As Modernas "Indústrias" do Brasil (2) - A Indústria da Invasão
No Brasil, a Constituição de 1988 garante a desapropriação do latifúndio improdutivo para finalidade pública e interesse social, inclusive a tão decantada reforma agrária, que visa, acima de tudo, a combater o êxodo rural, termo pelo qual se designa o abandono do campo por seus habitantes, que, em busca de melhores condições de vida, se transferem para regiões urbanas.
Contudo, embora seja uma reforma considerada essencial por todos os governos – inclusive os da ditadura militar - para o desenvolvimento econômico e social do país, até agora nada se fez realmente, em termos práticos, para executá-la, não obstante a criação da Superintendência de Política Agrária – SUPRA, em 1962, e o Ministério do Desenvolvimento Agrário e o INCRA, em 1999.
Sob essa desculpa – a má vontade política dos governos para executarem a reforma agrária - pelegos, agitadores, politiqueiros, ou simplesmente bandidos, aproveitando-se da fragilidade e tolerância das nossas leis, bem como do populismo de alguns governantes, influenciam e comandam “inocentes úteis” para a invasão de propriedades rurais, sejam latifúndios improdutivos – caso em que se “confunde” desapropriação com invasão – sejam propriedades produtivas – caso em que não há nenhuma “confusão”, é esbulho mesmo!
O que há, na verdade, por trás dessas entidades que comandam essas invasões? Pressão política para forçar o governo a acelerar uma reforma procrastinada há mais de 50 anos? Mal necessário para dar teto e terra para os deserdados da sorte no campo? É o que os seus “bravos líderes” proclamam, mas, na verdade, a força motriz que impulsiona os movimentos de invasão no campo é o dinheiro arrecadado com a lucrativa Indústria da Invasão, que funciona mais ou menos assim: aliciam-se os “inocentes úteis” – aqueles realmente pobres e necessitando do cultivo da terra para tirar a sua subsistência - e depois de municiar-lhes de ideologias fajutas, camisas vermelhas (qualquer semelhança não é mera coincidência), enxadas, facões, armas para os mais preparados fisicamente, faixas (tipo “Reforma Agrária Já!”), cartazes etc. são conduzidos por invasores profissionais até às terras da promissão. Que se danem os legítimos proprietários, que se não correrem vão perder, além das terras, também as próprias vidas, pois o recado é curto e grosso: “Isso não mais te pertence, cara!” Se o proprietário reage, contratando seguranças armados para defender o patrimônio que levou a vida toda para conquistar, pode ser preso por formação de quadrilha (embora esteja se defendendo de uma quadrilha) ou porte ilegal de armas.
Resumo da história: matam-se bois, saqueiam-se as plantações, invadem-se as casas de fazendas, loteiam-se assentamentos para os “inocentes úteis” e também para os nada inocentes. Para os “inocentes úteis” logo aparecem lojas e empresas vendendo de tudo: enxadas, gadanhos, botas, luvas, sementes, material de construção; já os nada inocentes começam a vender os seus lotes a quem interessar possa. E não é pouco o dinheiro que movimenta essa engrenagem.
Se o proprietário recorrer à Justiça e ganhar a reintegração de posse da sua propriedade invadida, a ordem judicial só será acatada depois de um tiroteio com a polícia, com o custo de algumas mortes, sempre, é claro, dos pobres “inocentes úteis”! E depois, o que sobra: tempo e dinheiro (e talvez vida) perdidos pelos pobres que realmente precisavam da terra, dinheiro nos bolsos dos que financiaram, exploraram e comandaram a invasão, e uma situação de terra arrasada para o proprietário. Se o governo desapropriar a área em benefício dos invasores – coisa que jamais ocorrerá em menos de um ano – a indenização que o proprietário receberá não compensará nem a metade dos gastos e do suor que despendeu ao longo de sua vida para construir seu patrimônio. Será, entretanto, um final feliz para os “inocentes úteis” que, a esse tempo, já estarão sem a companhia dos seus bravos comandantes que, após venderem os seus lotes, partiram para uma nova "Cruzada" contra o latifúndio.
Nas áreas urbanas, a Indústria da Invasão não cultiva o demagógico e hipócrita discurso de pressão política para induzir o governo a executar qualquer reforma, até porque os seus “líderes” só possuem um fraco e efêmero poder de mobilização política. Mas usam a pobreza absoluta de alguns segmentos da população – sem condições de moradia digna – como desculpa para ganhar dinheiro fácil e, mais tarde, alguma projeção política. E tanto quanto na área rural, há um componente de banditismo que promove até assassinatos por rivalidades ou disputas pelo poder.
