COM QUE ROUPA EU VOU?

Sábado vou a um casamento. É hora! Preciso de uma roupa nova. E só de pensar já me dá enjoo. Não gosto de comprar roupa. Não tenho gosto. Não sei escolher. E me arrependo de tudo que compro. Jogo tempo e dinheiro fora. E as vendedoras? Com exceções, é claro, algumas delas me dão pânico! As escolhidas a dedo são as piores. Estremeço com seus sorrisos plásticos. Enlouqueço no provador (minha pior provação) quando escuto: “E aí serviu? Vem aqui fora pra gente ver”. Não, não vou nem que me matem. Não me submeto a me expor num vestido com cara de barril e ouvir: “Perfeito! É só a costureira dar um apertadinha na cintura, soltar um pouquinho na manga, cortar um pedacinho no decote e...”

Uma última olhada no guarda-roupa. Será que não escapo desta? Olho o vestido verde. Só usei uma vez. Não, muito fora de moda. E o preto bordado? Muito brilhoso. Casamento às 17h? Muita claridade ainda. Tanta faísca faiscando não pega bem. Isso tá mais pra relâmpago. Corro o risco de ofuscar a noiva. Deus que me livre! Não me perdoaria jamais! Coitada, justo no dia mais feliz de sua vida? O bege? Muito sem graça. Já me disseram que essas cores mortas não ficam bem em mim. Empalidecem demais. Eu nem sabia que cor morria, mas já que morre. Jurei nunca mais usar o bege...

Sobrou o azul marinho... Também não! Já foi usado em outro casamento. Maior bandeira, todo mundo já viu... Opa! Será mesmo que repararam tanto no azulzinho? Mania de pensar que todo mundo prestou atenção. Vai ver ninguém nem viu. Pensando bem, muita vaidade! Coisa de quem “se acha”, como dizem. Tanta coisa bonita no casamento. O noivo, os noivinhos, a porta-aliança, as daminhas, os enfeites, o coral, e por fim, a noiva ma-ra-vi-lho-sa! Tudo isso, e o povo olhando justamente meu modesto vestidinho azul? Convenhamos, é me achar demais mesmo!

Resolvido! Ninguém me viu naquele dia. Aliás, acho que nem fui ao casamento. Pra dizer a verdade o vestido azul nunca existiu. Ele é novinho, acabou de sair da loja. Pensamento é tudo. Então basta pensar: ninguém me reparou no casamento da Maria Emília. Só o espelho e eu sabemos desse segredo. Muito bem: vou com o azulzinho. Alívio! Não vou ter que ir à loja alguma. Livre, livre daquele “Nossa, foi feito pra você!”. Como assim, feito pra mim? Alguém nessa loja tem bola de cristal? Alguém aqui sabia que a Valéria ia casar? Contaram pra alguém que fui convidada e ia comprar um vestido? Não, né? Então como é que fizeram um vestido pra mim? Haja paciência!

No sábado me produzo toda. Entro na igreja de cabeça erguida. Meu vestido azul, meu salto alto, minha bolsinha de mão, novinha em folha, presente do dia das professoras. Sento-me toda elegante na ponta do banco. Lugar estratégico pra se acompanhar todo o evento. De repente, alguém se senta ao meu lado. Viro-me e dou de cara com a Beatriz, prima da noiva. Santo Deus! Santo Antônio, protetor das noivas, nos ampare! Olhos estarrecidos, ela e eu nos medimos de alto a baixo! Não dá pra crer! Irmãs gêmeas, um parzinho de jarras ou uma dupla sertaneja? Nada disso! É Beatriz mesmo! É Beatriz vestindo um azulzinho escandalosamente igual ao meu... Desta vez tenho certeza: ninguém vai perdoar...