Reféns da Noite
Uma história de não-vida.
Provavelmente a pessoa que esteja lendo isto não seja um de nós disso eu tenho certeza, mas o que um livro pode fazer de mau? Ler um livro nunca fez mal a ninguém, ah, mas é claro que meu livro, ou melhor dizendo, meu diário é diferente. Aliás, se fosse um vampiro com toda certeza já teria destruído tudo e permitido que a historia se perdesse Creio que você já tenha ouvido vários rumores sobre nós, mas nunca soube a verdade. A história que mais é modificada em todo o mundo é a nossa, cada um fala uma coisa e assim por diante, mas estou aqui para lhes contar a verdadeira e além do mais você sabe que é muito perigoso virar estas páginas, o conteúdo delas pode lhe trazer problemas. Sei que a curiosidade é maior, deliciosa e perigosa, mas se você é corajoso não terá problema algum, pois eu quero que você leia tudo a meu respeito. Você não está com medo? Acho que deveria estar!
Deve estar curioso para saber mais sobre mim, bom... Posso te dizer que tenho pouco mais de 30 anos, você deve me achar uma velha mais se você me encontra-se pessoalmente mudaria de idéia. Há um mundo diferente, o qual você não deve conhecer. O que eu lhe contarei pode assustá-lo um pouco. Nós existimos há séculos e os mortais não sabem e nunca souberam disso. Fui transformada quando tinha apenas 21 anos, já se passando pouco mais de trinta anos que estou neste estado de existência. Ah, eu falei que tinha pouco mais de trinta anos, o caso é que nós começamos a contar do zero, assim que nascemos para as sombras, então, fazem mais de trinta anos que sou das trevas. Eu era nova e estava aproveitando a vida, a muito custo consegui cursar a faculdade de arqueologia, pois naquela época a mulher era criada para se casar e somente aquelas que possuíam caráter o bastante para enfrentar os pais e a sociedade conseguiam o que realmente queriam, senão, continuavam em casa lavando e passando roupa como um belo cão treinado.
Quando fui transformada tive medo como qualquer outra pessoa teria diante dessa situação, ficar cara a cara com alguém que possui dentes afiados e uma força descomunal é apavorante, mesmo para quem tem sangue frio. Depois disso minha vida acabou, era como se eu tivesse nascido novamente. Não sabia quão perigosa é a vida de um vampiro, descobri isso á pouco tempo, sempre achando que era uma maravilha viver eternamente, mas me enganei como muitos outros. Uma das maiores curiosidades que você deve ter é para saber de quem nós descendemos e como ficamos neste estado de não-vida, não é? Bom, a história é muito longa e eu não posso descrevê-la com detalhes, mas ao longo da história você ficará sabendo de muitas coisas, assim poderá tirar suas próprias conclusões.
Isto que era para ser um simples diário sobre minha não-vida tomou outro rumo, direi a você o que houve há alguns anos atrás, em 2001, que é muito importante, claro. Fui perseguida durante meses, sou muito curiosa e acabo me metendo em encrencas, só que dessa vez eu estava quietinha na minha. Ainda estou desenvolvendo poderes, sou muito esperta para uma neófita e isso foi o bastante para fazer com que um certo vampiro chamado Jack Hammet se interessasse por mim. O que ele queria? Mais poder talvez, e olha que ele já era muito poderoso, mas foi impedido antes que conseguisse o que o interessava tanto. Quem é Jack Hammet? Ele era um ancião ou pelo menos virou quando sugou a alma de Cartus um dos anciões de seu próprio clã, os Centuriões. O clã dos Centuriões possui esse nome porque eram um grupo de soldados da Roma Antiga, na época em que estava em alta as lutas de Gladiadores. O regente da nossa sociedade que era seu cúmplice foi morto. Quem é o regente? Essa é uma das coisas que você deve saber. É ele quem toma conta da sociedade vampirica da nossa cidade, para que as coisas não saiam do controle e que os neófitos inexperientes não saiam por aí mostrando o que são, pois nós vampiros não queremos que vocês meros mortais saibam que estamos aqui, isso torna nosso trabalho mais fácil. Geralmente vocês humanos são meros rebanhos, nossa fonte da vida eterna. Contarei-lhe um pouco sobre nós para que entenda minha história! Bom, tome cuidado, você ficará surpreso!
