DESMIOLADO

De 1982 a 1985 eu morei e trabalhei em Fortaleza, a bela e irresistível capital do Ceará, terra de Iracema, linda de viver! ...

Cidade à beira mar, rica em belezas naturais, povo simples, cordial e hospitaleiro, Fortaleza encanta a todos que a visitam, sejam brasileiros de outros estados ou turistas estrangeiros. Durante o dia atrações mil, a orla marítima, suas praias maravilhosas, as barracas na Praia do Futuro, onde se come um bom caranguejo acompanhado duma cervejinha gelada, a Praia do Pescador, a Praia de Iracema, o Mucuripe (composição de Fagner e imortalizada por Roberto Carlos numa de suas gravações), a Volta da Jurema e muitas outras novidades.

À noite, os forrós comem soltos por toda a cidade, cada um mais animado do que o outro. E os shows, os humorísticos apresentados por artistas locais? Imperdíveis, todos eles. O nordestino é muito criativo e seus artistas são fantásticos.

Eu e a minha família curtimos muito, viajamos ao Cumbuco, à Prainha de Aquiraz, à Caucaia, passeamos bastante e fomos muito felizes na nossa estada no saudoso Ceará. Todavia, um fato que presenciamos ao vivo marcou tragicamente as nossas memórias até hoje.

Existe uma grande praça no ponto mais elevado da cidade, onde fica a sede da “TV Verdes Mares”. Bem no meio da praça, destaca-se uma torre enorme, altíssima, projetada em ferro e aço, tendo no topo antenas poderosas de TV. Na base, a torre é larga e começa num quadrado que vai se estreitando à medida que avança nas alturas.

Pois não é que, no fim duma manhã ensolarada, um sujeito baixinho, barbudo, cabeça grande, meio desequilibrado mentalmente, o qual freqüentava aquele espaço, andando pra lá e pra cá, pedindo esmolas aos transeuntes, pegando sobras de comida nos bares e restaurantes próximos, esse indivíduo começou a subir pela torre, não se sabe por que motivos e foi galgando-a devagar.

Os meninos e meninas que saiam dum colégio na praça, ante a cena inusitada, começaram a apupar o baixinho alpinista, o qual subia cada vez mais. Logo que chegou bem alto, quase próximo às antenas, o maluco parou, olhou para baixo e gesticulou, ameaçando saltar.

As pessoas em baixo se enervaram, moças e senhoras baixavam as cabeças, não queriam ver, homens gritavam, pedindo pro sujeito descer, mas as moças e os rapazes do colégio riam e instigavam o doido:-

“- Pula, pula, pula!...” – E ele erguia os braços, gesticulava, ensaiando o vôo da morte. Uma tragedia iminente estava sendo anunciada.

A cena foi rápida. Antes mesmo que os bombeiros e a polícia, chamados com urgência por alguns populares e comerciantes, chegassem ao local, o maluco estendeu os braços e saltou da torre, emudecendo os apupos dos estudantes em suas gargantas.

O baque surdo do seu corpo no gramado da praça, junto à base da torre, selou o fim daquele drama citadino que gelou os corações de todos os que o presenciaram. A irreverência e a irresponsabilidade dos jovens prevaleceu sobre a mente fraca e doentia do pobre mendigo.

B.Hte., 19/05/10 -o-o-o-o-o-

RobertoRego
Enviado por RobertoRego em 19/05/2010
Reeditado em 03/10/2017
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