Corriqueiro
Estou tão cansado. O despertador toca todos os dias às seis horas da manhã, e todos os dias só me levanto pouco antes das sete. Troco de roupa. Deixo a cama com uma angústia, uma tristeza sem igual. Vou ao banheiro, penteio meus rebeldes cabelos e escovo meus dentes tortos. Tomo apenas café com leite e pego a condução lotada. Meu bilhete falha na catraca, não dá pra confiar tanto assim nessa tecnologia barata. Saio do microônibus atrasado, corro pra chegar ao trabalho. No trabalho é telefone pra lá, telefone pra cá, mandando mil e-mails. Levo comigo meu computador, tenho tanto o que fazer que esqueço do lanchinho na sala do cafezinho. Meio-dia é meu horário de almoço, saio como sempre correndo. Tanta pressa que mal como direito. Vem o garçom com a maquininha e passo o cartão pagando a conta. Volto pro trabalho. Corro pra não perder o elevador, em que, por infelicidade, está presente meu chefe. Esse não corre não faz nada, só me manda mais serviço, mais serviço e mais serviço. E o trabalho continua. Mando mais mil e-mails, ainda bem que minha internet é rápida, o e-mail vai e volta muito depressa. Horário do cafezinho novamente. Esse não deixo de tomar. No turno da tarde trabalha meu amigo. Considerado o futuro da empresa. O funcionário moderno que entende tudo sobre tecnologia européia. Conversamos muito, apesar de serem meia dúzia de palavras. Falta apenas meia hora para encerrar meu turno. Não paro de olhar pro relógio. Arrumo minhas pastas, arquivo meus documentos, guardo em minha bolsa a papelada domiciliar junto com meu laptop. São cinco da tarde. Um martírio pra voltar, tudo cheio e congestionado. Condução mais do que lotada. Novamente o bilhete falha. Pego meu livro, o movimento do ônibus não me deixa lê-lo. Chego em casa. Cansado. Mais do que cansado, morto, exausto, acabado. Tomo meu banho, ligo a televisão, durmo no barulho da cidade, e seis da manhã o despertador toca e só levanto pouco antes das sete. O trabalho domiciliar que trouxe? Esse nem me lembro que existe. O jornal de todos os dias que assinei? Fica encostado, empilhado no canto da sala. Organização? O que é isso? Concentração? Apenas em dormir. O livro que estou lendo? Já não me recorda as personagens. É aquela velha história, folga só amanhã.