Nós somos muito poderosos, cada um com seu poder e força dentro de seu clã, ou grupo se assim preferir. Meu criador tinha dons, ou melhor, poderes do sangue e outras coisas maravilhosas que lhe foram passadas pelo seu criador e eu recebi esses “dons”. Quais? São vários e ao longo da história serão sutilmente revelados.
Tenho a aparência de estar viva e um exemplo é manter-me com a pele quente, essa é uma das utilidades de meu sangue, o que torna mais fácil andarmos entre os mortais. Minha pele é fria como a dos outros de minha raça e mantê-la aquecida tem seu preço. Custa muito caro mantê-la quente, isso esgota nosso sangue.
Muitos de nós somos individualistas ou fazemos tudo por uma recompensa gloriosa. Estamos divididos em grupos, assim como um vampiro muito poderoso determinou, cada um com seus poderes, regras, qualidades, defeitos e propósitos. Quais são esses clãs? São vários, não me lembro de todos, mas você ficará sabendo quais são ao decorrer da história, porém, talvez eu não lhe conte sobre todos eles. Saiba que a maioria desses clãs, senão todos, vivem em guerra e não se suportam por vários motivos, você pode especular alguns deles, mas creio que o principal seja o poder.
Somos assombrados eternamente pela disputa de poder dos matusaléns, hoje só existem dez matusas, antigamente eram catorze, mas eles morreram em uma de suas lutas. Seria errado confirmar isso que acabo de dizer, mas acredito que seja aproximadamente esse número de matusaléns, se não houver mais ou deles. Agora eles jogam suas crias um contra os outros e ficam escondidos para não serem mortos, não sei se possuem força suficiente para se erguerem dos túmulos e assumir a guerra por si mesmos ou estão apenas ganhando tempo. É difícil dizer ao certo o que eles querem e o que estão fazendo. Apesar de tudo isso, nunca nos foi revelado ao certo o nome de nosso criador e muitos especulam sua identidade. Ainda me pergunto porque eles escondem isso de todos, vai ver nem mesmo os anciões sabem, mas de uma coisa nós sabemos. Quem quer que seja o criador, foi amaldiçoado pelos antigos deuses do Egito. Condenado à vida eterna na escuridão, nosso criador cometeu um ato de “heregia” aos deuses, eles o perdoaram, mas ele recusou o perdão e cada um lhe jogou uma maldição. Ele sofreu muito durante anos, porém, após um longo tempo ele descobriu que podia passar sua maldição á diante e para não vagar sozinho pela terra ele o fez, mas depois sumiu e nunca mais tiveram notícias suas. Deve ter se arrependido de trazer mais alguém para a escuridão.
Ah claro, também existem magos, lupinos (lobisomens) e outros que você sempre achou que fossem simples lendas, invenção de pessoas com mentes perturbadas, mas que são pura realidade. Se você pensa que as pessoas tiram tudo da própria cabeça, pensou errado, alguém sempre se baseia em algo real. Esses malucos ou perturbados como a sociedade os chamava e ainda chama, quase sempre tem razão no que dizem, suas mentes são bem evoluídas e eles vêem muito além do que seus olhos mortais podem enxergar.
Bem, voltamos a mim. Há muito tempo eu me apaixonei por um mago que me ajudou durante o acontecimento que vou lhe detalhar e apesar de ser vampira não sou como os outros. Bom, não que eu seja muito confiável! Mas vamos ao que interessa. Para que você tenha uma idéia de como vivo, irei lhe contar como fui transformada, mas lhe aviso que você deve prestar atenção em tudo o que ler ou não irá entender nada.
