos que se cruzam. Quantos cantos sobrepõem à vida, linhas e fios num emaranhado de emoções.
 
 
 A mulher que me sorri no espelho diz:
  
 - Num clarão a vida descortina a minha frente, entre pontos e vírgulas. Do vazio á plenitude, de vozes amontoadas ao silêncio absoluto. A vida segue seu curso, a cada instante renascendo. A saudade são amores incrustados na alma, multiplicam-se milhões por segundos.
 
 
 
 
                                                                                                                    01.06.2010