Homem não chora?
Para quem é nascido e criado até a adolescência na fronteira do estado, especificamente na campanha. Aprendendo desde cedo à lida bruta nas agruras do tempo e intempéries, enrijecendo o corpo e alma para os sentimentos mais comezinhos, incorporamos ao nosso “modus vivendi”, o adágio machista de que “homem não chora”.
Por vários anos, quando os reveses da vida se abatiam sobre nós, vi muitas vezes meu pai sair do banheiro com os olhos vermelhos e inchados, e acreditava piamente que ele tomava banho com os olhos aberto, e o sabonete lhe queimava a retina, que o minuano soprava forte naquelas plagas, e volta e meia, um cisco lhe caía no olho.
Na década de oitenta já formado como sargento da Policia Militar, em patrulhamento de rotina, recebemos comunicado via rádio do desaparecimento de uma menina de cinco anos com “Síndrome de Down” , e seu pai estava na Praça XV desesperado. Era sábado à tarde, e vínhamos pela rua Venâncio Aires recolhendo para o Quartel após um dia exaustivo, por coincidência a encontramos na esquina da Av. João Pessoa e deslocamos com ela ao encontro de seu pai.
Este relato me ocorre como forma de mostrar uma experiência marcante, bem como prestar homenagem a dois valorosos soldados com quem tive a honra de trabalhar.
Ao chegarmos ao local de encontro, a menininha correu em direção ao pai babulciando seu nome, recebendo afetuoso abraço dele.
Na gélida noite que se avizinhava, constatei contra o recorte das luzes, nos rostos graníticos e esculpidos em ébano de meus colegas, homens que não titubeavam diante de um tiroteio, de turbas ensandecidas ,incêndios, enfim, todas as vicissitudes atinentes a profissão.Lágrimas,sim, lágrimas que escorriam abundante pelas faces e molhavam o fardamento. E ali no centro da metrópole fria e inumana, que eu descobri que homem chora,sim.