Andando sob a luz do sol
Era uma manhã de quarta-feira, o dia começou bem ensolarado, as nuvens pareciam dançar no céu azul, os pássaros voavam alegres cantarolando melodias para nossos ouvidos. Eu estava indo pra faculdade com duas amigas e no caminho fiquei um pouco tonta, achei que fosse o calor. Parei para descansar, sentei-me no paralelepípedo e repousei minha testa na palma das mãos, em segundos veio a minha mente uns flashes que eu não sabia o que significavam, fiquei atordoada com aquilo, mas não contei a ninguém. Seria taxada de louca e eu não queria que isso acontecesse. Esperei um pouco e depois me levantei ajudada por essas duas amigas e continuei a caminhar, elas fizeram perguntas sobre o que acontecera, mas se nem mesmo eu entendi como contaria a elas, e se eu contasse elas achariam que sou maluca. Melissa e Ana Paula eram minhas melhores amigas, além de estudarem comigo. Melissa é alta, cabelos loiros e lisos, na altura dos ombros, porém, ela só o usa preso em uma linda trança. Melissa tem olhos verdes e é muito sorridente. Já Ana Paula é baixa, 1,63 de altura no máximo, não me recordo muito bem. Ela possui cabelos longos e encaracolados da cor do barro. Olhos castanhos, misteriosos. Ana Paula não é de falar muito, mas é muito bonita e charmosa.
A partir desse dia fiquei um pouco perturbada, passava a maior parte das aulas pensativa. Comecei a ver em minha mente um homem agarrado a alguém que eu não conseguia saber quem era, as sombras que cobriam a pessoa só permitia saber que era uma mulher. Isso foi me preocupando cada vez mais, será que eu estava enlouquecendo ou era alguma coisa real, alguém corria perigo? Eu não sabia dizer, minha cabeça estava confusa, e foi assim por dois longos meses, até que um dia comecei a sentir que alguém me vigiava, mas apesar disso tentei não dar muita importância, tinha outras coisas com o que me preocupar, esse era meu erro. As aulas na faculdade já estavam quase acabando, faltava apenas alguns dias, eu estava muito feliz por estar me formando. Na minha turma só havia três mulheres, eu, Melissa Brown e Ana Paula, era raro uma mulher naquela época cursar uma faculdade, o que para nós três era um objetivo alcançado e um motivo de orgulho, mas não eram todos que pensavam assim, meus pais não gostavam da idéia, foi muito difícil convencê-los.
Na última semana de aula eu estava na biblioteca. Um salão amplo com muitas mesas e cadeiras de madeira antiga, muito bem trabalhada. Fui até uma prateleira e apanhei um livro que falava sobre a Grécia antiga, sentei-me em uma das mesas e comecei a lê-lo. Foi quando veio até mim um homem alto, cabelo médio e loiro, pálido, de uma beleza extrema. Seus olhos eram cor de mel, pequenos e expressivos. Ele pegou um livro e se sentou ao meu lado. A princípio eu não havia notado sua presença, nem mesmo ouvi seus passos, quando ele pigarreou baixinho foi que eu o notei e fiquei um pouco receosa, pois a biblioteca se encontrava vazia, havia vários lugares vazios e ele veio se sentar ao meu lado. O fato era que a sua presença me passava uma tranqüilidade muito grande e eu acabei relaxando, ele puxou papo e devagarzinho ganhou minha confiança, nós começamos a conversar normalmente. O homem perguntou meu nome e eu disse que me chamava Sarah Owens, ele se apresentou, se chamava Taylor Greed. Nós conversamos por um longo tempo, ele fez várias perguntas sobre mim, mas falou pouco sobre ele, parecia não querer falar sobre sua própria vida. Sua voz era rouca e baixa, mesmo assim eu o entendia perfeitamente. Taylor falava em um tom alegre, porém, conservador. Após um longo tempo eu voltei a me distrair com o livro, foi quando ele me perguntou algo inesperado e fora do assunto.
