“QUANDO SOU BOA, SOU MUITO BOA. MAS QUANDO SOU MÁ, SOU MELHOR”



A figura, não sei se seria mais adequado – a criatura – vem ganhando notoriedade e cada vez mais adeptos. Já foi discutida por meio mundo e, por unanimidade, eleita rainha do enjoo: os bonzinhos. Sinto muito por aqueles que enaltecem essas figuras-criaturas ou criaturas-figuras. Os bonzinhos, para começar, são altamente perigosos, porque encantadores. Em todos os sentidos. Conseguem incutir nos incautos o desejo de também ser bonzinho e colecionar todos os inhos possíveis para: a-gra-dar. Nada mais do que isso. E é nesse agradar que ele esconde suas verdadeiras intenções: deixar ficar para ver como é que fica, conferir a outro o poder que ele, bonzinho, deveria exercer – claro, ilusoriamente. Então, ele é o tal e os outros, coitadinhos, na visão dele. De tal forma, o bonzinho acaba fugindo de suas responsabilidades, torna possível a garantia de alimentar, diariamente, sua poderosa vaidade, não assume seus compromissos e ainda consegue impor sua alma generosa: falsa, claro.

O bonzinho, com certeza, não tem amor pelo que faz e nem para quem faz. Esse amor é direcionado a ele. Ele sabe o porquê e o quê faz, espertamente. Quem não cair em sua rede encarna o seu oposto que passa a ser visto como o mau ou o mal ou o bruxo ou o chato ou o exigente, ou o inoportuno e, por aí vai. O bonzinho aposta – e contribui com excelência para – na famosa inversão de valores que vem brotando em nosso dia a dia com excepcional força. É só observar.


Seu oposto exerce um amor, hoje, quase em desuso: vive e convive com expressões jamais usada pelo bonzinho: como vai, bom dia e similares, sim e não com clareza e determinação, pois não, com certeza, obrigado, por favor. Expressões que vão além da educação. Elas valorizam a presença, o fazer e o com-viver com outros, se colocando ao lado, nunca acima. Outra característica do aposto do bonzinho é a exigência. Ser exigente significa querer o melhor possível, o justo. É generoso – não bonzinho – pratica seu dever e seu direito e, de cara, mostra a que veio. Lida diariamente com o cuidado sobre todas as coisas, com o esmero, com a autoridade, com o compromisso, com o conhecimento. Ah, isso dá trabalho! Ah, isso incomoda! O bonzinho diria: Ah, isso gera conflitos! Ah, isso é impor o saber a quem não tem! Ah, vou parecer muito antipático! Hein? Observem!


Mas, o pior do bonzinho não está, ainda, aí. O pior do bonzinho é minar as forças de seu opositor. Como ficou claro, primeiro ele faz isso com seus encantos. Não conseguindo, usa a força do isolamento até que, cansado de ser chato, mau, mal, bruxo, exigente, inoportuno, etc., cede. Não se transforma em bonzinho, mas usa todas as suas forças para tentar parecer. Por várias razões, mas a pior é a sensação e a constatação de seu isolamento. O lobo tem que ser apartado das ovelhas, senão... É muito ruim conviver com o bonzinho. Até porque você nunca sabe do que ele é capaz.


Tenho certeza de que muitos passam, hoje, por essa mesma situação. Eu, também. E, quando o cansaço de ser bruxa me vem, quando estou à beira de ser boazinha, de achar todo mundo coitadinho, de achar que nem tudo precisa ser certinho... Quando dá aquela vontade de deixar para lá e passar a chamar todo mundo de amorzinho, e assim sair de fininho, enfim, quando percebo que seria mais fácil viver desses falsos “inhos”, para ser “agradavelzinha”, “docilzinha”, amiguinha, etc., lembro-me de uma moça chamada Fabiana, praticante fervorosa desse amor em desuso, que exerce a generosidade, a minúcia, a caridade, a humildade, o conhecimento, o direito e o dever a serviço do outro. O que tornou-se raro. Raríssimo!


Quem se lembra da famosa frase de Mae West em “Santa não sou”? Pois é maravilhosa! E por assim ser, mando para essa moça, Fabiana, que me socorre sempre nesses momentos de agonia, a quem admiro e respeito, profundamente, para que ela faça uso dela, por toda a sua vida: “Quando sou boa, sou muito boa. Mas, quando sou má, sou melhor”. Saudades, Fabiana!

 
Eliana Schueler
Enviado por Eliana Schueler em 08/05/2010
Reeditado em 09/05/2010
Código do texto: T2244717
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