Negócios
Bar no centro da cidade; perto de uma delegacia de polícia.
Na mesa redonda, antiga e que dava um ar requintado ao local, dois copos de chope ainda bem cheios. Ao lado, as pequenas tigelas com amendoim torrado por quem conhece o ofício. Um dos homens, em trajes esportivos, mostrava que era rico quando não queria isto. Os sapatos elegantes denunciavam. Qualquer tira experimentado notaria de imediato que o fulano era rico, querendo passar-se por classe média. O outro era um tipo comum, desses que a multidão engole. Usava um discreto óculos escuro.
- E o senhor garante meu pagamento.
- Por inteiro, basta que o serviço seja bem feito.
- E paga dez milhões de reais. Nunca vi dinheiro assim. Parece prêmio de Loteria Esportiva, um diabo destes.
- Quem indicou disse que o homem é você. Quer metade adiantada?
- O senhor confia tanto em mim, doutor?
- Confio em quem indicou.
- E que foi?
- Não devia dizer. Mas foi o Rafael. Sigilo, rapaz.
- Rafa? Eu sabia que confiava tanto em mim.
- Pois confia desde que você fez aquele serviço difícil.
- Difícil porra nenhuma. O único problema era a beleza da guria.
- Eu vi um retrato.
- Retrato? Doutor, se o senhor visse de perto, beijava os pés dela.
- Tanto assim?
- Tanto e mais alguma coisa. Pensei em ficar com ela para mim.
- E...
- Não dava. Iam me caçar onde eu estivesse.
- Rafa é tão poderoso?
- Não se trata de poder. Eu não podia fazer isso, deixar de atirar.
- Dizem que você seguiu a Du de moto, emparelhou com ela e descarregou a Luger. O carro desgovernado entrou num poste e matou mais ainda.
- Mas não foi nada de Luger. Foi minha Whalter P.38.
- Bom, vamos deixar isto de lado. Aceita?
- Tem um retrato? Preciso conhecer tudo. Arma eu tenho.
O homem elegante tirou do bolso da camisa indiana, algodão mais preparado do que o nosso para enfrentar o calor, um envelope pequeno. Passou ao outro.
- Doutor, sou criminoso. Não sou maluco. Essa aí de jeito nenhum. Vem a Federal, os serviços de informações e toda a tropa. Não estou seguro nem na Conchinchina.
O homem era esperto. Em primeiro lugar, dez milhões de reais é dinheiro demais. Em segundo, e talvez o mais importante, era fato mesmo: a mulher saía na imprensa todos os dias.