O Pai do Ouro

No início de 2009, andei escrevendo sobre a vitória de Obama nas eleições americanas, no calor da conquista, mas acabei deixando a crônica bem-humorada na gaveta e é bem possível que ela esteja “datada”, quer dizer, ultrapassada e possivelmente seja mais uma história frustrante, no sentido de ser outra esperança perdida. Ficou patente, dois anos passados, que a “salvação” da humanidade não depende de um homem, por melhor que ele seja e mesmo que dirija a nação mais rica do mundo. A empreitada tem que ser coletiva e fica a advertência de Piaget: “a realidade social em geral, e particularmente a realidade internacional atual, estão entre as coisas que menos compreendemos.” Espicaçado pelo meu amigo Roberto Rego (e como me faz bem o estímulo dele!), transcrevo a seguir a citada crônica:

“Os americanos acabaram de eleger no dia 04 de novembro de 2008 o seu primeiro presidente negro, verdadeiramente, globalizado, o Sr. Barack Hussein Obama, nome que bem poderia sugerir um rei africano, ou um sultão árabe, jamais um nome da América Branca.

Filho de um negro do Kenya, na África, e de origem muçulmana, e de uma branca, essa sim, americana, do Estado do Kansas.

Nasceu em Honolulu, no paradisíaco Havaí, tendo morado parte de sua infância na Indonésia, ocasião em que sua mãe branca casou-se pela segunda vez.

O homem já nasceu com a diversidade em seus genes e apresentou-se ao mundo, mesmo não querendo, como um salvador, para enfrentar o caos social em que vivemos. Daí o frenesi que tomou conta do planeta, principalmente, da própria América do Norte, saudosa que está dos seus valores mais caros, aqueles dos tempos dos patriarcas dos EEUU, a noção arraigada de que tudo é possível naquela terra e que todos, sem exceção, têm mil oportunidades de crescer, bastando querer.

E o resto do mundo, de há muito estarrecido com o cowboy Bush, fazedor de guerras trágicas e injustas, vinha ansiando por alguém que apresentasse uma face mais humana, mais humilde, mais tolerante, sem arrogância. E esse homem apareceu, varrendo como um tufão a era dos “Johns”, dos “Franklins”, ou mesmo dos “Charles”.

Parece incrível, nesses poucos dias após as eleições americanas, estamos assistindo a uma verdadeira carnavalização de todo o mundo, desde os sisudos ingleses até os musicais e alegres africanos, festejando a vitória do Obama, como se um novo Messias houvesse chegado para nos trazer a paz e a igualdade entre os povos tão esperada e nunca alcançada .

O orgulho dos africanos é patente, orgulhosos do seu representante negro. Nós, no Brasil, com o nosso pé na África, não poderíamos ficar atrás e já há quem esteja se recordando do samba- enredo da Mangueira, de 1976, com o título “No reino da mãe do ouro”, que eu atualizaria para “no reino do pai do ouro”, cujo refrão naquele carnaval muito cantado, ficaria assim : “Ôbabá,olá-o-babá, é o pai do ouro que vem nos salvar”.

Como a crítica sempre vem e alguém vai logo dizer que o Brasil não se emenda, que é por isso que não vamos pra frente, com esse excesso de tropicalismo e ainda por cima evocando samba-enredo tão antigo, vou logo dizendo aos meus detratores que também sei me atualizar e posso também dar o meu inocente grito de alegria pela vitória do Obama, com uma saudação bem baiana, no mais alto e bom som: “Ó-paí-ó, ópaí-ó, ópaí-ó”!!! Posso ou não posso também me associar a essa alegria toda? “Yes, I Can”