- Você acredita no que os mortais chamam de lenda? - Perguntou Taylor quase murmurando e se apoiando em um dos cotovelos.
- Em termos posso dizer que sim! Porque me pergunta isso? – Respondi ainda fitando o livro, mas sem lê-lo, apenas prestando atenção ao que ele dizia.
- Por nada, mera curiosidade. Sou um estudioso e sempre faço esse tipo de pergunta as pessoas. Bem devo me retirar, posso dizer que a conversa foi prazerosa. Espero revê-la em breve. – Ele pegou minha mão e beijou-a levemente.
- At... Até mais. – Disse meio sem jeito, olhando aquele homem que agia com graça e beleza.
Após se despedir, retirou-se da biblioteca me deixando sozinha apenas com um aceno de mão, fitei-o até não mais o ver. Posso garantir que fiquei meio confusa, não era mera coincidência ele parar ali, pensei no que ele poderia querer comigo? Eu nem desconfiava, e além do mais poderia sim ser uma simples coincidência.
Desde que ele foi embora eu sabia que tinha alguma coisa de estranha, podia sentir isso.
Uma semana depois eu estava me formando, foi o dia mais feliz da minha vida, até ali. Toda minha família esteve presente, o que me deixou mais feliz ainda. A festa de formatura estava linda, havia sido feita em um sítio com piscina e tudo, a decoração era esplêndida e bem moderna para a época, comes e bebes a vontade. Ainda me lembro do gosto do ponche, do cheiro da comida. Naquela noite dancei com meu pai e com alguns garotos que queriam me cortejar, mas eu não pensava nisso, pensava apenas em minha carreira. Resumindo tudo, fora uma noite maravilhosa.
Passando-se a formatura, faltava apenas um mês para meu aniversário e eu estava preocupada mais muito feliz, e nada poderia estragar essa felicidade. Fui para a biblioteca, o único lugar em que eu conseguia ficar em paz. Peguei um livro qualquer e me sentei em um das várias mesas espalhadas por ali, algumas pessoas trafegavam por perto, procuravam um livro e depois se sentavam, quando isso não acontecia iam embora chateados. Por um tempo fiquei pensando sem dar a mínima atenção ao livro que havia pegado e que não era muito recomendável para uma garota, Kama Sutra. Quando percebi tratei de devolve-lo rapidamente a prateleira.
Pensei muito na formatura e esbocei um sorriso ao relembrar, também pensei no tal de Taylor que tanto chamou minha atenção. E quando já estava cansada de ficar ali sentada me levantei para ir embora da biblioteca, andei alguns centímetros até a porta e me senti um pouco estranha, o que foi fácil de descobrir por quê. Parei um pouco e atentamente observei ao meu redor, como sou médiun não foi difícil perceber que havia vários espíritos perturbados por perto, mas foi aquela sensação de peso nas costas e no coração que os denunciou. Eu não entendia o que eles queriam e sei também que eles não estavam ali antes, fiquei pensando o que poderia ser, mas de nada adiantou, sendo assim logo eles sumiram. Eu ainda fiquei um tempo parada no mesmo lugar, olhando em volta até me certificar de que estava sozinha novamente.
No dia seguinte procurei minha amiga Raffaela e contei a ela o que aconteceu na noite passada, ela também ficou sem entender, mas disse que pelo menos poderia me ajudar, a saber, porque estes espíritos apareceram rápidos e depois sumiram. Raffaela é espírita, não católica, por isso perguntei sobre os espíritos à ela.
Passando-se uma semana Raffaela veio me procurar para contar o que descobriu, me explicou que estes seres estavam preocupados com minha segurança. Primeiramente perguntei, “seres?” E ela me contou uma coisa que deixou os pêlos da minha nuca em pé. “Eles são anjos!” Foi a resposta que ouvi. Fiquei abobalhada, anjos, eu nunca iria imaginar. Se meus pais descobrissem isso acho que me internariam.
