A fila do título
Brasileiro e essa mania.
Mania de fazer tudo na última hora, última oportunidade, última chance. Essa história que eu vou contar, devia ter contado faz muito tempo. Mas vai sair agora.
Aconteceu quando fui tirar o título de eleitor. No último dia, por falar nisso. Engraçado como tava cheio o tribunal eleitoral. Pessoas que, como eu, não haviam tirado o título ainda.
E detalhe, o título poderia ter sido ineditamente feito pela Internet. Sem necessidade de encarar fila, e um clima que foi cruel contra a incompetência.
Dizem que é um exercício de cidadania votar. Tirar o título, para mim e meus companheiros de fila, foi um castigo de cidadania. Mas acho que aprendi a lição de não fazer as coisas na última hora.
Agora, umas coisas peculiares que enfrentei na fila, que durou 6 horas.
A chuva, o primeiro e mais duradouro castigo. Estava chovendo bastante, e eu estava desprovido de guarda chuva, ou seja, me molhei bastante.
Mas isso não foi o problema, eu gosto de chuva. O problema foi quando a chuva parou, e chegou o vento. Aí sim a coisa esfriou para mim, literalmente. Passei bastante frio, e quando finalmente cheguei em casa, nem a sopa da minha mãe resolveu, já estava gripado.
O segundo fator, tanto cômico quanto trágico, foi a minha amizade com um senhor que já estava abastecido de cachaça.
Ele chegou à fila, cheio das informações, eu apenas rindo. Ele percebeu, e foi conversar comigo. O cara era um filosófo. Chegou a brilhante conclusão que ficar numa fila é uma questão tridimensional.
Por quê? Simples, eu vou explicar as dimensões de uma fila.
Primeira dimensão: prestar atenção em quem está a sua frente na fila. Para ganhar alguma vaga saliente, ou então prestar atenção nas conversas, que sempre trazem informações úteis sobre o propósito da fila.
Segunda dimensão: prestar atenção em quem está atrás de você na fila. Para evitar que algum espertinho lhe passe sem que você perceba.
Por fim, a terceira dimensão: o tempo. Sempre preste atenção no relógio para não atrasar seus outros cronogramas.
Depois de filosofar bastante, e fazer amizade comigo. O senhorzinho disse que possuía alguns “contatos” lá na frente da fila, e ia tentar me encaixar.
Como eu já tava ficando bêbado por osmose, deixei que ele fosse, mais sabia que ele só ia era arrumar confusão lá na frente.
Confusão que ocorreu. De fato, ele não conhecia ninguém, e tentava arrumar uma vaga na frente na marra.
Resultado? Deu até polícia pra tirar o cara da fila.
Mas por fim, ele foi embora.
Minha amiga, que tinha ido comigo também, também foi embora, por conta do estado de saúde dela, que estava em risco por conta do frio.
Sobrei eu então, na fila, o que me leva ao terceiro fato importante do que ocorreu naquele dia.
Conhecer pessoas que eu provavelmente não vou ver de novo na vida.
Haviam 3 moças, uma amiga e duas irmãs que lá estavam para tirar também o título. E um cara com uma voz única (bem fina) , que também estava conosco.
A coisa é que, depois de duas horas em pé, o ser humano sente a necessidade de se manifestar, e de preferência conversar com alguém.
Então, inevitavelmente, criam-se novas amizades. Conversamos, conversamos, brincamos, debatemos, e até jantamos juntos, na fila, quando o namorado de uma das moças trouxe o que comer.
É engraçado essa de ficar muito tempo numa fila. Eu não faria isso de novo. Graças a Deus que título de eleitor é só um na vida.
Aprendi, na marra, evitar fazer as coisas no último instante. Votar, eu vou logo cedo da manhã, para que não se repita esse incidente.
E espero, que depois de tanto sufoco, meus candidatos saiam eleitos. Ia ser um conforto, enfim.