E funciona assim: um grupo – já especializado em invasões – invade com enorme estardalhaço uma área desabitada, divide-o em lotes de 10m de frente por 15m de fundo, vendendo-os para “quem não tem onde morar”. O mais estranho é que se alguém visitar essa invasão uns três meses depois, vai surpreender-se com a quantidade de casas de alvenaria, bonitas, até mesmo de dois pavimentos, e casas comerciais, que já foram rapidamente construídas. Moral da história: vendem-se lotes na invasão para desabrigados e para moradores muito bem abrigados. Além do dinheiro da venda dos lotes, o grupo arrecada grana fácil de muitas outras fontes: venda de material de construção, instalação clandestina de água e energia elétrica, etc. E criam logo uma União de Moradores que resolve os problemas da invasão ou no diálogo ou na bala.
Quando o proprietário da área invadida ganha na Justiça a reintegração de posse da propriedade, cenas dramáticas e dolorosas desfilam ante os nossos olhos comovidos: mães com criancinhas nos braços chorando desesperadas por verem seus casebres derrubados pelos tratores; moradores enfrentando desesperadamente a polícia para salvar os seus barracos da destruição. Realmente, é de cortar o coração, porque grande parte daquelas pessoas que compraram os seus terrenos não têm mesmo nenhum teto para abrigar-se durante uma noite. Moravam em casas de parentes ou vieram do interior do estado, atraídos pela oferta de moradia fácil na cidade grande. Então, o grupo contrata advogados, ou pede proteção política (se há proximidade de eleições, logo aparecem vereadores e deputados na invasão para “hipotecar solidariedade” aos desabrigados), e, na maioria das vezes, consegue liminares suspendendo a reintegração de posse. Os barracos são reconstruídos. Novos gastos com material de construção que, naturalmente, são vendidos em postos dirigidos pelo grupo e reconstruídos em tempo recorde. Essa situação de “derruba-reconstrói” de uma área invadida pode se prolongar por vários anos e, na alegria e na tristeza, o grupo fatura.
E o grupo invasor, igual uma enorme sanguessuga social, somente deixa a invasão quando ela, por decisão final da Justiça e esgotadas as possibilidades de apelação, cai de vez, ou quando, pela Lei do Usucapião, os invasores adquirem a posse legal dos imóveis que ocupam. Não há mais o que vender, não há mais o que explorar, a União de Moradores já passou para as mãos dos realmente moradores, e então, eles se vão. Para promover novas invasões.
Pela fragilidade das nossas leis, que concorre para a falta de autoridade e a certeza da impunidade, pela inércia política dos nossos governantes, voltados exclusivamente para os seus interesses escusos, a Indústria da Invasão prospera sem solução de continuidade em nosso país; no campo, violando impunemente o nosso sagrado direito de propriedade e, nas cidades, favelizando até mesmo áreas consideradas nobres alguns anos atrás.
Até quando, Catilina?
No Brasil, a Constituição de 1988 garante a desapropriação do latifúndio improdutivo para finalidade pública e interesse social, inclusive a tão decantada reforma agrária, que visa, acima de tudo, a combater o êxodo rural, termo pelo qual se designa o abandono do campo por seus habitantes, que, em busca de melhores condições de vida, se transferem para regiões urbanas.
Contudo, embora seja uma reforma considerada essencial por todos os governos – inclusive os da ditadura militar - para o desenvolvimento econômico e social do país, até agora nada se fez realmente, em termos práticos, para executá-la, não obstante a criação da Superintendência de Política Agrária – SUPRA, em 1962, e o Ministério do Desenvolvimento Agrário e o INCRA, em 1999.
Sob essa desculpa – a má vontade política dos governos para executarem a reforma agrária - pelegos, agitadores, politiqueiros, ou simplesmente bandidos, aproveitando-se da fragilidade e tolerância das nossas leis, bem como do populismo de alguns governantes, influenciam e comandam “inocentes úteis” para a invasão de propriedades rurais, sejam latifúndios improdutivos – caso em que se “confunde” desapropriação com invasão – sejam propriedades produtivas – caso em que não há nenhuma “confusão”, é esbulho mesmo!
O que há, na verdade, por trás dessas entidades que comandam essas invasões? Pressão política para forçar o governo a acelerar uma reforma procrastinada há mais de 50 anos? Mal necessário para dar teto e terra para os deserdados da sorte no campo? É o que os seus “bravos líderes” proclamam, mas, na verdade, a força motriz que impulsiona os movimentos de invasão no campo é o dinheiro arrecadado com a lucrativa Indústria da Invasão, que funciona mais ou menos assim: aliciam-se os “inocentes úteis” – aqueles realmente pobres e necessitando do cultivo da terra para tirar a sua subsistência - e depois de municiar-lhes de ideologias fajutas, camisas vermelhas (qualquer semelhança não é mera coincidência), enxadas, facões, armas para os mais preparados fisicamente, faixas (tipo “Reforma Agrária Já!”), cartazes etc. são conduzidos por invasores profissionais até às terras da promissão. Que se danem os legítimos proprietários, que se não correrem vão perder, além das terras, também as próprias vidas, pois o recado é curto e grosso: “Isso não mais te pertence, cara!” Se o proprietário reage, contratando seguranças armados para defender o patrimônio que levou a vida toda para conquistar, pode ser preso por formação de quadrilha (embora esteja se defendendo de uma quadrilha) ou porte ilegal de armas.