Os tais anjos disseram a ela que aquele homem com quem eu havia conversado não era de confiança e que não deveria me encontrar com ele novamente, pois seria fatal para mim. Fiquei atordoada com o que acabara de ouvir de Raffaela que também ficou preocupada e pediu-me que tomasse cuidado, eu prometi que tomaria cuidado, mas que daria um jeito de saber o que ele queria, pois sempre fui curiosa e não deixaria isso passar assim sem pelo menos “pesquisar”. Fiquei mais curiosa ainda para saber como ela descobriu isso tudo, só que ela não quis me contar nada.
Tentei encaixar tudo o que estava acontecendo na minha cabeça, mas não conseguia. O que tudo isso queria dizer. Eu não entendia nada. Só o fato de que naquela época nenhuma mulher sabia de muita coisa já ajudava. Eu parecia uma idiota sem saber de nada. Bom, eu só fui descobrir o que era menstruação aos 17 anos, era de se esperar que eu não soubesse nada sobre vampiros ou coisas do além.
O tempo foi passando e já era meu aniversário, a formatura foi maravilhosa e gratificante após tanto tempo de estudos, imagens da festa ainda dançavam na minha cabeça. Eu estava arrumando a casa para a festa que teria mais tarde e minhas amigas estavam ali me ajudando como sempre. Estava muito feliz e até já tinha me esquecido do que havia acontecido, pois procurei saber quem era aquele homem mais não encontrei nada e apesar disso ele não apareceu de novo. Nesta tarde eu novamente vi flashes em minha mente, enquanto estava na cozinha com a empregada preparando alguns docinhos e o bolo. Só que desta vez aqueles flashes estavam mais claros e fortes, foi aí que eu vi aquele homem, Taylor, abraçado a alguém em um lugar muito bonito, parecia um quarto, totalmente em tons de vermelho, vinho e branco, mas eu não conseguia ver quem era a outra pessoa, uma mulher pelo que percebi, as sombras que a cobriam só me permitiam ver o contorno de seu corpo. Dessa vez eu me via dentro das imagens, estava tremula e não conseguia me mexer. Quando voltei a mim, minha empregada estava abaixada ao meu lado, eu havia caído no chão com o choque que a visão havia me causado. Levantei-me lentamente, ajeitei minha roupa e tentei acalmar a empregada que ficara muito agitada.
- Calma mãe, foi só um susto! – Eu falei.
- Mas minha filha!- Ela fez uma pausa, sempre me chamara assim. – Bem, pode ter sido sua pressão que baixou. É o nervosismo por causa da festa. – Ela sorriu.
- É mesmo, mas já estou melhor. – Eu retribuí o sorriso e nós duas continuamos o trabalho.
Já estava quase tudo pronto para a festa e eu não sabia que seria minha festa de despedida, nem imaginava que nunca mais voltaria a ver aquelas pessoas novamente. Todas as minhas amigas já tinham ido embora para se arrumarem enquanto eu terminava o pouco que faltava. Logo estava tudo pronto e agora era a hora de ficar bonita para os convidados. Tomei um bom banho e coloquei um belo vestido, bem comportado claro. Pena que naquela época nunca passou pela minha cabeça as roupas que existem hoje em dia, convenhamos são bem melhores que antigamente.
Logo arrumei meus cabelos escuros e compridos que chegavam a minha cintura, lisos em cima e com lindos cachos nas pontas, fiz minha maquiagem e já estava pronta. Quando estava descendo a escada para mostrar a minha mãe como eu estava a campainha tocou e eu prontamente fui abrir, eram alguns dos meus amigos e já chegavam fazendo bagunça. A festa começou enquanto os convidados iam chegando, meu pai e meu irmão ainda estavam no trabalho. A música tocava, eu estava muito animada, não sabia que seria meu último dia entre os mortais.
