DESTESSITURA
Parecem galos tecendo a manhã. De galos que tecem manhãs só conheço os exemplares do poema de João Cabral. Se, para nascer, minha manhã dependesse de galos, tudo aqui seria uma perpétua Noruega no inverno, porque o único habitante de crista, morador no último quintal dos arredores, só mantém um fiapo de fôlego. Ao contrário dos velhos, dia-a-dia desprende, mais e mais, as cantigas da infância.
Não, não se parecem com o cantor decadente, tampouco com os tecelões de Cabral. Assim, nada sobra da primeira afirmação. Nada, sequer a palavra tecendo teiatecidotela... Tela evoca retrato e eles, no momento seres incomparáveis, de modo algum se deixam aprisionar mais que no ensaio de um esboço.
Talvez não surja tal pedra no caminho, com este recomeço: Parecem andorinhas fazendo verão. Mas, é preciso negar, imediatamente, que se pareçam com andorinhas fazendo verão, negação a trazer de volta o branco inicial onde se havia tecido a imperfeita seqüência de tês, que apenas conduzira o texto a intrigas mínimas e não a um tête-à-tête com os que não se parecem com galos. Forçosa se torna a fuga efetiva do tititi sem sentido que continua a lembrar mais o trabalho de um pica-pau que o de um tecelão.
Eles não urdem manhãs, não parecem andorinhas nem galos. Às vezes proferem monólogos e aí se assemelham ao exemplar quase afônico ou àqueles que se acham plenos de veredas perdidas. Não alcanço que nome lhes dar, sei apenas suas vozes se erguendo, coro de pouca afinação, que acorda o insone do sono de segundos, com habilidade não comparável à dos galos cabralinos nem à das andorinhas fazendo verão. Não, não se assemelham, deveras, a um coro de querubins.