Resumo da história: matam-se bois, saqueiam-se as plantações, invadem-se as casas de fazendas, loteiam-se assentamentos para os “inocentes úteis” e também para os nada inocentes. Para os “inocentes úteis” logo aparecem lojas e empresas vendendo de tudo: enxadas, gadanhos, botas, luvas, sementes, material de construção; já os nada inocentes começam a vender os seus lotes a quem interessar possa. E não é pouco o dinheiro que movimenta essa engrenagem.
Se o proprietário recorrer à Justiça e ganhar a reintegração de posse da sua propriedade invadida, a ordem judicial só será acatada depois de um tiroteio com a polícia, com o custo de algumas mortes, sempre, é claro, dos pobres “inocentes úteis”! E depois, o que sobra: tempo e dinheiro (e talvez vida) perdidos pelos pobres que realmente precisavam da terra, dinheiro nos bolsos dos que financiaram, exploraram e comandaram a invasão, e uma situação de terra arrasada para o proprietário. Se o governo desapropriar a área em benefício dos invasores – coisa que jamais ocorrerá em menos de um ano – a indenização que o proprietário receberá não compensará nem a metade dos gastos e do suor que despendeu ao longo de sua vida para construir seu patrimônio. Será, entretanto, um final feliz para os “inocentes úteis” que, a esse tempo, já estarão sem a companhia dos seus bravos comandantes que, após venderem os seus lotes, partiram para uma nova "Cruzada" contra o latifúndio.
Nas áreas urbanas, a Indústria da Invasão não cultiva o demagógico e hipócrita discurso de pressão política para induzir o governo a executar qualquer reforma, até porque os seus “líderes” só possuem um fraco e efêmero poder de mobilização política. Mas usam a pobreza absoluta de alguns segmentos da população – sem condições de moradia digna – como desculpa para ganhar dinheiro fácil e, mais tarde, alguma projeção política. E tanto quanto na área rural, há um componente de banditismo que promove até assassinatos por rivalidades ou disputas pelo poder.
E funciona assim: um grupo – já especializado em invasões – invade com enorme estardalhaço uma área desabitada, divide-o em lotes de 10m de frente por 15m de fundo, vendendo-os para “quem não tem onde morar”. O mais estranho é que se alguém visitar essa invasão uns três meses depois, vai surpreender-se com a quantidade de casas de alvenaria, bonitas, até mesmo de dois pavimentos, e casas comerciais, que já foram rapidamente construídas. Moral da história: vendem-se lotes na invasão para desabrigados e para moradores muito bem abrigados. Além do dinheiro da venda dos lotes, o grupo arrecada grana fácil de muitas outras fontes: venda de material de construção, instalação clandestina de água e energia elétrica, etc. E criam logo uma União de Moradores que resolve os problemas da invasão ou no diálogo ou na bala.
Quando o proprietário da área invadida ganha na Justiça a reintegração de posse da propriedade, cenas dramáticas e dolorosas desfilam ante os nossos olhos comovidos: mães com criancinhas nos braços chorando desesperadas por verem seus casebres derrubados pelos tratores; moradores enfrentando desesperadamente a polícia para salvar os seus barracos da destruição. Realmente, é de cortar o coração, porque grande parte daquelas pessoas que compraram os seus terrenos não têm mesmo nenhum teto para abrigar-se durante uma noite. Moravam em casas de parentes ou vieram do interior do estado, atraídos pela oferta de moradia fácil na cidade grande. Então, o grupo contrata advogados, ou pede proteção política (se há proximidade de eleições, logo aparecem vereadores e deputados na invasão para “hipotecar solidariedade” aos desabrigados), e, na maioria das vezes, consegue liminares suspendendo a reintegração de posse. Os barracos são reconstruídos. Novos gastos com material de construção que, naturalmente, são vendidos em postos dirigidos pelo grupo e reconstruídos em tempo recorde. Essa situação de “derruba-reconstrói” de uma área invadida pode se prolongar por vários anos e, na alegria e na tristeza, o grupo fatura.
E o grupo invasor, igual uma enorme sanguessuga social, somente deixa a invasão quando ela, por decisão final da Justiça e esgotadas as possibilidades de apelação, cai de vez, ou quando, pela Lei do Usucapião, os invasores adquirem a posse legal dos imóveis que ocupam. Não há mais o que vender, não há mais o que explorar, a União de Moradores já passou para as mãos dos realmente moradores, e então, eles se vão. Para promover novas invasões.
Pela fragilidade das nossas leis, que concorre para a falta de autoridade e a certeza da impunidade, pela inércia política dos nossos governantes, voltados exclusivamente para os seus interesses escusos, a Indústria da Invasão prospera sem solução de continuidade em nosso país; no campo, violando impunemente o nosso sagrado direito de propriedade e, nas cidades, favelizando até mesmo áreas consideradas nobres alguns anos atrás.
Até quando, Catilina?