A campainha tocava incessantemente e na maioria das vezes era eu quem ia atender. Minha família era muito conhecida e respeitada na cidade. Uma das vezes que atendi a porta me deparei com um amigo de infância, eu não o via há anos, estava muito mudado, pálido, estranho. Ele havia chegado trazendo alguém, quando olhei para a pessoa que estava com meu amigo levei um baita susto, era o homem que vi na biblioteca meses atrás, meu coração disparou e mesmo assim o recebi educadamente, mas com insegurança e com os olhos fixos nele. A noite ia passando e a festa rolando, Raffaela também estava lá, ela não era uma figura muito bem vista pela sociedade, seu modo de agir era um pouco “ousado” para a época. Mas foi então que aproveitei para mostrar a ela quem era o tal homem de quem eu havia lhe falado. Fui até o sofá aonde ela se encontrava sentada e lhe mostrei Taylor, Raffaela arregalou os olhos ao vê-lo. Ele olhava para mim com um olhar carinhoso e muito expressivo que me assustava, deixando-me mais nervosa ainda. Eu ainda acho que ele sabia exatamente o que eu pensava, pois eu sentia seus olhos dentro mim, como se me avaliasse ou lê-se meus pensamentos. Perguntei a Raffaela o por quê dela olhar fixamente para ele e ela calmamente me respondeu que podia ver sua aura e que não era de uma pessoa normal. Preocupada ela me puxou mais para perto e falou murmurando em meu ouvido.
- Sarah... Tome cuidado com esse homem, eu não sei porque mais a presença dele me deixa inquieta.
- O que será que ele quer? Parece esconder algo! - Eu disse assustada. - O que eu faço Raffa?
- Fique de olho nele, mas tome cuidado! – Com uma expressão no rosto que me deixou assustada.
Depois de um tempo Raffaela me pediu desculpas, se levantou e foi embora. Disse que não se sentia bem na presença daquele homem, ficara muito ansiosa desde que descobriu quem era ele. Além do mais, a maioria das pessoas ali não gostavam dela. Pelo simples motivo de ser “excêntrica”, para aquela época. Para que não houvesse mais problemas ela foi embora, eu gostaria que ela tivesse ficado comigo, me sentia bem perto dela. Raffaela além de tudo era minha amiga, uma pessoa extraordinária, gostava muito dela e eu me sentia sozinha no meio de tanta gente, sem ela.
Pessoas que só estavam ali por causa do dinheiro que minha família possuía, muitos não gostavam de mim. “O que uma mulher pode fazer numa faculdade?” Era o que diziam ou então, “Mulher tem que cuidar da casa e não querer se meter no meio de homens!”. O preconceito era imenso, sofri muito juntamente com as garotas que faziam faculdade comigo, mas nós enfrentamos e conseguimos o que queríamos. Eu estava num ninho de cobras e sabia disso.
A festa acabou quase de madrugada, todos haviam ido embora e eu estava exausta, mas feliz por Ele também ter ido embora, sem que eu percebesse. Meus pais já haviam ido dormir e meu irmão estava trancafiado no quarto, fazendo o que eu não sei, mas foi aí que a campainha tocou. Após o terceiro “Ding Dong” fui atender e dei de cara com o homem que dizia se chamar Taylor Greed, dei um pulo pra trás tamanho o susto e tentei fechar a porta deixando-o do lado de fora, mas não consegui por algum motivo que eu não sabia e na hora nem dei importância. Ele me pediu para que ficasse calma, pois não me faria mal e só queria conversar comigo. Eu estava assustada e mais uma vez veio a minha mente a imagem dele abraçado a alguém, mas agora ele parecia estar beijando o pescoço de uma mulher. Eu quase caí no chão, mas ele me segurou. Logo me recobrei da visão, tentei acalmar minha respiração ofegante, e após alguns segundos que mais pareciam séculos eu lhe perguntei o que queria.
- Venha comigo, vamos dar uma volta à noite está muito bonita! - Disse ele sorrindo. - Vamos não tenha medo!
