Viajar
Acredito que quando conhecemos um ambiente diferente, sempre somos envolvidos por impressões que são inevitáveis, como: as comparações com o lugar em que vivemos, as reflexões sobre as disparidades existentes e, principalmente, pelo desejo de continuar (re) descobrindo novos espaços, expandindo horizontes e experimentando diferentes sensações.
E a melhor forma de viver tudo isso, é estando em contato com as pessoas do lugar que visitamos, percorrendo com outro olhar os caminhos cotidianos de outros indivíduos; percebendo o que muitas vezes passa despercebido; observando cada modo de pensar, cada gesto, cada palavra, cada peculiaridade que constituem a cidade e cada um de seus habitantes. É se sentido distante no tempo e no espaço da rotina da nossa própria vida e invadindo a rotina de outras pessoas, dividindo o tempo e o espaço de forma assíncrona, na contramão da realidade...
Confesso que houve um estranhamento inicial, do tipo “o que estou fazendo aqui”, todavia existiu também um encantamento surpreendente. Um desejo de ser o outro, não no sentido de se despir da minha singularidade, cultura ou comportamento, negando-os ou substituindo-lhes; mas apenas no sentido de deixar-se sentir e viver o diferente.
Por alguns momentos, por alguns dias, por uma semana fui mineira, torci pelo GALO (lógico, né?), subi e desci ladeiras, senti o sol quente na pele com a diferença de não pingar uma gota de suor, senti a fria brisa da noitinha esfriar meu corpo cansado das palestras do congresso e depois das andanças pelo centro da cidade; falei UAI,achei engraçado o modo peculiar do mineiro falar, de se tratar na rua, mas também fui alvo de graça; meu “S” puxado, meu “tu”redundante eram o sinal mais claro de que eu não era uma mineira.
Carregar mochila nas “costas” e não na “costa”, ficar “agarrado” não no sentido de ficar juntinho, mas no sentido de “travar”, ficar parado... Quantas diferenças... Rimos delas, nos divertimos brevemente por sermos desiguais.
Vi do céu crateras no solo, buracos de onde se tiravam minérios, cimento, cal.. E na terra vi várias indústrias, multinacionais, grandes “estacionamentos” da Fiat, símbolos do que movem a economia local. Aprendi com meu guia muito mais geografia e história regional, do que aprendi na escola. Percorri rodovias “movimentadíssimas”, onde passavam a todo momento muitos caminhões, e senti medo do modo mineiro de dirigir, sempre em alta velocidade e por vezes de modo imprudente, não muito diferente do que ocorre por aqui.
Estranhei o sabor do torresmo, senti falta da nossa farinha “baguda”, saboreei o tropeiro e a pimenta mineira meio ardida comida aos pedaços, bem diferente do nosso modo de comer aqui no Pará; em contrapartida, fiz propaganda do nosso açaí, tacacá, pato no tucupi, maniçoba, enfim troca de percepções, compartilhamento cultural, tudo isso vivenciei nos poucos dias que estive em Minas Gerais. Isso é claro foi apenas o resumo, não falei sobre as conjeturas do Congresso, dos aparatos ideológicos por traz dos sujeitos que constituíram o evento, mas isso faz parte do trabalho, não quero falar sobre isso aqui, seria maçante...
Até que chegou a hora de voltar, e mais uma vez me senti surpreendida na escala em São Paulo, pela profusão de pessoas de diversos lugares do mundo, que embarcavam e desembarcavam, apressadas, contentes, atentas, dispersas... De repente, tive a impressão de que enquanto muitos trabalham, se dilaceram no cotidiano em busca do bem material, existem outros que estão envolvidos em outros processos, lógico com relativismos, não posso generalizar.
Porém ser mineira, paraense, carioca ou paulista não se define pelo modo de falar, quem dera o fossem, é muito mais que isso... Não imaginas como fiz questionamentos sobre a realidade do meu Estado parecido em vários aspectos com o seu, mas muito diferente em outros.