Lutas Íntimas

Quando eu era criança, bastava alguém fingir que ia fazer

cócegas e eu já me retorcia toda, rindo. Mas lembro que isso me contrariava bastante.

Um tio, sabendo dessa fraqueza, vivia me atormentando só para ver minha reação. Era a tal “ação e reação”, resultante de um sadismo, pois eu era uma criança que se via indefesa e ele não atendia aos meus rogos de parar com aquilo. Minha avó sentindo o meu desconforto pedia-lhe para não me atormentar. Em vão pois ele ignorava e, espetando o dedo no meu braço

iniciava o dedilhado nas minhas costelas provocando as tão

torturantes cócegas. Minha avó encontrou uma solução providencial e que até hoje eu adoto.

Disse-me ela, quando eu tinha uns dez anos, mais ou menos isso:

- se demonstrares tua fraqueza, ele (meu tio, no caso) sempre irá te provocar e satisfazer o prazer em te ver subjugada. Tenta não mostrar que sentes cócegas e verás que ele vai parar.

Sábio conselho da minha sábia avó Mimo. Com uma força de vontade que fui exercitando aos poucos, superei a reação que o sádico provocava e, depois de um certo tempo já não sentia nada quando ele mexia comigo.

Hoje, mais de 60 anos passados, podem fazer cócegas em mim que não externo nenhuma sensação, embora a sinta.

Isto acontece, também, com a saudade. Ela existe, mas não me magoa mais. Deixei o passado no passado e apenas faço referência a ele para comparar com meu presente – que é muito melhor e feliz do que eu pensava que seria minha velhice.

No lugar de saudade prefiro fazer uma alusão a um tempo que eu talvez pensasse ser o mais feliz da vida, quando era apenas ilusão. A realidade presente me é mais compensadora e nem sei se irá durar assim, como se apresenta agora.

Não paro para pensar nas perdas e ganhos do passado, mas também não estou preocupada com o futuro. Minha dinâmica atual está surtindo efeito e, numa expressiva vantagem, minhas idéias e empenho em realizá-las estão sendo muito satisfatórios

Absorvi as cócegas e a saudade numa espécie de exercício de introversão. Neste mesmo intuito, estou exercitando outro sentimento que muito me magoou no passado. E, como esse passado passou, estou atenuando o ciúme , também.

Nem sei por que o chamam de “cobra dos olhos verdes”, mas que ciúme é um grande vilão que interfere nos nossos relacionamentos, é incontestável. Como não quero sofrer e fazer sofrer, interiorizo este inconveniente.

Você, que dá a honra de ler o que escrevo, procure, enquanto é tempo, viver sem ter medo de cócegas, do passado, do futuro e... evite sentir ciúme, uma vez que já diz um velho ditado ( e até uma música) “ninguém é de ninguém”.