PELA CIDADE
Domingo eu fui à pracinha do bairro pela manhã tomar um solzinho e ler um jornal ao ar livre. Uma lástima só. O espaço urbano está se desumanizando e nós viramos coisas no ir e vir tal como acontece com os meios de transporte que usamos? Raramente se vê cuidados do próprio habitante com as cidades. Não vou falar de lixeiras que só servem para atrapalhar as passagens da maioria, pois o lixo vai mesmo é para o chão. Não vou falar das faixas de pedestres, pois elas só servem para avisar ao motorista que ali parado é multa certa e ao pedestre que ali é mais difícil ser atropelado. Não vou falar também que passeio público é para transeuntes e não para carro. Muita coisa eu prefiro não falar isoladamente para falar do conjunto que representa o que é mesmo que estamos fazendo aqui nas nossas cidades. Sequer vou falar do poder público que se gaba de norte a sul de tantas obras e ainda não atingimos uma qualidade de vida para a maioria das pessoas no espaço das cidades. Há lugares de qualidade boa, média, razoável e péssima. Não vejo nas cidades onde morei e conheci nenhuma em que houvesse um cuidado da administração em harmonia com o cuidado dos moradores.
Outro dia, passando pelo centro, eu estava querendo mostrar umas paisagens urbanas para minha filha, onde era tal lugar antes, hoje é tal coisa e ela é que estava com cara de paisagem, mais precisamente de natureza morta, num sinal de completo desinteresse em interiorizar o olhar para a cidade. Parece que tudo o que importa para grande parte das pessoas é ir aonde lhe interessa e voltar em segurança e de preferência, rapidamente. Onde não há história sendo construída não haverá defesa nem saudades. Se não considerarmos o espaço urbano como uma extensão de nossas casas, provavelmente vamos querer eliminar o outro ao nosso lado se ele nos incomodar; provavelmente não vamos nos importar com uma arquitetura linda e significativa que vai ceder lugar a um condomínio luxuoso ou a um shopping. Não vamos nos incomodar se derrubarem um parque em pleno centro da cidade para passar uma avenida ou viaduto. Também com a falta de sentimentos de coletividade, será que o melhor mesmo não é cada um ter seu espaço e ceder espaço para o dane-se o resto? A racionalidade mais usada hoje com o inchaço das cidades médias e grandes é para a solução do problema da mobilidade urbana, o deslocamento das pessoas, o ir e vir para satisfazerem suas necessidades, cumprirem as suas obrigações ou simplesmente desfrutarem dos espaços aconchegantes para o lazer. Em resumo, a pergunta ficou insistindo em me incomodar: então não era para ser esse mesmo espaço o lugar destinado prioritariamente às pessoas, à gente de carne e osso, com endereço de trabalho e moradia, cidadania em forma de impostos pagos e lazer em horas vagas? Nas ruas o que se vê com mais intensa sofreguidão é exatamente o contrário, os espaços sendo disputados palmo a palmo como se cada um dispusesse de seu quinhão e por onde um está circulando, que não entre nenhum outro em seu caminho.