Rodas da Morte
 
            Voltava de carro de Brasília rumo a Goiânia, após um festivo evento familiar, travando interessante colóquio, com minha esposa e duas filhas, dentro da calma de uma tarde ensolarada de domingo, quando somos despertos por um agudo e estrondoso ruído que nos fizera gelar a alma.
            Por um instante senti uma vibração medonha, quase aquele arrepio que nos percorre em determinado momento e, segundo dizem, trazendo o sopro da morte. O ruído vinha de uma motocicleta das mais modernas (e caras) conduzida por um homem trajando uma roupa de couro ultra-avançada. Seu capacete reluzia e a vibração de sua passagem trouxe às nossas bocas uma mesma expressão:
            - Quase nos matou de susto.
            Logo passou outro, e outro, vindo um quarto elemento, um tanto atrás dos demais, a completar o evento alucinado. Aquelas motos deviam seguir viajando perto dos 200 km horários. Fiquei com a boca seca e proferi uma frase que seria cabal:
            - Brincam com suas vidas e com a de inocentes também.
            Não queria lançar-lhe uma maldição. O melhor seria ter ficado calado. A via, com duas largas faixas, unia de modo mais seguro duas efervescentes metrópoles. Naquele eixo residem aproximadamente 5 milhões de pessoas que necessitam de rápida comunicação entre as economias das suas vidas.
            Poucos quilômetros adiante fomos testemunhas de minha própria profecia. Várias pessoas pararam seus veículos e acenaram nervosamente para que reduzíssemos a velocidade. Diante dos destroços humilhados do que há pouco era fruto da mais alta tecnologia, percebemos que se quedara um corpo em provável agonia. Um daqueles quatro cavaleiros vivia seu próprio apocalipse.
            No carro ficamos mudos. Era uma vida e qualquer vida é valiosa, mesmo que não tenha a dignidade de se respeitar, ou ao próximo. Mais tarde fiquei sabendo, em uma lanchonete na qual paramos para o lanche, que diversos ¨milionários¨ da região se reúnem naquela estrada, nos fins de semana, para realizarem ¨rachas¨ entre si.
            Não sei se as autoridades locais já sabem ¨do hábito¨. Se não sabem, que fiquem sabendo e que providenciem um termo àquela loucura, antes que mais vidas sejam tragadas por homens de muita renda e pouca lucidez moral...