O DIA DE SOFIA
Não comprava biju nem Paraguai, nem ao menos passava na porta da Americanas para não ser vista pelas amigas, as tais sempre com aparência de quem se deu bem ( no dialeto delas). Algumas até que sim, outras nem tanto. Mas, voltemos à personagem centro: Sofia era o que se podia chamar de metida a besta clássica, tanto que nem do nome gostava, dizia que não havia “glamour” nenhum nele.
Suas roupas como devem imaginar, tinham de constar em algum lugar, de preferência em destaque a marca, ah a marca! Desde que conhecida, estava aprovada.
Tão obstinada em aparecer, era capaz de pagar um “Manoel Bernardes” a custa de almoços regados a coxinha e café numa “bitaca” onde ninguém pudesse reconhecê-la.
Chegava ao escritório onde trabalhava de auxiliar administrativo conduzida pelo “verdinho” que era como chamava carinhosamente o seu Uno ano 1990. Mas o carinho parava por aí, o coitadinho não podia estar em pior estado, motivo dela estacioná-lo sempre longe da portaria do prédio. Só para o leitor se situar da penúria, o que deveria ser os pneus do veículo não passavam de um amontoado de borracha e arame aparente que só mesmo por força divina conduzia a lata já bem apodrecida cidade afora.
Os shoppings a noite ou sábado a tarde eram os lugares mais prováveis de se encontrar o fumacento esverdeado visto que ela com seus vinte e quatro anos de idade, era como qualquer outra patricinha, adorava ou praticamente idolatrava o imenso aquário seco.
Sofia era impiedosa com os vendedores ao tomar o tempo deles e depois agradecer prometendo voltar depois. Claro que ela sabia que estando pendurada em mais de uma financeira da cidade, isto ia demorar a acontecer.
Dia desses estava ela no Diamond Mall, quando lembrou que já era noite, chovia e a precaução mandava que se apressasse sabendo que o fitin tinha um farol horrível, um limpador de “veneta” e os pneus. . . Bom, os pneus vocês já sabem. Entrou no verdinho rezando todas as orações que sabia, só que a implacável chuva não quis conversa e num breve embaço de para-brisa, Sofia perdeu a noção de distância do carro a frente, e ao achar que ia bater nele desviou direito para um poste, que o fitin deu um abraço quase fraterno.
O para-brisa contra a fronte, a fronte respingada, os olhos estatelados e Sofia radiante, mesmo de cadáver. Nunca na vida ela poderia imaginar que um dia conseguiria chamar a atenção de uma multidão tão grande. Suas últimas compras de roupas e de jóias justificavam o momento, só mesmo o Fiat velho e descuidado não combinava, Sofia merecia um Punto.