COM CRIANÇA É ASSIM!
Aula de Geografia. Assunto? Espaço e moradia. A turma, empolgada. O que é um endereço? Rua, número da casa, bairro, cidade. Fácil, sim? Não. Mais difícil do que se imagina. Não possuem noções de espaço ainda. Quase ninguém sabe o nome da rua em que mora. Também conhecem poucos números. Cidade? Brasil. Bairro? Aí, já é bar. Conhecem muitos: Bar do Zé, Bar do Chiquinho, Bar copo "chujo" e por aí vai. A aula é puro humor. Faço tudo pra não rir.
Não tem jeito. É começar do zero. Vamos sair? Dar voltinha no quarteirão. Sentir o que é rua. Observar placa, ler número pregado em casas. Só assim pra se situarem. Mapas. Já ouviram falar? Já! Pra que servem? Pra achar tesouro! Ih, olha a televisão aí, “O mapa da mina”, “O mapa do tesouro”. Não, gente. Esse é outro mapa, tá? O da cidade. Vamos achar nosso bairro aqui? Todo mundo interessado. “Cadê seu bairro, Pedro Henrique?”. Ele não sabe, a Larissa não sabe, a Manuela também, não...
Opa! Ninguém sabe? Pesquisar então, né? “Atenção pessoal, amanhã, todo mundo vai trazer bem escritinho, o endereço completo, tá? Pede a mamãe pra ajudar”. Euforia geral. Acham legal pesquisar. Bom saber onde moramos. Enumeram vantagens. Já pensou se alguém se perde dos pais lá na festa do Carnaval? Com endereço num instantinho já tá em casa, né? Já pensou se a avó do Ceará mandar carta com endereço errado? Nem cheiro de carta chega! Pois é, pra ver como é importante.
Dia seguinte. Correção da tarefa. Quem trouxe os endereços anotadinhos? Vamos fazer uma ficha bem bonita pro caderno, tá? Todo mundo animado com o dever. Tudo cumprido à risca. Os pais ajudaram? Ah, que bom! Tão legal, quando o papai e a mamãe ajudam na tarefa. Então vamos ver? Animada também fico eu. Agora sim temos um fichário completo de endereços. Noções de forma prazerosa! Ótimo! “Olhei o caderninho de todo mundo?” Olhou! Olhei nada! Tá faltando um...
Lá está o Otávio Augusto no fundinho da sala. Tá se escondendo de quê? Não fez o dever, né? “Otávio Augusto, cadê seu endereço?”. Ele tem um risinho maroto “Esqueci, tia!”. Novidade? Nenhuma! Ele nunca lembra... “Bom, e agora senhor Tavinho, fazemos o quê?”. Ele não se aperta “Ah, preciso de endereço nada. Eu já sei explicar onde eu moro”. Lá vem coisa! “É? E eu posso saber?”. Ele fica de pé. Faz os gestos, vai falando “Tem aquela rua comprida do bar do Casca. Lá não tem uma casa rosa? Né, lá, não! Tem que andar mais. Anda, anda mais, depois vira. Vira de novo. Chega numa casa de bloco com uma caixa d’água, uma árvore na porta, uma antena parabólica, um portão de pau. Pois é, eu moro é lá!”. Ah, então tá, Otávio Augusto, pra que endereço, né? Facinho demais de achar, uai...