A TREVA... parte II

Mas e daí?

Não iria escavar mais, tava cansado e nem valia a pena, era muito longe de qualquer lugar civilizado, muito ermo e escondido, ninguém nunca acharia.

Voltaria a pista de barro, pegaria o aviãozinho e voaria de volta as suas filhas queridas. Diria que mamãe teve de viajar de repente e pronto, a todos contaria a mesma história, todos já estavam acostumados as suas viagens repentinas e suas demoras.

Duas semanas depois viu todo seu plano ir por água abaixo, a polícia daquele pais não era tão ignorante assim e descobriu tudo, ia para cadeia e suas filhas? Com quem ficaria? Não havia parentes com quem contar, e os distantes não moveriam uma palha pelas meninas. O Juiz decidiu, iria para adoção.

**********************************************

Aquele era só um barraco velho, feito de coisas mais inacreditáveis, pendia de lado e era isolado das demais casas (casas?) daquele bairro, subida acima, parecia ter sido construído para que fosse usado para coisas ruins, para planejamento ou esconderijo de drogas, armas, ou mercadorias roubadas, mas nada disso era o que acontecia ali.

O Cara que estava com ela lá agora, era o chefão do pedaço, mas era gente e como tal não era imune a uns balaços. A sem vergonha deixou as crianças no barraco sozinhas, com dois pães e um litro de K’suco, inclusive para a neném de 8 meses, enquanto ele dava duro na obra quase 14 horas seguidas para que as casas do programa do Governo ficasse prontas inda antes das eleições.

Ela e aquele safado traficante de uma figa, que vivia com cinturões de balas cruzados como o Lampião de sua terra, mas sem a hombridade deste seu herói. Sabia onde encontrá-los todos na favela sabiam, armou-se de fósforos e um litro de gasolina retirado do fusca do vizinho, com a peti de gasolina na mão, agachado, pôs-se a rodear o barraco derrubando o líquido silenciosamente, enquanto ouvia gritos e murmúrios de prazer da Puta da sua mulher nos braços do sacana. Ateou fogo e correu, ficou no mato em frente esperando, pegou o revolver enferrujado mas inda funcionando, esperou.

Quatro tiros acabou com a mulher nua que abriu a porta e veio correndo, o cara parou na porta, muito desconfiado e já maturado, inda assim recebeu mais dois balaços e caiu por cima da mulher, da sua mulher, até na morte o espetáculo era uma afronta.

Entregou-se porque sabia que seria morto, e sabia que poderia ser morto também na cadeia, nada mais restava para ele. Seus filhos ficariam a Deus dará, só então pensou neles.

***********************************

A Rodoviária estava lotada, era tempo natalino e muitas pessoas felizes iriam visitar suas respectivas famílias, embrulhos que se adivinhava presentes enchiam o piso perto do embarque. Ela olhou para aquilo com inveja, sacudiu a cabeça e continuou com um embrulho de papel pardo, grande, de vez\ em quando saía um gemido fraco como um choro contido, abafado.

Ela caminhou para o lado das escadas rolantes, olhou para baixo, depois para os lados e meneou a cabeça, ali não dava.

Voltou-se e encaminhou-se para o porta volumes da rodoviária, no meio do caminho também parou, voltou-se e foi sentar-se nos bancos de espera do saguão principal.

Passou uma moça cabelos castanhos claros, calças jeans, parecia sua irmã mais nova, agora com 14 anos, não, não, parecia com ela mesma meses atrás, a mesma fisionomia confiante, a mesma certeza que o mundo lhe pertencia e que todos os homens parariam e se voltariam para vê-la uma vez mais. A Mesmíssima confiança que a fez se entregar ao filho do homem mais importante da região, importante e mau, pai e filhos. Ele o filho até a levou ainda de barrigão, para passar um fim de semana na piscina da casa dele, ele ainda apresentou a outros amigos seus, ele dizia a todos que aquele filho era seu, até que no meio da farra, o Pai o mandou chamar, e ele voltou branco e tremendo me mandando embora e dizendo para nunca mais aparecer na sua vida se quisesse continuar respirando. A Mãe a expulsou de casa imediatamente, antes estava louca de alegria pelo neto que ia nascer, agora tava uma fera quando soube da rejeição da família dele. Na rua pela primeira vez soube o que era ser jovem sem casa, emprego, moral e grávida. Uma instituição que apareceu na segunda noite que dormia ali mesmo na Rodoviária e a levou para um dormitório, onde os outros a hostilizaram, e um deles chegou a currá-la por traz.Nem se lembrava direito como a criança nascera, saira da maternidade como uma sonâmbula, perambulando com um bebe em roupas estranhas doadas, chorando muito, ela e o bebê. Até que tomou a decisão: Iria abondoná-lo e procurar uma meretrício para ganhar a vida. Não tinha mais esperança nenhuma, não era a dona do mundo e todos os homens a viam como uma prostituta, então seria.

No banco da rpodoviária, sem ânimo, chorou sobre o pacote, e o abriu, o bebe envolto em panos a olhou calado sem chorar. Fechou os olhos, ela deixou no banco e c orreu pela rodoviária com olhos esbugalhados, sem rumo.