Mais que pegadas

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Tenho a impressão, corrijam-me se eu estiver enganado, que algumas mulheres (ou seriam todas?) deambulam como se estivessem sempre sendo observadas. Talvez até exista todo um planejamento inconsciente que fora meticulosamente ensaiado em casa, no banheiro, no quarto, no percurso entre a cozinha e a sala... Certo é que essas mesmas mulheres, tão bem ensaiadas, elas nos param, prendem nossos olhares sequiosos e nos maltratam quando passam. Até poderia tentar comparar os trejeitos do caminhar feminino e masculino, mas o foco desse desabafo é falar de beleza, de magia. Portanto, não perderei meu tempo falando do homem – que o façam as mulheres, podendo, eu permito, zombar de nós!

Hoje vivi uma dessas experiências. Ao sair de casa, apressado, por estar atrasado para o expediente do trabalho, fui seviciado, cruelmente maltratado por uma dessas mulheres que nos prendem os olhos. De repente, o tempo pareceu um mero detalhe e, sem justificativa aparente, lá estava eu estacionando o carro para ver, apenas ver, não mais que isso, uma linda mulher vestida numa daquelas roupinhas que aderem ao corpo como se parte da pele fizesse. Era um conjuntinho preto que contrastava sensualmente com uma blusinha rosa, dando ao todo uma sensação de ingênua malícia – como estava harmonioso! Não citarei o nome das peças porque não entendo nada disso. Nunca aprendi, por exemplo, que diferença há entre baby doll e camisola – se é que existe alguma diferença; nunca aprendi, isso até me envergonha falar, mas... Nunca aprendi a forma correta de como se deve retirar o soutien de uma mulher, se é que existe um modo menos traumático para essa ação, existe?

Ela (a mulher) não estava sozinha, era verdade, mas a limitação visual do homem nessas horas mira pontos tão específicos que o ambiente circunvizinho circundante, as florestas, as begônias, as valquírias, os crisântemos, a flora de um modo geral, tudo passa despercebido. Falei de florestas e de begônias apenas pra revelar que também não entendo nada de flores! De que importariam naquele instante se uma flor-virgem, em forma de mulher, preenchia olhos e levantava trogloditas?

Quando essas mulheres passam o que realmente interessa é a fauna. Nessas horas, o bicho homem se acende, queimando todos os cilindros da imaginação! Ah se tivéssemos o condão de, em mentalizando, pelo menos acender nelas uma luzinha que traduzida ‘diria’ assim: perigo, caçador a menos de dois metros...

Por falar em dimensões, minha nossa, o que era aquilo! Cabelos lisinhos, enormes (estavam presos), reluzentes – brilhavam a cada toque que os raios do sol, ainda despertando, buscavam sobre ela... Até o astro celeste, preguiçoso, curvara-se diante de tanto brilho; o contorno das costas, as silhuetas, era de uma perfeição típica de um exímio lutier – certamente, o violão tivera sua inspiração em corpos tão bem esculturados; descendo um pouco mais a linha de visada, independente do ângulo de observação, se de costas ou de frente, havia imponderáveis reentrâncias e elevações que o mais arguto dos alpinistas temeria perscrutar! – o homem, mesmo os corajosos, certamente teme diante da majestosa paisagem da mulher, obra-prima da geniosa mão do Criador!

Abriu-se um clarão! Ela sumiu. Como já passei da fase piagetiana onde a criança acredita que o objeto que deixou de ver foi embora para sempre, esperei a nova aparição, pois sabia que voltaria. E voltou! Os raios do sol pareciam mais aquecidos. Ela voltou mais radiante, mais sublime e mais charmosa. Ela sorria para o horizonte como a agradecer de algum modo o prazer e o frenesi que sabia, claro que sabia, estava provocando em todos os homens presentes. Como observador e curioso, ao fazer uma varredura pelos arredores, vi pelo menos mais uns três sofredores como eu – ah se o que pensássemos chegasse até ela em forma de energia... Ela explodiria! O mais inquietante de tudo foi descobrir que outro homem também havia parado única e exclusivamente para admirar. Homens contemplativos... O mundo ainda tem solução! Por que nós homens somos assim, hein? Tarados? Safados? Simplesmente homens, seria uma arrazoada explicação.

Ficaria ali, estático (quase), por horas a fio... Infelizmente, a vida real me tirou da irrealidade do sonho e tive que ligar o carro e me dirigir ao trabalho. Na saída, mera coincidência, quase bati na traseira do desconhecido amigo que juntamente comigo acordou do devaneio. Trocamos olhares de cumplicidade e saímos felizes, sorrindo.

O homem se excita com o que vê, certamente! As mulheres, com o que ouvem ou sentem... E os outros sentidos, é por meio deles que sentimos o que antes era uma tela sem moldura, pintada apenas dentro de nós. E o toque, gerando sussurros e gemidos, fecha o ciclo.

Ah mundo cruel!

Nijair Araújo Pinto

Juazeiro do Norte-CE, 25 de maio de 2010.

09h40min

Nijair Araújo Pinto
Enviado por Nijair Araújo Pinto em 25/05/2010
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