A ordem estava dada. Meu destino, traçado. Daquele dia em diante, enfrentaria um desafio sobre humano.Daquele dia em diante, encararia a morte como fato normal, comum, diário. Trocaria flautas, palcos,sons, luzes, ribaltas por lamentos, lágrimas e dores. Permutaria vida por morte. Um enorme desafio para uma pessoa completamente despreparada para assistir e participar de um adeus, despreparada para sofrer permanentemente.
             Com o aceite, minha sorte estava lançada. Lembro perfeitamente meus primeiros passos em direção á casa de apoio que doravante seria meu segundo lar. Meus passos era pesados tanto quanto meu coração. Uma mistura de sentimentos me invadia. Ora desejava cumprir meu destino, ora o regeitava.
Fatalmente cheguei. Por trás da porta, rostos sofridos me deram um riso fraco de boas vindas, que não tiveram resposta. Eu estava muda, paralizada pela emoção. Como começar, por onde? Eu não sabia sofrer tão intensamente. Covardemente pensei em voltar, desistir. Onde deixaria meu riso sempre pronto para explodir? Onde guardaria minha enorme vontade de viver sem jogar na cara deles meu grito por vida? Mas, o desafio me fascinava. Enfrentaria meu destino.
            E, assim, entrei na casa de apoio á portadores de câncer com a enorme missão de gerir recursos, de aplacar a dor daquelas pessoas, de guarda-las, protege-las. De gritar por elas, de protestar por elas, de defende-las até delas próprias.
          Naquela hora, descobrí o quão enorme era meu papel...eu tinha uma missão. Não era médica, nem enfermeira, era apenas mãe, tão somente, mãe.
Mãe de 40 filhos que se revesavam de tres em tres meses. Tempo suficiente para que criassemos um elo muito forte. Geralmente retornavam tempos depois... A partir daí, deixei um pouco de lado minha família de sangue e mergulhei nessa outra de coração. Eles me queriam inteira.
        Alí foi meu grande aprendizado de vida. Com cada um, aprendí um pouco.Eram todos oriundos do interior onde haviam deixado família, lar, e, poucos bens, ou quase nenhum. Uma galinha no chiqueiro, uma cabra de leite para o rebento mais novo eram as riquezas de minha gente. Mas, esse povo soube me ensinar, e, fazer de mim uma mulher bem maior, bem mais forte do que aquela que um dia entrou alí acorvadada, medrosa.
      A morte vivida corriqueiramente me ensinou a amar mais a vida.