- É melhor não! Já passa da meia-noite e nenhuma mulher deve sair de casa. – O olhei de cima a baixo. – Muito menos com estranhos!
- Vamos, não precisa ter medo. - Disse com uma voz doce e suave, que hipnotizaria qualquer garota.
Com muito custo eu atendi seu pedido. Nervosa, olhei para os lados, sai batendo a porta, logo desci a pequenina escada de entrada e o segui pelo jardim florido que havia na minha casa. Passamos pelo portão ganhando a rua silenciosa e deserta.
Numa coisa ele tinha razão, a noite estava realmente muito bonita, a lua iluminava tudo a sua volta e as estrelas pareciam estar mais brilhantes do que de costume. O vento fresco batia em meu rosto aliviando-me do calor e da tensão. Ele olhava para mim com ternura, como um pai, mas ao mesmo tempo parecia me seduzir. Só nessa hora percebi suas vestes que eram pretas, possuía um sobre-tudo que ia até seus pés, uma blusa de manga comprida por baixo e calça comprida. Um lindo cordão com um crucifixo de ouro repousava pendurado em seu pescoço, os oclinhos redondos lhe dava um ar intelectual. Apesar de estar com medo ele me passava muita tranqüilidade, não dizia uma só palavra, apenas observava a rua deserta. Tentei lhe perguntar o que queria comigo, mas as palavras não saiam da minha boca. Não posso dizer que a atmosfera em que nos encontrávamos era romântica, mas posso dizer que era envolvente.
Nós paramos em uma pracinha e nos sentamos em um banquinho. O lugar é até hoje bem arborizado e florido, belos passarinhos que mesmo no escuro trafegam sem medo. Uma pausa se interpôs entre nós e os pássaros, então, ele quebrou o silêncio me perguntando o que eu achava do mundo. Parei um pouco para pensar, ele me trouxe até ali para me perguntar o que eu acho do mundo. Ah, nesse mato tem cachorro. Após esse pequeno raciocínio respondi, dizendo que para mim o mundo andava de cabeça pra baixo e que não faltava mais nada para piorar, mais foi aí que eu me enganei, se eu pudesse naquela época imaginar o mundo como está hoje, não teria dito aquilo.
Nós conversamos sobre isso por um longo tempo e já passava das três da madrugada. Meu medo foi se dissolvendo aos poucos em que passava a ouvir Taylor, comecei a achar que o tinha interpretado mal, tentei olha-lo com mais tranqüilidade, mas depois de um tempo voltei a ficar tensa.
- Você realmente acha que o mundo é assim mesmo? Não acha que há algo por trás disso tudo? - Disse Taylor.
- Como assim, não entendi?!
- Você acredita em vampiros, lupinos (os famosos lobisomens), anjos, e outros seres?
- Bom... Eu acredito em anjos, mas vampiros e lupinos não é meio absurdo?! - Eu disse a ele, achando essa conversa muito estranha. - O quê você pensa disso?
- No momento eu só posso lhe dizer que eles existem, não se assuste com o que irei lhe contar e mostrar. – Ele olhou a sua volta e depois colocou seu olhar sério em mim novamente. – Confio em você para lhe contar isso!
- Mas por quê você quer falar disso comigo? – Intrigada, me remexendo no banco. – você deve estar meio maluco pra dizer essas coisas.
- Porque você é especial para mim e eu não estou nem sou maluco! – Agora com um pequeno sorriso nos lábios, mas seu olhar ainda era sério.
Ficamos ali por um bom tempo, Taylor me contou muitas coisas. Eu olhava em seus olhos e poderia dizer que ele estava escondendo algo, mas que queria revelar o mais rápido possível, apesar do medo. Ele falava e falava, eu como uma boa ouvinte, prestei bastante atenção em tudo o que me falou, porém, estava ficando confusa. Foi aí que veio a bomba. Ele me disse que era um vampiro, claro que eu não acreditei e rindo respondi que era um absurdo, mas ele disse que me provaria que era verdade. Ele me olhou profundamente e pediu que eu me mantivesse calma e não tentasse sair correndo, pois o que ele iria me mostrar poderia me chocar. A atmosfera entre nós estava tensa. Eu apertei a borda do banco com força, então, eu percebi que os olhos de Taylor mudavam de cor, do mel para o vermelho vivo, seus lábios se abriram vagarosamente deixando a mostra seus caninos longos e afiados. Afastei-me um pouco e apertei o banco com muito mais força, podendo sentir minhas mãos arderem. Queria sair correndo, mas não conseguia me mover. Não conseguia desviar o olhar daquele monstro a minha frente. Até aquele momento eu estava um pouco assustada, mas agora fiquei apavorada. Só que muito curiosa sobre aqueles caninos enormes que apareceram do nada. Fiquei me perguntando o que ele iria fazer e ele me sussurrou para não tentar adivinhar. Eu me assustei mais ainda, pois não havia dito nada só pensado e ele respondeu a minha pergunta, então começou a me explicar tudo. Lágrimas de medo escorriam de meus olhos. Mas fiquei ali, ouvindo tudo o que ele tinha a me dizer. Podia sentir que ele não me faria mal.
Contou-me sobre o mundo vampirico e os outros seres, me explicou sobre os clãs e outras coisas. Ficava cada vez mais espantada e ao mesmo tempo fascinada com tudo o que me contava, ele também me disse onde o regente ficava, onde acontecia todas as reuniões e decisões sobre as nossas vidas. Me falou sobre a briga entre os clãs e a luta pelo poder. Como eles influenciam na vida política dos mortais. “Nós comandamos a polícia, alguns senadores, vereadores e outros que desejam se unir a nós”.
Acho que mesmo se tentasse não conseguiria sair do lugar, tudo que entrava em meus ouvidos era fascinante, o mundo místico dos livros realmente existia, encoberto por uma nuvem de mentiras. Estava perplexa com aquilo tudo, fascinada. Ouvia-o falar da beleza de ser um vampiro, então, veio a minha mente a idéia de que um vampiro não pode sair ao sol, se mostrar as pessoas como é exatamente. Tem também o fato de ser um assassino, matando para sobreviver. Esse pensamento tirou um pouco do entusiasmo, me trazendo de volta a realidade. Perguntei-lhe sobre isso e ele com sinceridade e compaixão respondeu.
- Sim, às vezes achamos a eternidade insuportável, porém, acabamos nos acostumando com ela. – Ele fez uma pausa, receava contar alguma coisa. – Uma vez tentei acabar com meu sofrimento... – Continuou com a voz baixa. -...Andei pelo deserto até o dia amanhecer... – Ele parou, não conseguia continuar!
- Continue, por favor. – Eu pedi.
- Bem, o dia amanheceu e o máximo que consegui foi pegar um bronzeado. – Ele deu um sorriso amargo. – Peguei fogo, estava totalmente despido. Quando não mais agüentava a dor... - Uma lágrima de sangue escorreu de seus olhos, fiquei impressionada.- Quando desisti de morrer, coloquei com muita dificuldade minhas vestes, largadas na areia.- Ele olhou para mim e voltou seu olhar para o céu. – Durante muito tempo fiquei com a pele escurecida pelos raios solares. Com o tempo voltei ao normal.
- E o que te fez agir dessa maneira? – perguntei tirando um lencinho do bolso e enxugando a lágrima de sangue. – Por quê tentou se matar?
- Naquela época eu ainda era um neófito, com pouco mais de oitenta anos. Não estava agüentando a pressão e além do mais, estava cansado de viver dessa maneira. – Ele olhou para o céu novamente. – Acho que ele não permitiu que eu morresse ou talvez... Não sei. – Ele parou e não quis continuar, estava constrangido, eu podia ver.
(CONTINUA)
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